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_Manual de Direito Administrativo_(2017)_Jose dos Santos Carvalho Filho

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Estado reparar o dano <strong>de</strong> forma proporcional à sua participação no evento lesivo e ao lesado arcar com o prejuízo<br />

correspon<strong>de</strong>nte a sua própria conduta. 49<br />

Em certas circunstâncias, a situação <strong>de</strong>corrente <strong>de</strong> danos provoca<strong>dos</strong> por fatos <strong>de</strong> terceiros assemelha-se à relativa aos fatos<br />

imprevisíveis no que concerne à análise da responsabilida<strong>de</strong> civil da Administração. Sem que se possa imputar atuação omissiva<br />

direta ao Estado, não há como responsabilizá-lo civilmente por atos <strong>de</strong> terceiros. Somente mediante a constatação <strong>de</strong> que a<br />

omissão foi a responsável conjunta pela ocorrência do dano é que se po<strong>de</strong> atribuir a responsabilida<strong>de</strong> estatal. É o caso,<br />

lamentavelmente frequente, <strong>de</strong> furtos e assaltos à mão armada em transportes coletivos ou na via pública. Sem a prova da culpa,<br />

não há como responsabilizar a empresa concessionária <strong>de</strong> transporte, já que ela própria assume a condição <strong>de</strong> lesada juntamente<br />

com os passageiros. Nesse sentido se têm pronunciado os Tribunais. 50 É justo reconhecer que opiniões em sentido contrário se<br />

justificam em razão do cansaço da socieda<strong>de</strong> pelo alto grau <strong>de</strong> violência que tem assolado as gran<strong>de</strong>s cida<strong>de</strong>s. Semelhante visão,<br />

porém, funda-se em argumento <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m emocional, que, por isso mesmo, resulta dissociado da verda<strong>de</strong>ira análise jurídica. 51<br />

5.<br />

ATOS DE MULTIDÕES<br />

Não é incomum que os indivíduos sofram prejuízos em razão <strong>de</strong> atos danosos pratica<strong>dos</strong> por agrupamentos <strong>de</strong> pessoas. Nas<br />

socieda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> massa atuais se torna cada vez mais comum que multidões dirijam sua fúria <strong>de</strong>struidora a bens particulares,<br />

normalmente quando preten<strong>de</strong>m evi<strong>de</strong>nciar algum protesto contra situações especiais. Em todo o mundo ocorrem esses<br />

movimentos, ora <strong>de</strong> estudantes contra a polícia, ora da população contra o Estado, ora <strong>de</strong> <strong>de</strong>linquentes contra o indivíduo.<br />

Sabemos que, nos agrupamentos <strong>de</strong> pessoas, o indivíduo per<strong>de</strong> muito <strong>dos</strong> parâmetros que <strong>de</strong>marcam seus valores morais e sociais,<br />

<strong>de</strong>ixando-se levar pela caudalosa corrente do grupo e agindo, <strong>de</strong>ntro do grupo, como não o faria individualmente. Daí ser<br />

reconhecida hoje a chamada psicologia das multidões.<br />

Qual a repercussão <strong>dos</strong> atos <strong>de</strong> multidões na responsabilida<strong>de</strong> civil do Estado?<br />

A regra, aceita no direito mo<strong>de</strong>rno, é a <strong>de</strong> que os danos causa<strong>dos</strong> ao indivíduo em <strong>de</strong>corrência exclusivamente <strong>de</strong> tais atos<br />

não acarreta a responsabilida<strong>de</strong> civil do Estado, já que, na verda<strong>de</strong>, são ti<strong>dos</strong> como atos pratica<strong>dos</strong> por terceiros. Sequer existem<br />

os pressupostos da responsabilida<strong>de</strong> objetiva do Estado, seja pela ausência da conduta administrativa, seja por falta <strong>de</strong> nexo<br />

causal entre atos estatais e o dano. Pelo inusitado ou pela rapi<strong>de</strong>z com que os fatos ocorrem, não se po<strong>de</strong> atribuir os seus efeitos a<br />

qualquer ação ou omissão do Po<strong>de</strong>r Público. 52<br />

Ocorre, porém, que, em certas situações, se torna notória a omissão do Po<strong>de</strong>r Público, porque teria ele a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

garantir o patrimônio das pessoas e evitar os danos provoca<strong>dos</strong> pela multidão. Nesse caso, é claro que existe uma conduta<br />

omissiva do Estado, assim como é indiscutível o reconhecimento do nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong> entre a conduta e o dano, configuran<strong>dos</strong>e,<br />

então, a responsabilida<strong>de</strong> civil do Estado. Trata-se, pois, <strong>de</strong> situação em que fica cumpridamente provada a omissão culposa<br />

do Po<strong>de</strong>r Público. Essa é a orientação que tem norteado a jurisprudência a respeito do assunto. 53<br />

Suponha-se, para exemplificar, que se esteja formando um agrupamento com mostras <strong>de</strong> hostilida<strong>de</strong> em certo local on<strong>de</strong> há<br />

várias casas comerciais. Se os órgãos <strong>de</strong> segurança tiverem sido avisa<strong>dos</strong> a tempo e ainda assim não tiverem comparecido os seus<br />

agentes, a conduta estatal estará qualificada como omissiva culposa, ensejando, por conseguinte, a responsabilida<strong>de</strong> civil do<br />

Estado, em or<strong>de</strong>m a reparar os danos causa<strong>dos</strong> pelos atos multitudinários. Tal como na hipótese <strong>dos</strong> fatos imprevisíveis, contudo,<br />

a in<strong>de</strong>nização será proporcional à participação omissiva do Estado no resultado danoso.<br />

6.<br />

DANOS DE OBRA PÚBLICA<br />

A questão da responsabilida<strong>de</strong> do Estado oriunda <strong>de</strong> danos provoca<strong>dos</strong> por obras públicas tem apresentado alguma<br />

controvérsia entre os estudiosos e nas <strong>de</strong>cisões judiciais. Entretanto, parece-nos que se po<strong>de</strong> estabelecer um sistema lógico para o<br />

assunto, procurando distinguir as várias hipóteses que o tema encerra.<br />

A primeira hipótese é aquela em que o dano é provocado pelo só fato da obra. Por alguma razão natural ou imprevisível, e<br />

sem que tenha havido culpa <strong>de</strong> alguém, a obra pública causa dano ao particular. Se tal ocorrer, dar-se-á a responsabilida<strong>de</strong><br />

objetiva do Estado, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> quem esteja executando a obra, eis que presentes to<strong>dos</strong> os pressupostos para sua<br />

configuração. 54 Ainda que não se possa caracterizar <strong>de</strong> ilícita a ativida<strong>de</strong> estatal, a responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>corre da própria teoria do<br />

risco administrativo. 55<br />

Uma segunda hipótese pressupõe que o Estado tenha cometido a execução da obra a um empreiteiro através <strong>de</strong> contrato<br />

administrativo, e que o dano tenha sido provocado exclusivamente por culpa do executor. A solução será a <strong>de</strong> atribuir-se ao<br />

empreiteiro a responsabilida<strong>de</strong> subjetiva comum <strong>de</strong> direito privado, sabido que cumpre o contrato sob sua conta e risco. A ação<br />

<strong>de</strong>ve ser movida, no caso, somente contra o empreiteiro, sem participação do Estado no processo. A responsabilida<strong>de</strong> do Estado é<br />

subsidiária, isto é, só estará configurada se o executor não lograr reparar os prejuízos que causou ao prejudicado. 56

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