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_Manual de Direito Administrativo_(2017)_Jose dos Santos Carvalho Filho

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pensamento contrário, segundo o qual cabe ao Estado provar a sua proprieda<strong>de</strong> no caso <strong>de</strong> ausência <strong>de</strong> registro imobiliário. 224<br />

A hesitação, porém, se justifica pela circunstância <strong>de</strong> que a característica mais significativa das terras <strong>de</strong>volutas resi<strong>de</strong> na<br />

in<strong>de</strong>terminação física do bem, ou seja, tais áreas não são <strong>de</strong>terminadas, mas sim <strong>de</strong>termináveis. Resulta que a <strong>de</strong>terminação<br />

<strong>de</strong>ssas áreas <strong>de</strong>verá ser obtida pela ação discriminatória regulada pela Lei n o 6.383/1976. Irreparável, por conseguinte, a seguinte<br />

conclusão: “Esse traço aponta a dificulda<strong>de</strong> em caracterizar a natureza jurídica do vínculo existente entre a União e seu<br />

patrimônio <strong>de</strong>voluto como um direito <strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong> traçado no Código Civil”. 225<br />

2.<br />

TERRENOS DE MARINHA<br />

Terrenos <strong>de</strong> marinha são as áreas que, banhadas pelas águas do mar ou <strong>dos</strong> rios navegáveis, em sua foz, se esten<strong>de</strong>m à<br />

distância <strong>de</strong> 33 metros para a área terrestre, conta<strong>dos</strong> da linha do preamar médio <strong>de</strong> 1831. 226<br />

Os terrenos <strong>de</strong> marinha pertencem à União por expresso mandamento constitucional (art. 20, VII, CF), justificando-se o<br />

domínio fe<strong>de</strong>ral em virtu<strong>de</strong> da necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa e <strong>de</strong> segurança nacional. Caracterizam-se, pois, como bens públicos e sobre<br />

eles inci<strong>de</strong>m todas as prerrogativas inscritas no direito positivo. Diante <strong>de</strong>ssa premissa, está consolidada a jurisprudência segundo<br />

a qual os registros <strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong> particular <strong>de</strong> imóveis em terrenos <strong>de</strong> marinha não são oponíveis à União. 227 Apesar disso, se a<br />

União não provi<strong>de</strong>nciou a <strong>de</strong>marcação da área <strong>de</strong> marinha pelo procedimento administrativo próprio, como exige o Decreto-lei n o<br />

9.760/1946, po<strong>de</strong> o Judiciário <strong>de</strong>cretar o usucapião do imóvel, eis que o jurisdicionado não po<strong>de</strong> ficar à mercê <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong><br />

discricionária futura e incerta da Administração. 228<br />

Entretanto, algumas áreas <strong>dos</strong> terrenos <strong>de</strong> marinha se tornaram urbanas ou urbanizáveis por aquiescência do Governo<br />

Fe<strong>de</strong>ral, passando a ser permitido o uso privado. No que concerne às construções e edificações particulares, inci<strong>de</strong>m<br />

regularmente as normas próprias editadas pelos Esta<strong>dos</strong> e pelos Municípios, estes, inclusive, dota<strong>dos</strong> <strong>de</strong> competência urbanística<br />

local por preceito expresso na Constituição (art. 30, VIII).<br />

Como essas áreas pertencem à União, o uso por particulares é admitido pelo regime da enfiteuse, pelo qual, como vimos, a<br />

União, na qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> senhorio direto, transfere o domínio útil ao particular, enfiteuta, tendo este a obrigação <strong>de</strong> pagar<br />

anualmente importância a título <strong>de</strong> foro ou pensão e <strong>de</strong> pagar também, ao momento <strong>de</strong> transferência onerosa do domínio útil ou<br />

cessão <strong>de</strong> direitos por ato inter vivos, o laudêmio, quando o senhorio não exercer a preferência. 229 Conforme já comentamos<br />

prece<strong>de</strong>ntemente, embora excluído o instituto da enfiteuse do novo Código Civil, foi feita a ressalva do instituto em relação aos<br />

terrenos <strong>de</strong> marinha, em or<strong>de</strong>m a que essa matéria seja suscetível <strong>de</strong> regulação por lei especial (art. 2.038, § 2 o ).<br />

O Decreto-lei nº 3.438, <strong>de</strong> 17.07.1941, que dispõe sobre os terrenos <strong>de</strong> marinha, prevê, para estes e seus acresci<strong>dos</strong>, o<br />

regime enfitêutico, excepcionando os necessários aos logradouros e serviços públicos (art. 4º). Entretanto, a já citada Lei nº<br />

13.240, <strong>de</strong> 30.12.2015, alterando o dispositivo, criou nova exceção, afastando a enfiteuse também quando houver disposição <strong>de</strong><br />

lei em contrário. Assim, no primeiro caso teremos exceções fáticas, ao passo que no segundo a lei passou a contemplar exceções<br />

jurídicas.<br />

O Decreto-lei n o 9.760/1946, além da enfiteuse, prevê ainda a figura da ocupação para legitimar o uso <strong>de</strong> terras públicas<br />

fe<strong>de</strong>rais, inclusive a <strong>dos</strong> terrenos <strong>de</strong> marinha, em favor daqueles que já as venham ocupando há <strong>de</strong>terminado tempo. Para tanto, a<br />

lei prevê o cadastramento <strong>de</strong> tais ocupantes pelo SPU (Secretaria <strong>de</strong> Patrimônio da União) e o pagamento da taxa <strong>de</strong> ocupação. O<br />

ato administrativo <strong>de</strong> ocupação, porém, é discricionário e precário, <strong>de</strong> modo que a União, se precisar do imóvel, po<strong>de</strong> promover a<br />

sua <strong>de</strong>socupação sumária, sem que o ocupante tenha direito à permanência. 230<br />

O direito à cobrança da taxa <strong>de</strong> ocupação pela União não é perpétuo. Dispõe a lei que o crédito originado da receita<br />

patrimonial se submete à <strong>de</strong>cadência no prazo <strong>de</strong> <strong>de</strong>z anos para a constituição do crédito, e à prescrição <strong>de</strong> cinco anos para sua<br />

exigência, contado o prazo a partir do lançamento. 231 Significa, pois, que, ultrapassa<strong>dos</strong> tais prazos, fica a Fazenda fe<strong>de</strong>ral<br />

impedida <strong>de</strong> cobrar a referida taxa do ocupante do terreno público. Antes da vigência da Lei n o 9.636/1998, inexistia legislação<br />

específica regulando a matéria, o que gerou divergências quanto ao prazo prescricional para a cobrança da taxa. Prevaleceu,<br />

todavia, a interpretação segundo a qual <strong>de</strong>ve aplicar-se o Decreto n o 20.910/1932, que fixa em cinco anos a prescrição contra a<br />

Fazenda, e não o Código Civil, eis que se trata <strong>de</strong> matéria <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>Administrativo</strong>, e não <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil. 232<br />

A taxa <strong>de</strong> ocupação é suscetível <strong>de</strong> atualização monetária, sendo o critério <strong>de</strong> reajuste estabelecido no art. 1 o do Decreto-lei<br />

n o 2.398/1997. De acordo com esse dispositivo, o cálculo da taxa é efetuado com base no valor do domínio pleno do terreno,<br />

atualizado pelo órgão responsável pelo patrimônio da União. 233 Conquanto haja aqui e ali alguma divergência, esse é o critério<br />

que <strong>de</strong>ve ser observado para a atualização, como já consolidado pela jurisprudência. 234<br />

Outra divergência diz respeito à necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> intimação do ocupante para ciência da atualização do valor da taxa, em<br />

observância ao contraditório previsto na Lei n o 9.784/1999, tese <strong>de</strong>fendida por alguns intérpretes. A alegação, com a <strong>de</strong>vida<br />

vênia, não proce<strong>de</strong>. Se a lei já fixa o critério <strong>de</strong> reajuste, a Administração po<strong>de</strong> executá-la <strong>de</strong> ofício, exercendo seu po<strong>de</strong>r <strong>de</strong>

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