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_Manual de Direito Administrativo_(2017)_Jose dos Santos Carvalho Filho

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financeiro externo da Administração Pública, como emana do art. 71 da atual Constituição. Cuida-se <strong>de</strong> órgão <strong>de</strong> inegável<br />

relevância no regime republicano e, sem embargo <strong>de</strong> críticas que tem sofrido (algumas <strong>de</strong>las merecidas), tem uma relativa<br />

autonomia no sistema, <strong>de</strong>sfrutando, inclusive, <strong>de</strong> quadro próprio (art. 73, CF), Ministros (e Conselheiros) com as prerrogativas da<br />

Magistratura (art. 73, § 3 o ) e lei própria <strong>de</strong> auto-organização. 211<br />

Várias são as atribuições do Tribunal <strong>de</strong> Contas no que toca ao controle financeiro da Administração.<br />

De início, é o órgão que aprecia as contas do Presi<strong>de</strong>nte da República e elabora parecer prévio a ser analisado pelo<br />

Congresso (art. 71, I, CF). Nesse caso, a competência é tão somente para apreciar as contas, ou seja, opinar, e não para julgá-las.<br />

Idêntico critério é aplicável a prefeitos, em que o Tribunal <strong>de</strong> Contas aprecia as contas, mas a Câmara Municipal é que as<br />

julga. 212 A competência para julgar cinge-se às contas <strong>dos</strong> <strong>de</strong>mais administradores. 213 Cabe-lhe também proce<strong>de</strong>r a auditorias em<br />

todas as unida<strong>de</strong>s administrativas <strong>dos</strong> Po<strong>de</strong>res Executivo, Judiciário e Legislativo, bem como nas pessoas da Administração<br />

Indireta do Estado (art. 71, IV). Veda-se-lhe, contudo, exercer controle sobre entida<strong>de</strong>s administrativas vinculadas a ente<br />

fe<strong>de</strong>rativo diverso: tal atuação refoge à competência constitucional. 214<br />

Por outro lado, fiscaliza as contas nacionais das empresas supranacionais <strong>de</strong> que participe a União (art. 71, V); fiscaliza a<br />

aplicação <strong>de</strong> recursos repassa<strong>dos</strong> pela União, concluindo sobre aspectos <strong>de</strong> legalida<strong>de</strong>, legitimida<strong>de</strong> e economicida<strong>de</strong> da<br />

aplicação (art. 71, VI), atribuição que, segundo alguns estudiosos, permite, em certas situações, o controle <strong>de</strong> políticas públicas –<br />

conclusão que, em nosso enten<strong>de</strong>r, <strong>de</strong>ve ser aferida com extrema cautela, para evitar excesso <strong>de</strong> competência; 215 aprecia; aprecia,<br />

para fins <strong>de</strong> registro, a legalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> atos <strong>de</strong> admissão <strong>de</strong> pessoal e as concessões <strong>de</strong> aposentadoria (art. 71, III); aplica sanções<br />

aos responsáveis por conduta ilícita no processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>spesas públicas e fixa prazo para que órgãos e entida<strong>de</strong>s adotem as<br />

providências exigidas para o cumprimento da lei (art. 71, VIII e IX); e susta, no caso <strong>de</strong> não atendimento, a execução <strong>de</strong> ato<br />

impugnado, comunicando o fato à Câmara e ao Senado (art. 71, X).<br />

O inciso II do art. 71 atribui ao Tribunal <strong>de</strong> Contas competência para julgar as contas <strong>dos</strong> administradores e <strong>de</strong>mais<br />

responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da Administração Direta ou Indireta, bem como as contas daqueles que<br />

provocarem a perda, o extravio ou outra irregularida<strong>de</strong>, causando prejuízo ao erário. O termo julgar no texto constitucional não<br />

tem o sentido normalmente atribuído aos juízes no exercício <strong>de</strong> sua função jurisdicional. O sentido do termo é o <strong>de</strong> apreciar,<br />

examinar, analisar as contas, porque a função exercida pelo Tribunal <strong>de</strong> Contas na hipótese é <strong>de</strong> caráter eminentemente<br />

administrativo. 216 Por isso, esse exame se sujeita, como qualquer ato administrativo, a controle do Po<strong>de</strong>r Judiciário no caso <strong>de</strong><br />

contaminado <strong>de</strong> vício <strong>de</strong> legalida<strong>de</strong>, e não tem a <strong>de</strong>finitivida<strong>de</strong> que qualifica os atos jurisdicionais. Autorizada doutrina, aliás, já<br />

anotava: “As <strong>de</strong>cisões do Tribunal <strong>de</strong> Contas não são <strong>de</strong>cisões judiciárias, porque ele não julga. Não profere julgamento nem <strong>de</strong><br />

natureza cível, nem <strong>de</strong> natureza penal. As <strong>de</strong>cisões proferidas dizem respeito à regularida<strong>de</strong> intrínseca da conta, e não sobre a<br />

responsabilida<strong>de</strong> do exator ou pagador ou sobre a imputação <strong>de</strong>ssa responsabilida<strong>de</strong>. 217<br />

Por outro lado, reina certa dúvida a respeito do sentido da expressão dinheiros públicos contida no mesmo art. 71, II,<br />

havendo mesmo <strong>de</strong>cisões contraditórias no próprio STF. 218 É <strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rar-se, porém, como dinheiros públicos aqueles que<br />

integram o acervo das pessoas <strong>de</strong> direito público (entes fe<strong>de</strong>rativos, autarquias e fundações <strong>de</strong> direito público). Da mesma<br />

natureza <strong>de</strong>ve ser consi<strong>de</strong>rado o montante <strong>de</strong>rivado do pagamento <strong>de</strong> contribuições ou pagamentos compulsórios efetua<strong>dos</strong> por<br />

administra<strong>dos</strong>, ainda que os <strong>de</strong>stinatários sejam pessoas <strong>de</strong> direito privado, integrantes da Administração ou não. É o caso, para<br />

exemplificar, <strong>dos</strong> recursos oriun<strong>dos</strong> <strong>de</strong> contribuições parafiscais. Da mesma forma, as contribuições sindicais compulsórias, que<br />

têm natureza tributária. 219 Por fim, é dinheiro público aquele transferido por ente público a qualquer outra pessoa, <strong>de</strong> direito<br />

público ou privado, para emprego em finalida<strong>de</strong>s específicas. 220 Como exemplo, a alocação <strong>de</strong> recursos a ente privado para<br />

utilização em seus fins institucionais. To<strong>dos</strong> esses valores sujeitam-se à prestação <strong>de</strong> contas e à apreciação pelo Tribunal <strong>de</strong><br />

Contas. São, todavia, recursos priva<strong>dos</strong> aqueles <strong>de</strong>correntes <strong>de</strong> exploração <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> econômica (v. g., os lucros obti<strong>dos</strong> por<br />

bancos governamentais) ou da própria gestão <strong>de</strong> entida<strong>de</strong>s privadas (v. g., valores cobra<strong>dos</strong> pela prestação <strong>de</strong> serviços liga<strong>dos</strong> a<br />

seus fins institucionais). Tais valores integram o patrimônio privado da pessoa e são insuscetíveis <strong>de</strong> controle pelas Cortes <strong>de</strong><br />

Contas; a não ser assim, não teria o Constituinte aludido a dinheiros públicos.<br />

É mister acentuar, neste ponto, que as funções básicas <strong>dos</strong> Tribunais <strong>de</strong> Contas em geral são exatamente as que constam do<br />

art. 71 da CF, muito embora as normas sejam aplicáveis diretamente à Corte <strong>de</strong> Contas fe<strong>de</strong>ral. Significa dizer que, pelo<br />

princípio da simetria constitucional, os <strong>de</strong>mais Tribunais <strong>de</strong> Contas não po<strong>de</strong>m inserir, em sua competência, funções não<br />

mencionadas na Constituição Fe<strong>de</strong>ral. Referi<strong>dos</strong> Tribunais <strong>de</strong>vem adotar, como mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> competência, as funções constantes<br />

do art. 71 da CF. Esse entendimento, aliás, já foi expressamente abraçado pelo Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral, <strong>de</strong> forma irreparável, a<br />

nosso ver. 221<br />

Não obstante, a <strong>de</strong>speito <strong>de</strong> serem administrativos os seus atos, o Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral já reconheceu que o Tribunal<br />

<strong>de</strong> Contas, no exercício <strong>de</strong> suas atribuições, po<strong>de</strong> apreciar a constitucionalida<strong>de</strong> das leis e <strong>dos</strong> atos do Po<strong>de</strong>r Público. 222 Não há<br />

novida<strong>de</strong> na afirmação, eis que a doutrina constitucionalista dominante já admite que os órgãos fundamentais da República

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