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Metodologia e Pré-História da África - unesdoc - Unesco

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A tradição oral e sua metodologia<br />

incluir aqui precedentes legais que raramente são transmitidos pela tradição oral,<br />

comentários sobre registros orais e as notas ocasionais, que são essencialmente<br />

respostas curtas a perguntas do tipo: “Como começamos a cultivar milho?”, “De<br />

onde veio a máscara de <strong>da</strong>nça?”, etc.<br />

Dessa lista pode -se imediatamente observar o que pode ser a ação deformadora<br />

de uma instituição em ca<strong>da</strong> um desses tipos. Mas ain<strong>da</strong> é preciso demonstrar<br />

que essa ação realmente ocorreu ou que a probabili<strong>da</strong>de de distorção é muito<br />

grande. Geralmente, é possível mostrar que uma tradição é váli<strong>da</strong> porque não<br />

sofreu as distorções espera<strong>da</strong>s. Por exemplo, um povo diz que é “mais novo”<br />

que outro, uma crônica real admite uma derrota, uma fórmula particular que<br />

deveria explicar a geografia física e humana de um país não se conforma mais à<br />

reali<strong>da</strong>de. Em todos esses casos a análise comprova a vali<strong>da</strong>de <strong>da</strong> tradição, pois<br />

esta resistiu ao processo nivelador.<br />

Em seu trabalho sobre o fenômeno <strong>da</strong> escrita (capaci<strong>da</strong>de de ler e<br />

escrever), Goody e Watt afirmam que uma socie<strong>da</strong>de oral tende, constante e<br />

automaticamente, à homeostase, que apaga <strong>da</strong> memória coletiva – <strong>da</strong>í a expressão<br />

“amnésia estrutural” – qualquer contradição entre a tradição e sua superfície<br />

social. Mas os casos mencionados acima mostram que essa homeostase é só<br />

parcial. Não se pode negar, portanto, o valor histórico <strong>da</strong>s tradições unicamente<br />

por desempenharem certas funções. Segue -se, ain<strong>da</strong>, que ca<strong>da</strong> tradição deve ser<br />

submeti<strong>da</strong> a estrita crítica sociológica. No mesmo trabalho, esses autores afirmam<br />

que a cultura de uma socie<strong>da</strong>de verbal é homogeneiza<strong>da</strong>, isto é, que o conteúdo,<br />

em termos de conhecimento, do cérebro de ca<strong>da</strong> adulto é aproxima<strong>da</strong>mente<br />

o mesmo. Isso não é totalmente ver<strong>da</strong>deiro. Especialistas artesãos, políticos,<br />

legistas e religiosos sabem muitas coisas que seus contemporâneos do mesmo<br />

grupo étnico desconhecem. Ca<strong>da</strong> grupo étnico tem seus pensadores. Entre os<br />

Kuba (Zaire), por exemplo, encontramos três homens que, com base num mesmo<br />

sistema de símbolos, haviam estabelecido três filosofias diferentes, e supomos<br />

que o mesmo se dá entre os Dogon. Quanto às tradições, observamos que em<br />

muitos grupos há tradições esotéricas secretas, que são privilégio de um grupo<br />

restrito, e tradições exotéricas públicas. Por exemplo, a família real ashanti sabia<br />

a história secreta de sua origem, enquanto o grande público conhecia somente a<br />

versão oficial. Em Ruan<strong>da</strong>, somente os especialistas biiru conheciam os rituais <strong>da</strong><br />

realeza, e, mesmo assim, eles só os conheciam na sua totali<strong>da</strong>de quando estavam<br />

todos juntos, já que ca<strong>da</strong> grupo de biiru tinha conhecimento apenas de uma parte<br />

deles. Em quase todos os rituais de entronização na <strong>África</strong> encontramos práticas<br />

e tradições secretas. Isso significaria que a tradição esotérica é necessariamente<br />

mais acura<strong>da</strong> que a tradição exotérica? Depende do contexto. Afinal, as tradições<br />

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