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_Manual de Direito Administrativo_(2017)_Jose dos Santos Carvalho Filho

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A nosso ver, nada justifica essa diferença <strong>de</strong> tratamento. Na verda<strong>de</strong>, inexiste qualquer razão consistente para que as<br />

empresas públicas fe<strong>de</strong>rais litiguem na justiça fe<strong>de</strong>ral. Sendo entida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> direito privado e evi<strong>de</strong>ntemente aproximadas às<br />

socieda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> economia mista, <strong>de</strong>veriam, juntamente com estas, e por coerência, ter seus processos aprecia<strong>dos</strong> na justiça<br />

estadual.<br />

Como se po<strong>de</strong> ver, a citada diferença – repita-se – abrange apenas as empresas públicas fe<strong>de</strong>rais; as <strong>de</strong>mais litigam na<br />

justiça estadual, na forma do que dispõe a lei <strong>de</strong> organização judiciária do respectivo Estado.<br />

12.<br />

PATRIMÔNIO<br />

Os bens que passam a integrar, inicialmente, o patrimônio das empresas públicas e das socieda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> economia mista<br />

provêm geralmente da pessoa fe<strong>de</strong>rativa instituidora. Esses bens, enquanto pertenciam a esta última, tinham a qualificação <strong>de</strong><br />

bens públicos. Quando, todavia, são transferi<strong>dos</strong> ao patrimônio daquelas entida<strong>de</strong>s, passam a caracterizar-se como bens<br />

priva<strong>dos</strong>, sujeitos à sua própria administração. Sendo bens priva<strong>dos</strong>, não são atribuídas a eles as prerrogativas próprias <strong>dos</strong> bens<br />

públicos, como a imprescritibilida<strong>de</strong>, a impenhorabilida<strong>de</strong>, a alienabilida<strong>de</strong> condicionada etc.<br />

Registre-se, entretanto, que alguns estudiosos advogam o entendimento <strong>de</strong> que são bens públicos <strong>de</strong> uso especial (ou com<br />

<strong>de</strong>stinação especial) aqueles <strong>de</strong> que se socorrem essas entida<strong>de</strong>s quando preor<strong>de</strong>nadas à prestação <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminado serviço<br />

público. 139 Permitimo-nos, contudo, dissentir <strong>de</strong>sse pensamento. O fato <strong>de</strong> estarem alguns bens <strong>de</strong> tais entida<strong>de</strong>s afeta<strong>dos</strong> à<br />

eventual prestação <strong>de</strong> serviços públicos não os converte em bens públicos, pois que nenhuma ressalva em tal sentido mereceu<br />

previsão legal. A situação é a mesma que ocorre com bens <strong>de</strong> concessionários e permissionários <strong>de</strong> serviços públicos. Po<strong>de</strong>m, é<br />

certo, receber uma ou outra proteção especial em virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua afetação, mas isso não os transforma em bens públicos. Por isso,<br />

melhor é que, em semelhante situação, sejam classifica<strong>dos</strong> <strong>de</strong> bens priva<strong>dos</strong> com <strong>de</strong>stinação especial. Quanto aos bens que não<br />

estejam diretamente a serviço do objetivo público da entida<strong>de</strong>, não há dúvida consistente: trata-se <strong>de</strong> bens priva<strong>dos</strong>. Idêntica<br />

classificação têm os bens <strong>de</strong> empresas públicas e socieda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> economia mista quando exploram ativida<strong>de</strong> econômica.<br />

A questão da impenhorabilida<strong>de</strong> <strong>dos</strong> bens <strong>de</strong>ssas entida<strong>de</strong>s tem gerado profunda confusão e <strong>de</strong>cisões divergentes.<br />

Anteriormente, o entendimento era o <strong>de</strong> que tais bens não po<strong>de</strong>riam ter semelhante privilégio, ante o disposto no art. 173, § 1 o ,<br />

II, da CF, ainda que lei anterior in<strong>de</strong>vidamente o garantisse, sendo <strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rar-se que a norma não teria sido recepcionada pela<br />

atual Constituição. 140 Posteriormente, contudo, adotou-se entendimento diametralmente oposto, qual seja, o <strong>de</strong> que a<br />

Constituição teria recepcionado dispositivos <strong>de</strong> lei anterior que continha o privilégio. 141 Concessa venia, ousamos discordar <strong>de</strong><br />

semelhante pensamento. O sistema <strong>de</strong> precatório é aplicável apenas à Fazenda Pública (art. 100, CF), e no sentido <strong>de</strong>sta<br />

evi<strong>de</strong>ntemente não se incluem pessoas administrativas <strong>de</strong> direito privado, como as empresas públicas e socieda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> economia<br />

mista. A extensão da aplicabilida<strong>de</strong> do sistema a tais entida<strong>de</strong>s provoca irreversível prejuízo aos seus credores, já que se trata <strong>de</strong><br />

mecanismo injusto e anacrônico, ao mesmo tempo em que beneficia <strong>de</strong>vedores paraestatais recalcitrantes. Provoca também<br />

inegável perplexida<strong>de</strong> na medida em que o <strong>de</strong>vedor privilegiado é pessoa jurídica <strong>de</strong> direito privado... Não obstante, tal posição<br />

não é pacífica, havendo, inclusive, <strong>de</strong>cisões judiciais em sentido contrário. 142<br />

O Código Civil vigente – diga-se <strong>de</strong> passagem – dissipou quaisquer dúvidas a respeito, dispondo que são públicos os bens<br />

pertencentes a pessoas jurídicas <strong>de</strong> direito público e particulares to<strong>dos</strong> os <strong>de</strong>mais, seja qual for a pessoa a que pertencerem (art.<br />

98). Por conseguinte, se aquelas entida<strong>de</strong>s têm personalida<strong>de</strong> jurídica <strong>de</strong> direito privado, seu patrimônio há <strong>de</strong> caracterizar-se<br />

como privado. Assim, bens <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> economia mista são sujeitos a usucapião, como já se <strong>de</strong>cidiu acertadamente. 143<br />

Avulta notar, ainda, que o Estatuto (Lei nº 10.303/2016) nada dispôs em contrário, reforçando essa interpretação.<br />

É oportuno consignar que a Lei n o 6.404/1976, que regula as socieda<strong>de</strong>s anônimas, já admitia expressamente, no art. 242, a<br />

penhora <strong>de</strong> bens pertencentes a socieda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> economia mista, o que <strong>de</strong>monstrava total incompatibilida<strong>de</strong> com o regime <strong>de</strong> bens<br />

públicos e, ao contrário, indicava claramente que se trata <strong>de</strong> bens priva<strong>dos</strong>, vale dizer, <strong>de</strong>spi<strong>dos</strong> das prerrogativas especiais<br />

atribuídas aos bens públicos. Mesmo com a revogação do citado dispositivo pela Lei n o 10.303, <strong>de</strong> 31.10.2001, permanece a<br />

caracterização. E por mais <strong>de</strong> uma razão. A uma, porque nenhum privilégio quanto a esses bens se encontra na vigente<br />

Constituição; a duas, porque o novo Código Civil só caracteriza como bens públicos os que pertencem a pessoas jurídicas <strong>de</strong><br />

direito público interno (art. 98), o que não é o caso <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> economia mista e empresas públicas.<br />

A administração <strong>dos</strong> bens, incluindo conservação, proteção e os casos <strong>de</strong> alienação e oneração, é disciplinada pelos<br />

estatutos da entida<strong>de</strong>. Nada impe<strong>de</strong>, porém, que em <strong>de</strong>termina<strong>dos</strong> casos a lei (até mesmo a lei autorizadora) trace regras<br />

específicas para os bens, limitando o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> ação <strong>dos</strong> administradores da empresa. No silêncio da lei, entretanto, vale o que<br />

estipularem o estatuto da empresa e as resoluções emanadas <strong>de</strong> sua diretoria.<br />

No caso <strong>de</strong> extinção da entida<strong>de</strong>, a regra é que, liquidadas as obrigações por ela assumidas em face <strong>de</strong> terceiros, o<br />

patrimônio seja incorporado à pessoa controladora, qualificando-se então como públicos esses bens após a incorporação.

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