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_Manual de Direito Administrativo_(2017)_Jose dos Santos Carvalho Filho

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ser ajuizada ação em face do Estado. Semelhante pensamento, portanto, é antagônico ao sistema <strong>de</strong> garantias outorgado pela<br />

Constituição.<br />

Sendo assim, tanto po<strong>de</strong> o lesado propor a ação contra a pessoa jurídica, como contra o agente estatal responsável pelo fato<br />

danoso, embora seja forçoso reconhecer que a Fazenda Pública sempre po<strong>de</strong>rá oferecer maior segurança ao lesado para o<br />

recebimento <strong>de</strong> sua in<strong>de</strong>nização; por outro lado, a responsabilida<strong>de</strong> do agente livra o lesado da conhecida <strong>de</strong>mora do pagamento<br />

em virtu<strong>de</strong> do sistema <strong>de</strong> precatórios judiciais. 99 Além <strong>de</strong>ssas hipóteses, ainda po<strong>de</strong> o autor, no caso <strong>de</strong> culpa ou dolo, mover a<br />

ação contra ambos em litisconsórcio facultativo, já que são eles liga<strong>dos</strong> por responsabilida<strong>de</strong> solidária. 100<br />

O STF, entretanto, já <strong>de</strong>cidiu que, em se tratando <strong>de</strong> dano causado por magistrado no exercício da função jurisdicional, a<br />

ação in<strong>de</strong>nizatória <strong>de</strong>ve ser ajuizada somente em face da respectiva pessoa <strong>de</strong> direito público, e não diretamente em face do<br />

magistrado, e isso porque este se caracteriza como agente político do Estado, não se po<strong>de</strong>ndo, na hipótese, vislumbrar<br />

responsabilida<strong>de</strong> concorrente, mas apenas a que eventualmente venha a <strong>de</strong>correr do exercício do direito <strong>de</strong> regresso. 101 A <strong>de</strong>speito<br />

<strong>de</strong> ter havido divergências entre os órgãos das várias instâncias judiciais no assunto, parece-nos acertada a solução alvitrada,<br />

tendo em vista, realmente, a especificida<strong>de</strong> da natureza da ativida<strong>de</strong> jurisdicional. Tratando-se, no entanto, <strong>de</strong> ato meramente<br />

administrativo, enten<strong>de</strong>mos que a ação po<strong>de</strong> ser en<strong>de</strong>reçada diretamente ao juiz, tal como ocorre com os <strong>de</strong>mais agentes<br />

administrativos.<br />

5.<br />

DENUNCIAÇÃO À LIDE<br />

Outro ponto tormentoso no tocante à ação in<strong>de</strong>nizatória diz respeito ao tema da <strong>de</strong>nunciação à li<strong>de</strong>. A questão consiste em<br />

saber se a pessoa jurídica responsável, ré no processo, <strong>de</strong>ve ou po<strong>de</strong> <strong>de</strong>nunciar à li<strong>de</strong> o servidor que provocou o dano.<br />

Ao tratar do tema, o CPC/1973 estabelecia ser obrigatória a <strong>de</strong>nunciação à li<strong>de</strong>, inclusive àquele que estivesse obrigado, por<br />

lei ou contrato, a in<strong>de</strong>nizar, em ação regressiva, o prejuízo do que per<strong>de</strong>u a <strong>de</strong>manda. 102 Em razão do texto legal, alguns<br />

estudiosos inclinavam-se pela compulsorieda<strong>de</strong> da <strong>de</strong>nunciação. 103<br />

Outros, contudo, davam interpretação diversa, para consi<strong>de</strong>rar facultativo, e não obrigatório, o litisconsórcio, e isso porque, a<br />

<strong>de</strong>speito do texto legal, a hipótese ensejaria facultativida<strong>de</strong> da <strong>de</strong>nunciação. 104 Resulta daí que, se a parte não requeresse a<br />

<strong>de</strong>nunciação à li<strong>de</strong>, po<strong>de</strong>ria mesmo assim <strong>de</strong>mandá-lo em ação autônoma no exercício <strong>de</strong> seu direito <strong>de</strong> regresso. Essa<br />

interpretação passou a ser mais condizente com o Código <strong>de</strong> Processo Civil, em cujo art. 125 se lê que é admissível (e não mais<br />

obrigatória, como no CPC anterior) a <strong>de</strong>nunciação à li<strong>de</strong> àquele que estiver obrigado a in<strong>de</strong>nizar o prejuízo do vencido, em ação<br />

regressiva (inciso II).<br />

No que concerne especificamente à ação in<strong>de</strong>nizatória contra o Estado, a divergência persiste mesmo diante do art. 125, II,<br />

do vigente CPC. Na visão <strong>de</strong> muitos especialistas, não é cabível a <strong>de</strong>nunciação. O primeiro fundamento consiste em que tais<br />

disposições do CPC concernem ao regime <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil no campo privado, mas não à responsabilida<strong>de</strong> civil do<br />

Estado, que tem previsão própria na Constituição (art. 37, § 6º). A relação entre o lesado e o Estado escora-se na responsabilida<strong>de</strong><br />

objetiva, ao passo que o vínculo regressivo entre o Estado e seu agente funda-se na responsabilida<strong>de</strong> subjetiva. São, portanto,<br />

diversos os elementos da causa <strong>de</strong> pedir relativamente às pretensões do lesado (originária) e do Estado (regressiva). Acresce,<br />

ainda, um fundamento <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m lógica: a ser admitida a <strong>de</strong>nunciação do servidor à li<strong>de</strong>, po<strong>de</strong>ria haver gravame ao lesado, já que,<br />

em muitos casos, teria ele que aguardar o <strong>de</strong>sfecho (costumeiramente <strong>de</strong>morado) do litígio entre o Estado e seu servidor, baseado<br />

na culpa civil, quando a Constituição o beneficiou com pretensão que, em razão da responsabilida<strong>de</strong> objetiva, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da<br />

discussão <strong>de</strong>sse elemento subjetivo. 105 Essa é, a nosso ver, a melhor doutrina a respeito do assunto.<br />

Anote-se, ainda, que essa parece ter sido a posição adotada pela Lei n o 8.112/1990 – o Estatuto <strong>dos</strong> servidores públicos<br />

fe<strong>de</strong>rais –, segundo a qual, ocorrendo dano causado a terceiros, o servidor <strong>de</strong>verá respon<strong>de</strong>r perante a Fazenda Pública em ação<br />

regressiva (art. 122, § 2 o ). Conquanto não seja o dispositivo <strong>de</strong> extrema clareza, é <strong>de</strong> supor-se que consi<strong>de</strong>rou tal ação como<br />

autônoma, diversa, portanto, daquela em que o lesado tenha <strong>de</strong>mandado a Fazenda.<br />

Aliás, o intuito <strong>de</strong> proteção ao hipossuficiente em relações jurídicas <strong>de</strong> caráter in<strong>de</strong>nizatório foi o mesmo adotado pelo<br />

Código <strong>de</strong> Defesa do Consumidor, que, na relação <strong>de</strong> regresso, exige processo in<strong>de</strong>nizatório autônomo, vedando expressamente a<br />

<strong>de</strong>nunciação à li<strong>de</strong>. Nas hipóteses em que o comerciante é solidariamente responsável com o fabricante, construtor, produtor ou<br />

importador, o consumidor po<strong>de</strong> <strong>de</strong>mandar qualquer <strong>de</strong>les e, para não ser prejudicado, a lei impõe que aquele que pagar a<br />

in<strong>de</strong>nização <strong>de</strong>ve exercer seu direito <strong>de</strong> regresso contra o outro responsável em ação diversa da ajuizada originariamente pelo<br />

consumidor. 106<br />

Deve registrar-se, porém, que, embora controvertida a matéria, nota-se visível tendência a acolher a tese da facultativida<strong>de</strong><br />

da <strong>de</strong>nunciação à li<strong>de</strong>, o que mais se consolida diante da expressão contida no art. 125 do CPC vigente (É admissível...), <strong>de</strong> modo<br />

que se permita a propositura <strong>de</strong> ação regressiva autônoma, após transitada em julgado a ação in<strong>de</strong>nizatória originária. 107<br />

Entretanto, se tal tendência é aceitável no campo das relações privadas, maior dificulda<strong>de</strong> há para admiti-la no campo da

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