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_Manual de Direito Administrativo_(2017)_Jose dos Santos Carvalho Filho

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consiste na in<strong>de</strong>terminação do prazo da relação <strong>de</strong> trabalho. Constitui, porém, evi<strong>de</strong>nte simulação a celebração <strong>de</strong> contratos <strong>de</strong><br />

locação <strong>de</strong> serviços como instrumento para recrutar servidores, ainda que seja do interesse <strong>de</strong> empresas públicas e socieda<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />

economia mista. 55<br />

Depois, temos o pressuposto da temporarieda<strong>de</strong> da função: a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sses serviços <strong>de</strong>ve ser sempre temporária. Se a<br />

necessida<strong>de</strong> é permanente, o Estado <strong>de</strong>ve processar o recrutamento através <strong>dos</strong> <strong>de</strong>mais regimes. Está, por isso, <strong>de</strong>scartada a<br />

admissão <strong>de</strong> servidores temporários para o exercício <strong>de</strong> funções permanentes; se tal ocorrer, porém, haverá indisfarçável<br />

simulação, e a admissão será inteiramente inválida. Lamentavelmente, algumas Administrações, insensíveis (para dizer o<br />

mínimo) ao citado pressuposto, tentam fazer contratações temporárias para funções permanentes, em flagrante tentativa <strong>de</strong><br />

fraudar a regra constitucional. Tal conduta, além <strong>de</strong> dissimular a ilegalida<strong>de</strong> do objetivo, não po<strong>de</strong> ter outro elemento<br />

mobilizador senão o <strong>de</strong> favorecer a alguns apanigua<strong>dos</strong> para ingressarem no serviço público sem concurso, o que caracteriza<br />

inegável <strong>de</strong>svio <strong>de</strong> finalida<strong>de</strong>. 56 Caso a função seja permanente, a contratação temporária só é legítima se a Administração<br />

comprovar situação emergencial e transitória, com previsão <strong>de</strong> ser posteriormente superada. 57<br />

O último pressuposto é a excepcionalida<strong>de</strong> do interesse público que obriga ao recrutamento. Empregando o termo<br />

excepcional para caracterizar o interesse público do Estado, a Constituição <strong>de</strong>ixou claro que situações administrativas comuns<br />

não po<strong>de</strong>m ensejar o chamamento <strong>de</strong>sses servidores. Portanto, po<strong>de</strong> dizer-se que a excepcionalida<strong>de</strong> do interesse público<br />

correspon<strong>de</strong> à excepcionalida<strong>de</strong> do próprio regime especial. 58 Algumas vezes o Po<strong>de</strong>r Público, tal como suce<strong>de</strong> com o<br />

pressuposto anterior e em regra com o mesmo <strong>de</strong>svio <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r, simula <strong>de</strong>sconhecimento <strong>de</strong> que a excepcionalida<strong>de</strong> do interesse<br />

público é requisito inafastável para o regime especial. 59<br />

Sensível a esse tipo <strong>de</strong> evi<strong>de</strong>nte abuso – no mínimo ofensivo ao princípio da moralida<strong>de</strong> administrativa –, o STF julgou<br />

proce<strong>de</strong>nte ação direta e <strong>de</strong>clarou a inconstitucionalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> lei estadual que permitia o recrutamento <strong>de</strong> servidores pelo regime<br />

especial temporário, calcando-se em dois fundamentos: (1 o ) falta <strong>de</strong> especificação das ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> excepcional interesse<br />

público; (2 o ) ausência <strong>de</strong> motivação quanto à real necessida<strong>de</strong> temporária das funções a serem exercidas. 60 Idêntica<br />

inconstitucionalida<strong>de</strong> ocorre se a lei fixa hipóteses abrangentes e genéricas, sem indicar as situações <strong>de</strong> emergência, bem como<br />

inclui carreiras e cargos permanentes do Estado. 61 A orientação é <strong>de</strong> todo louvável e registra acertado controle sobre esse tipo<br />

<strong>de</strong> admissão <strong>de</strong> servidores em <strong>de</strong>sconformida<strong>de</strong> com o parâmetro constitucional. Outra inconstitucionalida<strong>de</strong> foi <strong>de</strong>clarada em<br />

hipótese na qual lei estadual estabilizou servidores recruta<strong>dos</strong> apenas pelo regime temporário sem concurso público. 62<br />

Em suma, o que se po<strong>de</strong> afirmar, para a correta observância do art. 37, IX, da CF, é que os pressupostos constitucionais<br />

não po<strong>de</strong>m ser <strong>de</strong>scarta<strong>dos</strong> por leis estaduais ou municipais, ao tratar da matéria. Leis que disponham sobre regime especial <strong>de</strong><br />

contratação temporária sem fixar prazo máximo <strong>de</strong> contratação (<strong>de</strong>terminabilida<strong>de</strong> temporal) ou a circunstância relativa à<br />

excepcionalida<strong>de</strong> são flagrantemente inconstitucionais e <strong>de</strong>vem ser excluídas no sistema normativo. 63<br />

Lamentavelmente, a contratação pelo regime especial, em certas situações, tem servido mais a interesses pessoais do que<br />

ao interesse administrativo. Por intermédio <strong>de</strong>sse regime, têm ocorrido contratações “temporárias” com inúmeras prorrogações,<br />

o que as torna verda<strong>de</strong>iramente permanentes. Ocorre também que a Administração realiza concurso para investidura legítima<br />

em regime estatutário ou trabalhista e, ao invés <strong>de</strong> nomear ou contratar os aprova<strong>dos</strong>, contrata terceiros para as mesmas funções.<br />

Trata-se <strong>de</strong> condutas que refletem <strong>de</strong>svio <strong>de</strong> finalida<strong>de</strong> e que merecem invalidação em face <strong>dos</strong> princípios da legalida<strong>de</strong> e da<br />

moralida<strong>de</strong> administrativa. Po<strong>de</strong> até mesmo concluir-se que semelhantes distorções ofen<strong>de</strong>m o princípio da valorização do<br />

trabalho humano, previsto no art. 170, caput, da Carta vigente, até porque têm sido <strong>de</strong>spreza<strong>dos</strong> alguns <strong>dos</strong> direitos<br />

fundamentais <strong>dos</strong> servidores. 64<br />

A União Fe<strong>de</strong>ral, fundada no art. 37, IX, da CF, promulgou lei reguladora <strong>de</strong>sse regime. Trata-se da Lei n o 8.745, <strong>de</strong><br />

9.12.1993, na qual foram estabeleci<strong>dos</strong> diversos casos consi<strong>de</strong>ra<strong>dos</strong> <strong>de</strong> necessida<strong>de</strong> temporária <strong>de</strong> excepcional interesse público,<br />

os prazos <strong>de</strong> contratação e a incidência <strong>de</strong> algumas regras do regime estatutário. Destacam-se, entre as citadas ativida<strong>de</strong>s, as <strong>de</strong><br />

contratação em ocasião <strong>de</strong> calamida<strong>de</strong> pública, surtos endêmicos, recenseamentos, admissão <strong>de</strong> professor estrangeiro e algumas<br />

funções específicas das Forças Armadas.<br />

O citado diploma tem sofrido alterações por leis posteriores, normalmente para a inserção <strong>de</strong> novas hipóteses permissivas<br />

<strong>de</strong>sse tipo <strong>de</strong> contratação. Uma <strong>de</strong>las foi a contratação <strong>de</strong> assistência e emergências em saú<strong>de</strong> pública, com dispensa do<br />

processo seletivo em razão da peculiarida<strong>de</strong> emergencial da situação, e com prazo máximo <strong>de</strong> dois anos. 65 Outra consiste na<br />

adoção do regime para admissão <strong>de</strong> pesquisador, <strong>de</strong> técnico com formação em área tecnológica <strong>de</strong> nível intermediário ou <strong>de</strong><br />

tecnólogo, nacionais ou estrangeiros, para projetos <strong>de</strong> pesquisa com prazo <strong>de</strong>terminado, em entida<strong>de</strong> <strong>de</strong>stinada à pesquisa, ao<br />

<strong>de</strong>senvolvimento e à inovação. 66<br />

Para evitar simulação, permitindo, por via oblíqua, a continuação, por prazo in<strong>de</strong>terminado, do contrato temporário, a lei<br />

vedou, como regra, nova contratação antes <strong>de</strong> <strong>de</strong>corri<strong>dos</strong> dois anos do encerramento do contrato anterior (art. 9 o , III). No

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