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_Manual de Direito Administrativo_(2017)_Jose dos Santos Carvalho Filho

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pública, sem que valha o argumento do direito adquirido”. 122 Recentemente, rediscutido o tema, a Corte reiterou essa<br />

orientação, averbando que “não fere direito adquirido <strong>de</strong>cisão que, no curso <strong>de</strong> processamento <strong>de</strong> pedido <strong>de</strong> licença <strong>de</strong><br />

construção em projeto <strong>de</strong> loteamento, estabelece novas regras <strong>de</strong> ocupação do solo”. 123<br />

Em que pese ser pacífico o entendimento, parece-nos, no mínimo, estranho e incompatível com o instituto da licença e <strong>de</strong><br />

seu caráter <strong>de</strong> ato vinculado e <strong>de</strong>finitivo. A<strong>de</strong>mais, sempre se assegura, na hipótese em questão, in<strong>de</strong>nização ao prejudicado, o<br />

que não se coaduna com a figura da revogação <strong>dos</strong> atos administrativos. Por essa razão, há autorizada doutrina que prefere ver<br />

nesses casos verda<strong>de</strong>ira <strong>de</strong>sapropriação do direito, este sim instituto que se compa<strong>de</strong>ce com o <strong>de</strong>ver in<strong>de</strong>nizatório atribuído ao<br />

Po<strong>de</strong>r Público. 124<br />

2.2. Permissão<br />

Permissão é o ato administrativo discricionário e precário pelo qual a Administração consente que o particular execute<br />

serviço <strong>de</strong> utilida<strong>de</strong> pública ou utilize privativamente bem público. Como regra, a permissão é ato discricionário e precário, no<br />

sentido <strong>de</strong> que o administrador po<strong>de</strong> sopesar critérios administrativos para expedi-la, <strong>de</strong> um lado, e <strong>de</strong> outro não será conferido<br />

ao permissionário o direito à continuida<strong>de</strong> do que foi permitido, <strong>de</strong> modo que po<strong>de</strong>rá o consentimento ser posteriormente<br />

revogado sem in<strong>de</strong>nização ao prejudicado. 125 Convém observar, todavia, que esse é o sentido clássico do ato <strong>de</strong> permissão, mas<br />

atualmente existem inúmeras restrições e modificações do instituto no sistema normativo vigente.<br />

A precarieda<strong>de</strong>, aliás, ficou expressa na disciplina relativa à permissão <strong>de</strong> serviço público. Com efeito, a Lei nº 8.987, <strong>de</strong><br />

13.2.1995, ao <strong>de</strong>finir o instituto, afirma que ele retrata uma <strong>de</strong>legação, a título precário, da prestação <strong>de</strong> serviços públicos (art. 2º,<br />

IV). Essa característica indica uma posição favorável da Administração Pública na relação jurídica, já que o titular da permissão<br />

não po<strong>de</strong>rá opor-se à vonta<strong>de</strong> administrativa <strong>de</strong> extinguir o ato.<br />

É verda<strong>de</strong>, todavia, que no atual sistema constitucional (art. 175) e na disciplina fixada na mencionada lei a permissão <strong>de</strong><br />

serviços públicos há <strong>de</strong> ser precedida <strong>de</strong> licitação, o que, logicamente, reduz em muito o âmbito da precarieda<strong>de</strong> do ato. É que, se<br />

a escolha do permissionário resulta <strong>de</strong> procedimento licitatório formal, não po<strong>de</strong> o permitente, a seu exclusivo juízo, dar fim ao<br />

ato, salvo se houver interesse público <strong>de</strong>vidamente justificado.<br />

Embora seja, <strong>de</strong> regra, inteiramente discricionária, e nesse caso po<strong>de</strong> ser chamada <strong>de</strong> simples ou incondicionada, a<br />

permissão po<strong>de</strong>rá ser condicionada (também chamada <strong>de</strong> contratual), 126 quando o próprio Po<strong>de</strong>r Público criar autolimitações,<br />

que po<strong>de</strong>m se referir a prazo, razões <strong>de</strong> revogação, garantias aos permissionários etc. Nessas hipóteses, a discricionarieda<strong>de</strong><br />

administrativa sofrerá mitigação, pois que a liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> atuação por parte do administrador esbarrará nas condições que ele<br />

próprio estabeleceu. Exemplo: se uma <strong>de</strong>terminada permissão <strong>de</strong> uso <strong>de</strong> bem público é outorgada sem qualquer condição, a<br />

Administração é livre para revogá-la. Se, todavia, é garantido o prazo mínimo <strong>de</strong> um ano, a Administração terá que respeitar tal<br />

prazo, pena <strong>de</strong>, não o fazendo, possibilitar que o permissionário postule a reparação <strong>de</strong> seus prejuízos pela extinção antecipada.<br />

Além da permissão para execução <strong>de</strong> serviços públicos, po<strong>de</strong> ela consentir o uso, por particular, <strong>de</strong> um bem público.<br />

Chamar-se-á, nessa hipótese, <strong>de</strong> permissão <strong>de</strong> uso <strong>de</strong> bem público, tema que, por sua pertinência, será <strong>de</strong>senvolvido no capítulo<br />

<strong>de</strong>dicado ao domínio público, no tópico relativo ao uso <strong>dos</strong> bens públicos (vi<strong>de</strong> Capítulo 16).<br />

É importante registrar, a propósito do tema, que a clássica permissão <strong>de</strong> serviços públicos, como ato administrativo,<br />

<strong>de</strong>sapareceu do sistema. Anteriormente, eram admitidas, com formas bem <strong>de</strong>finidas, duas modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> prestação <strong>de</strong> serviços<br />

públicos: uma através da concessão <strong>de</strong> serviços públicos, com a natureza jurídica <strong>de</strong> contrato administrativo; outra, por meio da<br />

permissão <strong>de</strong> serviços públicos, com a fisionomia <strong>de</strong> ato administrativo. Entretanto, a Lei nº 8.987/1995, referindo-se à<br />

permissão <strong>de</strong> serviços públicos, conferiu-lhe natureza jurídica contratual, consi<strong>de</strong>rando-a contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, 127 isso com base<br />

no próprio art. 175, parágrafo único, inc. I, da CF, que já <strong>de</strong>ixara dúvidas em seu enunciado, por transmitir a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que a<br />

permissão <strong>de</strong> serviços públicos se revestiria <strong>de</strong> forma contratualizada.<br />

A nova postura legal, portanto, <strong>de</strong>scartou a permissão <strong>de</strong> serviços públicos como ato administrativo, da forma clássica como<br />

era consi<strong>de</strong>rada. Aliás, com o tratamento estabelecido na lei, fica difícil saber, em termos atuais, quais as linhas diferenciais<br />

efetivas que <strong>de</strong>marcariam a diferença entre a concessão e a permissão <strong>de</strong> serviços públicos. 128<br />

Diante <strong>de</strong> tudo isso, reduziu-se a um mínimo <strong>de</strong> extensão o universo <strong>de</strong> atos administrativos <strong>de</strong> permissão. Po<strong>de</strong>mos dizer,<br />

sem medo <strong>de</strong> errar, que, erradica<strong>dos</strong> os atos administrativos <strong>de</strong> permissão <strong>de</strong> serviços públicos, restaram apenas os atos <strong>de</strong><br />

permissão <strong>de</strong> uso <strong>de</strong> bens públicos, cuja disciplina não é alcançada nem pelo art. 175 da CF nem pela Lei nº 8.987/1995. O<br />

estudo sobre essa permissão será apresentado, como já foi dito, no Capítulo 16, <strong>de</strong>stinado aos bens públicos.<br />

Em síntese, e para não nos afastarmos da didática da obra, po<strong>de</strong>mos consi<strong>de</strong>rar como admissíveis duas modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />

permissão: (1) a permissão <strong>de</strong> uso <strong>de</strong> bens públicos, qualificado como ato administrativo unilateral, discricionário e precário<br />

(po<strong>de</strong>ndo, contudo, ser condicionada, como vimos); (2) a permissão <strong>de</strong> serviços públicos, com a natureza legal <strong>de</strong> contrato

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