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_Manual de Direito Administrativo_(2017)_Jose dos Santos Carvalho Filho

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Sobre o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> <strong>de</strong>flagrar o processo legislativo para a criação <strong>de</strong> órgãos públicos (iniciativa reservada ou privativa), dois<br />

aspectos merecem realce. De um lado, é inconstitucional a lei sobre a matéria que se tenha originado da iniciativa <strong>de</strong> outro órgão:<br />

se a iniciativa, por exemplo, é do Chefe do Po<strong>de</strong>r Executivo, o projeto <strong>de</strong> lei não po<strong>de</strong> ser apresentado por membro ou comissão<br />

do Legislativo. 31 De outro, <strong>de</strong>ve ser lembrado que a Constituição aponta hipóteses em que a iniciativa reservada é atribuída a<br />

órgãos diversos. Assim, além do art. 61, § 1º, II, “e”, da CF (iniciativa do Presi<strong>de</strong>nte da República e, por simetria, <strong>dos</strong> <strong>de</strong>mais<br />

Chefes do Executivo), encontra-se tal tipo <strong>de</strong> iniciativa nos arts. 96, II, “c” e “d” (iniciativa <strong>dos</strong> Tribunais judiciários), 127, § 2º<br />

(iniciativa do Ministério Público) e 134, § 4º (iniciativa da Defensoria Pública). 32<br />

No Po<strong>de</strong>r Legislativo, a criação e a extinção <strong>de</strong> órgãos se situam <strong>de</strong>ntro do po<strong>de</strong>r que têm suas Casas <strong>de</strong> dispor sobre sua<br />

organização e funcionamento, conforme previsto nos arts. 51, IV (Câmara <strong>dos</strong> Deputa<strong>dos</strong>), e 52, XIII (Senado Fe<strong>de</strong>ral). Por via<br />

<strong>de</strong> consequência, não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m <strong>de</strong> lei, mas sim <strong>de</strong> atos administrativos pratica<strong>dos</strong> pelas respectivas Casas. Como retratam<br />

princípios extensíveis atinentes à organização funcional, tais mandamentos aplicam-se também ao Legislativo <strong>de</strong> Esta<strong>dos</strong>,<br />

Distrito Fe<strong>de</strong>ral e Municípios.<br />

3.<br />

TEORIAS DE CARACTERIZAÇÃO DO ÓRGÃO<br />

Estudioso do tema, CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO observa, em sua conhecida monografia, 33 que há três<br />

teorias que procuram caracterizar os órgãos públicos.<br />

A primeira teoria é a subjetiva, e <strong>de</strong> acordo com ela os órgãos públicos são os próprios agentes públicos. Tal pensamento<br />

não se coaduna com a realida<strong>de</strong> administrativa, pois que, a ser assim, se <strong>de</strong>saparecido o agente, extinto estaria também o órgão.<br />

Temos ainda a teoria objetiva: órgãos públicos seriam as unida<strong>de</strong>s funcionais da organização administrativa. A crítica à<br />

teoria objetiva também tem procedência: é que, pren<strong>de</strong>ndo-se apenas à unida<strong>de</strong> funcional em si, repudia-se o agente, que é o<br />

verda<strong>de</strong>iro instrumento através do qual as pessoas jurídicas recebem a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> querer e agir.<br />

A terceira é a teoria eclética, que não rechaça qualquer <strong>dos</strong> dois elementos – nem o objetivo, significando os círculos <strong>de</strong><br />

competência, nem o subjetivo, ligado aos próprios agentes públicos. Também essa teoria merece a crítica que lhe é feita no<br />

sentido <strong>de</strong> que inci<strong>de</strong> no mesmo contrassenso das primeiras.<br />

O pensamento mo<strong>de</strong>rno resi<strong>de</strong> em caracterizar-se o órgão público como um círculo efetivo <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r que, para tornar efetiva<br />

a vonta<strong>de</strong> do Estado, precisa estar integrado pelos agentes. Em outras palavras, os dois elementos se reclamam entre si, mas não<br />

constituem uma só unida<strong>de</strong>. 34<br />

4.<br />

CONCEITO<br />

Ante a fixação <strong>de</strong>ssas premissas, po<strong>de</strong>-se conceituar o órgão público como o compartimento na estrutura estatal a que são<br />

cometidas funções <strong>de</strong>terminadas, sendo integrado por agentes que, quando as executam, manifestam a própria vonta<strong>de</strong> do Estado.<br />

5.<br />

CAPACIDADE PROCESSUAL<br />

Como círculo interno <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r, o órgão em si é <strong>de</strong>spersonalizado; apenas integra a pessoa jurídica. A capacida<strong>de</strong> processual<br />

é atribuída à pessoa física ou jurídica, como averba o art. 70 do CPC: “Toda pessoa que se encontre no exercício <strong>de</strong> seus direitos<br />

tem capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estar em juízo”. Sendo assim, o órgão não po<strong>de</strong>, como regra geral, ter capacida<strong>de</strong> processual, ou seja,<br />

idoneida<strong>de</strong> para figurar em qualquer <strong>dos</strong> polos <strong>de</strong> uma relação processual. Faltaria a presença do pressuposto processual atinente<br />

à capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estar em juízo. Nesse sentido já <strong>de</strong>cidiu o STF 35 e têm <strong>de</strong>cidido os <strong>de</strong>mais Tribunais. 36<br />

Diferentemente se passa com relação ao mandado <strong>de</strong> segurança, mandado <strong>de</strong> injunção e habeas data: em tais ações, o polo<br />

passivo é integrado pela autorida<strong>de</strong> (pessoa física com função pública) que pertence ao órgão, tendo a lei conferido a ela a<br />

capacida<strong>de</strong> processual.<br />

De algum tempo para cá, todavia, tem evoluído a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> conferir capacida<strong>de</strong> a órgãos públicos para certos tipos <strong>de</strong> litígio.<br />

Um <strong>de</strong>sses casos é o da impetração <strong>de</strong> mandado <strong>de</strong> segurança por órgãos públicos <strong>de</strong> natureza constitucional, quando se trata da<br />

<strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> sua competência, violada por ato <strong>de</strong> outro órgão. Em consequência, para exemplificar, “a Assembleia Legislativa<br />

Estadual, a par <strong>de</strong> ser órgão com autonomia financeira expressa no orçamento do Estado, goza, legalmente, <strong>de</strong> in<strong>de</strong>pendência<br />

organizacional. É titular <strong>de</strong> direitos subjetivos, o que lhe confere a chamada ‘personalida<strong>de</strong> judiciária’, que a autoriza a<br />

<strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r os seus interesses em juízo. Tem, pois, capacida<strong>de</strong> processual.” 37 Em outra hipótese, já se admitiu mandado <strong>de</strong><br />

segurança impetrado por Câmara Municipal contra o Prefeito para o fim <strong>de</strong> obrigá-lo à <strong>de</strong>vida prestação <strong>de</strong> contas ao Legislativo,<br />

tendo sido concedida a segurança. 38<br />

Repita-se, porém, que essa excepcional personalida<strong>de</strong> judiciária só é aceita em relação aos órgãos mais eleva<strong>dos</strong> do Po<strong>de</strong>r<br />

Público, <strong>de</strong> envergadura constitucional, quando <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m suas prerrogativas e competências. Por outro lado, esse tipo <strong>de</strong> conflito

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