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_Manual de Direito Administrativo_(2017)_Jose dos Santos Carvalho Filho

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natureza.<br />

Diante do requisito constitucional, ficam, pois, excluídas as empresas públicas e as socieda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> economia mista que se<br />

<strong>de</strong>dicam à exploração <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> econômica, por força do art. 173, § 1 o , da CF, que impõe sejam elas regidas pelas normas<br />

aplicáveis às empresas privadas. Em consequência, estão elas sujeitas à responsabilida<strong>de</strong> subjetiva comum do <strong>Direito</strong> Civil.<br />

Enten<strong>de</strong>m alguns que a responsabilida<strong>de</strong> objetiva das pessoas privadas prestadoras <strong>de</strong> serviços públicos inci<strong>de</strong><br />

exclusivamente na hipótese em que o dano é perpetrado contra usuários, e isso porque são estes os titulares do direito à a<strong>de</strong>quada<br />

prestação do serviço; assim, não seria objetiva a responsabilida<strong>de</strong> perante terceiros. Ousamos dissentir <strong>de</strong> semelhante<br />

posicionamento. E por mais <strong>de</strong> uma razão. A uma, porque a Constituição não fez a menor distinção entre pessoas <strong>de</strong> direito<br />

público e pessoas <strong>de</strong> direito privado prestadoras <strong>de</strong> serviços públicos quanto à incidência da responsabilida<strong>de</strong> objetiva; se tal<br />

distinção não foi feita, não cabe ao intérprete fazê-la. A duas, porque haveria absoluta incongruência no que concerne à ratio do<br />

dispositivo. Com efeito, se tais pessoas privadas prestam serviço público, é claro que atuam como se fosse o próprio Estado, <strong>de</strong>ste<br />

tendo recebido a <strong>de</strong>vida <strong>de</strong>legação. Ora, se assim é, não caberia restringir-se sua responsabilida<strong>de</strong> civil objetiva apenas aos<br />

usuários, admitindo-se só para o Estado sua aplicação a to<strong>dos</strong>, inclusive terceiros. Isso <strong>de</strong>finitivamente não teria lógica. A<br />

responsabilida<strong>de</strong> objetiva prevista no art. 37, § 6 o , da CF, tem carga <strong>de</strong> incidência idêntica para o Estado e para as pessoas<br />

privadas prestadoras <strong>de</strong> serviços públicos: aplica-se a to<strong>dos</strong>, usuários e terceiros. 21 O STF adotou <strong>de</strong> início posição restritiva, mas,<br />

acertadamente, alterou-a expressamente para ampliar o manto da responsabilida<strong>de</strong> e suprimir a equivocada distinção. 22<br />

Há, ainda, dois pontos que, a nosso ver, merecem ser comenta<strong>dos</strong>. Primeiramente, é preciso i<strong>de</strong>ntificar com niti<strong>de</strong>z as<br />

pessoas privadas que se enquadram no art. 37, § 6 o , da Constituição. Devem elas prestar os serviços <strong>de</strong> forma <strong>de</strong>legada pelo Po<strong>de</strong>r<br />

Público, sendo necessário que haja um vínculo jurídico <strong>de</strong> direito público entre o Estado e seu <strong>de</strong>legatário. Desse modo, algumas<br />

pessoas privadas só aparentemente prestam serviços públicos, mas como o fazem sob regime <strong>de</strong> direito privado, sem qualquer elo<br />

jurídico típico com o Po<strong>de</strong>r Público, não estão inseridas na regra constitucional. 23 Estão fora do dispositivo também as pessoas<br />

privadas que exercem ativida<strong>de</strong>s comerciais e industriais, porque inexiste qualquer relação <strong>de</strong> direito público entre elas e o Po<strong>de</strong>r<br />

Público.<br />

De outro lado, enten<strong>de</strong>mos que as pessoas <strong>de</strong> cooperação governamental (ou serviços sociais autônomos) estão sujeitas à<br />

responsabilida<strong>de</strong> objetiva atribuída ao Estado. Sua ativida<strong>de</strong> é, como já tivemos a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ver, <strong>de</strong> caráter eminentemente<br />

social, po<strong>de</strong>ndo consi<strong>de</strong>rar-se que se qualifica como serviço público. Além do mais, têm vínculo com o Estado, porquanto foi este<br />

que fez editar as respectivas leis autorizadoras da criação das entida<strong>de</strong>s e as vinculou a seus objetivos institucionais, obrigando-as,<br />

inclusive, à prestação <strong>de</strong> contas em razão <strong>dos</strong> recursos que auferem, <strong>de</strong>correntes do recolhimento <strong>de</strong> contribuições<br />

compulsórias. 24<br />

Em relação às organizações sociais e às organizações da socieda<strong>de</strong> civil <strong>de</strong> interesse público, qualificação jurídica atribuída a<br />

entida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> direito privado que se associam ao Po<strong>de</strong>r Público em regime <strong>de</strong> parceria, po<strong>de</strong>rão surgir dúvidas sobre se estariam ou<br />

não sujeitas à responsabilida<strong>de</strong> objetiva. O motivo resi<strong>de</strong> na circunstância <strong>de</strong> que são elas vinculadas ao ente estatal por meio <strong>de</strong><br />

contratos <strong>de</strong> gestão ou termos <strong>de</strong> parceria, bem como pelo fato <strong>de</strong> que se propõem ao <strong>de</strong>sempenho <strong>de</strong> serviço público. Em que<br />

pese a existência <strong>de</strong>sses elementos <strong>de</strong> vinculação jurídica ao Estado, enten<strong>de</strong>mos que sua responsabilida<strong>de</strong> é subjetiva e,<br />

consequentemente, regulada pelo Código Civil. É que esses entes não têm fins lucrativos e sua função é a <strong>de</strong> auxílio ao Po<strong>de</strong>r<br />

Público para melhorar o resultado <strong>de</strong> certas ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> interesse do público e do próprio Estado.<br />

Assim, não se nos afigura que esse tipo <strong>de</strong> parceria <strong>de</strong>sinteressada e <strong>de</strong> cunho eminentemente social carregue o ônus da<br />

responsabilida<strong>de</strong> objetiva, quando, sem a parceria, estariam as referidas pessoas reconhecidamente sob a égi<strong>de</strong> do Código Civil.<br />

Nesse caso, se o dano proveio do <strong>de</strong>sempenho do serviço público, sem que tenha havido culpa na conduta, o correto será<br />

responsabilizar-se a pessoa fe<strong>de</strong>rativa que buscou a parceria, mas nunca a própria entida<strong>de</strong> parceira. Afinal, é o Estado que se<br />

sujeita ao risco administrativo. Convém ressaltar, no entanto, que, dissentindo <strong>de</strong> nosso pensamento, respeitável doutrina advoga<br />

a incidência do art. 37, § 6 o , da CF, sobre as organizações sociais, realçando-lhes o fato <strong>de</strong> prestarem serviço público para<br />

consi<strong>de</strong>rá-las sujeitas à responsabilida<strong>de</strong> objetiva. 25<br />

3.2.<br />

Agentes do Estado<br />

Dispõe o art. 37, § 6 o , da CF que o Estado é civilmente responsável pelos danos que seus agentes, nessa qualida<strong>de</strong>, venham a<br />

causar a terceiros. Como pessoa jurídica que é, o Estado não po<strong>de</strong> causar qualquer dano a ninguém. Sua atuação se consubstancia<br />

por seus agentes, pessoas físicas capazes <strong>de</strong> manifestar vonta<strong>de</strong> real. Todavia, como essa vonta<strong>de</strong> é imputada ao Estado, cabe a<br />

este a responsabilida<strong>de</strong> civil pelos danos causa<strong>dos</strong> por aqueles que o fazem presente no mundo jurídico.<br />

A expressão “nessa qualida<strong>de</strong>” tem razão <strong>de</strong> ser, porque só po<strong>de</strong> o Estado ser responsabilizado se o preposto estatal estiver<br />

no exercício <strong>de</strong> suas funções ou, ao menos, se esteja conduzindo a pretexto <strong>de</strong> exercê-la. Desse modo, se causar dano a terceiro no<br />

correr <strong>de</strong> sua vida privada, sua responsabilida<strong>de</strong> é pessoal e regida pelo <strong>Direito</strong> Civil. Justamente por esse motivo é que já se

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