02.08.2017 Views

_Manual de Direito Administrativo_(2017)_Jose dos Santos Carvalho Filho

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

cabíveis está, como vimos, o mandado <strong>de</strong> injunção, remédio a<strong>de</strong>quado conforme a natureza do direito <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte da<br />

regulamentação.<br />

A ausência, na lei, <strong>de</strong> fixação <strong>de</strong> prazo para a regulamentação afigura-se-nos inconstitucional, uma vez que não po<strong>de</strong> o<br />

Legislativo <strong>de</strong>ixar ao exclusivo alvedrio do Executivo a prerrogativa <strong>de</strong> só tornar a lei exequível quando julgar conveniente.<br />

Primeiramente, inexiste tal prerrogativa na Constituição. E <strong>de</strong>pois tal situação equivaleria a uma disfarçada <strong>de</strong>legação <strong>de</strong><br />

po<strong>de</strong>res, o que é proibido no vigente sistema constitucional.<br />

REGULAMENTOS AUTÔNOMOS – Lavra funda divergência na doutrina sobre a possibilida<strong>de</strong>, ou não, <strong>de</strong> o Executivo<br />

editar os <strong>de</strong>nomina<strong>dos</strong> regulamentos autônomos, atos <strong>de</strong>stina<strong>dos</strong> a prover sobre situações não contempladas na lei. 59<br />

Uma primeira posição <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> sua existência no <strong>Direito</strong> brasileiro como <strong>de</strong>corrente <strong>dos</strong> po<strong>de</strong>res implícitos da<br />

Administração. 60 Outros professam o entendimento <strong>de</strong> que, conquanto possam teoricamente existir, os regulamentos autônomos<br />

não são admiti<strong>dos</strong> no or<strong>de</strong>namento jurídico pátrio, e isso porque a Carta vigente, como visto, atribui à Chefia do Executivo o<br />

po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> editar atos para a fiel execução das leis, razão por que só teria admitido os regulamentos <strong>de</strong> execução. 61<br />

Refletindo sobre o tema, enten<strong>de</strong>mos que esta última posição é a que melhor se compatibiliza com nosso sistema jurídico.<br />

Realmente, não conseguimos encontrar no vigente quadro constitucional respaldo para admitir-se a edição <strong>de</strong> regulamentos<br />

autônomos. Está à mostra em nosso sistema político que ao Executivo foi apenas conferido o po<strong>de</strong>r regulamentar <strong>de</strong>rivado, ou<br />

seja, aquele que pressupõe a edição <strong>de</strong> lei anteriormente promulgada, que necessite do seu exercício para viabilizar a efetiva<br />

aplicação <strong>de</strong> suas normas.<br />

Sob a égi<strong>de</strong> da Constituição <strong>de</strong> 1967, sustentava-se a existência <strong>de</strong> regulamentos autônomos pela circunstância <strong>de</strong> se<br />

conferir ao Presi<strong>de</strong>nte da República competência para dispor sobre a estruturação, atribuições e funcionamento <strong>dos</strong> órgãos da<br />

administração fe<strong>de</strong>ral. 62 A vigente Constituição, entretanto, teve dicção diferente, atribuindo competência para dispor sobre a<br />

organização e o funcionamento da administração fe<strong>de</strong>ral “na forma da lei”, insinuando a supressão <strong>de</strong> qualquer autonomia<br />

normativa para o Presi<strong>de</strong>nte da República. 63 A EC nº 32, <strong>de</strong> 11.9.2001, porém, modificando o art. 84, VI, da CF, excluiu aquela<br />

expressão e retornou ao sistema da Constituição anterior, atribuindo ao Presi<strong>de</strong>nte da República competência para dispor,<br />

mediante <strong>de</strong>creto, sobre “organização e funcionamento da administração fe<strong>de</strong>ral, quando não implicar aumento <strong>de</strong> <strong>de</strong>spesa nem<br />

criação ou extinção <strong>de</strong> órgãos públicos”. Em consequência, os simpatizantes da admissibilida<strong>de</strong> <strong>dos</strong> regulamentos autônomos<br />

po<strong>de</strong>rão reforçar seu entendimento, invocando o novo texto constitucional. 64<br />

Não obstante, mesmo diante da alteração processada na Constituição, permanecemos fiel ao pensamento que expressamos<br />

acima. Aliás, a questão <strong>dos</strong> <strong>de</strong>cretos e regulamentos autônomos <strong>de</strong>ve ser colocada em termos mais precisos. Para que sejam<br />

caracteriza<strong>dos</strong> como tais, é necessário que os atos possam criar e extinguir primariamente direitos e obrigações, vale dizer, sem<br />

prévia lei disciplinadora da matéria ou, se se preferir, colmatando lacunas legislativas. Atos <strong>de</strong>ssa natureza não po<strong>de</strong>m existir em<br />

nosso or<strong>de</strong>namento porque a tanto se opõe o art. 5º, II, da CF, que fixa o postulado da reserva legal para a exigibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

obrigações. Para que fossem admiti<strong>dos</strong>, seria impositivo que a Constituição <strong>de</strong>ixasse clara, nítida, indubitável, a viabilida<strong>de</strong><br />

jurídica <strong>de</strong> sua edição por agentes da Administração, como o fez, por exemplo, ao atribuir ao Presi<strong>de</strong>nte da República o po<strong>de</strong>r<br />

constitucional <strong>de</strong> legislar através <strong>de</strong> medidas provisórias (art. 62, CF). Aqui, sim, o po<strong>de</strong>r legiferante é direto e primário, mas os<br />

atos são efetivamente legislativos, e não regulamentares. Ao contrário, <strong>de</strong>cretos e regulamentos autônomos estampariam po<strong>de</strong>r<br />

legiferante indireto e simulado, e este não encontra suporte na Constituição.<br />

Os atos <strong>de</strong> organização e funcionamento da Administração Fe<strong>de</strong>ral, ainda que tenham conteúdo normativo, são meros atos<br />

ordinatórios, ou seja, atos que se preor<strong>de</strong>nam basicamente ao setor interno da Administração para dispor sobre seus serviços e<br />

órgãos, <strong>de</strong> modo que só reflexamente afetam a esfera jurídica <strong>de</strong> terceiros, e assim mesmo mediante imposições <strong>de</strong>rivadas ou<br />

subsidiárias, mas nunca originárias. Esse aspecto não é suficiente para converter os atos em <strong>de</strong>cretos ou regulamentos<br />

autônomos. Na verda<strong>de</strong>, vários outros atos, além do <strong>de</strong>creto, dispõem sobre a organização administrativa, como é o caso <strong>de</strong><br />

avisos ministeriais, resoluções, provimentos, portarias, instruções, or<strong>de</strong>ns <strong>de</strong> serviço. A diferença é apenas <strong>de</strong> hierarquia do<br />

agente responsável pela prática do ato e da maior ou menor amplitu<strong>de</strong> <strong>de</strong> seu objeto. O conteúdo organizacional, no entanto, é o<br />

mesmo. 65<br />

É mister, todavia, distinguir os <strong>de</strong>cretos e regulamentos como atos administrativos e os <strong>de</strong>cretos oriun<strong>dos</strong> do exercício da<br />

função política da competência do Presi<strong>de</strong>nte da República. É o caso, por exemplo, <strong>dos</strong> <strong>de</strong>cretos <strong>de</strong> intervenção (art. 36, § 1º,<br />

CF), <strong>de</strong> estado <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa (art. 136, § 1º, CF) e <strong>de</strong> estado <strong>de</strong> sítio (art. 138, CF). Ao contrário <strong>dos</strong> atos administrativos, cuida-se <strong>de</strong><br />

atos políticos e <strong>de</strong> natureza primária, nesse caso porque emanam diretamente da Constituição, como ocorre com os regimentos<br />

<strong>de</strong> Tribunais e resoluções <strong>de</strong> órgãos legislativos. Por tal razão, e somente por ela, é que se po<strong>de</strong>m consi<strong>de</strong>rar autônomos. Os atos<br />

administrativos, como já visto, pressupõem a existência <strong>de</strong> lei, ainda que provenham das autorida<strong>de</strong>s mais graduadas da<br />

Administração. Em consequência, apenas estes, e não aqueles, é que são idôneos ao exercício do efetivo po<strong>de</strong>r regulamentar.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!