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Metodologia e Pré-História da África - unesdoc - Unesco

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178 <strong>Metodologia</strong> e pré -história <strong>da</strong> <strong>África</strong><br />

a fim de salvar a vi<strong>da</strong> de uma mulher procura<strong>da</strong> que ele havia escondido em sua<br />

casa. Após o incidente, renunciou espontaneamente ao cargo, supondo que já<br />

não mais preenchia as condições rituais para assumi -lo lidimamente.<br />

Quando se trata de questões religiosas e sagra<strong>da</strong>s, os grandes mestres<br />

tradicionais não temem a opinião desfavorável <strong>da</strong>s massas e, se acaso cometem<br />

um engano, admitem o erro publicamente, sem desculpas calcula<strong>da</strong>s ou evasivas.<br />

Para eles, reconhecer quaisquer faltas que tenham cometido é uma obrigação,<br />

pois significa purificar -se <strong>da</strong> profanação.<br />

Se o tradicionalista ou “Conhecedor” é tão respeitado na <strong>África</strong>, é porque ele<br />

se respeita a si próprio. Disciplinado interiormente, uma vez que jamais deve<br />

mentir, é um homem “bem equilibrado”, mestre <strong>da</strong>s forças que nele habitam. Ao<br />

seu redor as coisas se ordenam e as perturbações se aquietam.<br />

Independentemente <strong>da</strong> interdição <strong>da</strong> mentira, ele pratica a disciplina <strong>da</strong><br />

palavra e não a utiliza imprudentemente. Pois se a fala, como vimos, é considera<strong>da</strong><br />

uma exteriorização <strong>da</strong>s vibrações de forças interiores, inversamente, a força<br />

interior nasce <strong>da</strong> interiorização <strong>da</strong> fala.<br />

A partir dessa óptica, pode -se compreender melhor a importância que a<br />

educação tradicional africana atribui ao autocontrole. Falar pouco é sinal de boa<br />

educação e de nobreza. Muito cedo, o jovem aprende a dominar a manifestação<br />

de suas emoções ou de seu sofrimento, aprende a conter as forças que nele<br />

existem, à semelhança do Maa primordial que continha dentro de si, submissas<br />

e ordena<strong>da</strong>s, to<strong>da</strong>s as forças do Cosmo.<br />

Dir -se -á de um “Conhecedor” respeitado ou de um homem que é mestre<br />

de si mesmo: “É um Maa!” (ou um Neddo, em fulfulde), quer dizer, um homem<br />

completo.<br />

Não se deve confundir os tradicionalistas -doma, que sabem ensinar enquanto<br />

divertem e se colocam ao alcance <strong>da</strong> audiência, com os trovadores, contadores<br />

de história e animadores públicos, que em geral pertencem à casta dos Dieli<br />

(griots) ou dos Woloso (“cativos de casa”) 5 . Para estes, a disciplina <strong>da</strong> ver<strong>da</strong>de não<br />

existe; e, como veremos adiante, a tradição lhes concede o direito de travesti -la<br />

ou de embelezar os fatos, mesmo que grosseiramente, contanto que consigam<br />

divertir ou interessar o público. “O griot”, como se diz, “pode ter duas línguas”.<br />

Ao contrário, nenhum africano de formação tradicionalista sequer sonharia<br />

em colocar em dúvi<strong>da</strong> a veraci<strong>da</strong>de <strong>da</strong> fala de um tradicionalista -doma,<br />

5 Os Woloso (literalmente “os nascidos na casa”), ou “cativos de casa”, eram empregados ou famílias de<br />

empregados ligados há gerações a uma mesma família. A tradição concedia -lhes liber<strong>da</strong>de total de ação<br />

e expressão bem como consideráveis direitos materiais sobre os bens de seus senhores.

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