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_Manual de Direito Administrativo_(2017)_Jose dos Santos Carvalho Filho

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Em relação à competência para proce<strong>de</strong>r à intervenção na proprieda<strong>de</strong>, cumpre <strong>de</strong> início distinguir a natureza da forma<br />

interventiva. A fonte para tal ativida<strong>de</strong> está na Constituição, que em diversos dispositivos traça a partilha <strong>de</strong> competências entre<br />

as pessoas fe<strong>de</strong>rativas. Portanto, é a Constituição que se <strong>de</strong>ve verificar em primeiro lugar.<br />

A competência para legislar sobre direito <strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong>, <strong>de</strong>sapropriação e requisição é da União Fe<strong>de</strong>ral (art. 22, I, II e III,<br />

CF).<br />

Diferente da competência para legislar sobre essas matérias é a competência para legislar sobre as restrições e os<br />

condicionamentos ao uso da proprieda<strong>de</strong>. Essa competência se reparte entre a União, os Esta<strong>dos</strong>, o Distrito Fe<strong>de</strong>ral e os<br />

Municípios, tudo em conformida<strong>de</strong> com o sistema <strong>de</strong> divisão <strong>de</strong> atribuições estabelecido na Constituição. 8<br />

Uma lei que disponha sobre casos <strong>de</strong> requisição da proprieda<strong>de</strong> privada, por exemplo, tem que ser fe<strong>de</strong>ral (art. 22, III, CF).<br />

Mas uma lei que estabeleça casos <strong>de</strong> restrição ao uso da proprieda<strong>de</strong> para a proteção do meio ambiente po<strong>de</strong> ser fe<strong>de</strong>ral, estadual,<br />

distrital ou municipal (art. 24, VI, e art. 30, I e II, da CF).<br />

Além da competência legislativa, as pessoas políticas dispõem <strong>de</strong> competência administrativa, que é aquela que se<br />

consubstancia através da prática <strong>de</strong> atos administrativos. O primeiro ponto a consi<strong>de</strong>rar é o <strong>de</strong> que toda a ativida<strong>de</strong> administrativa<br />

há <strong>de</strong> ter suporte na lei, porque assim o impõe o princípio da legalida<strong>de</strong>. Sendo assim, a competência administrativa estará<br />

condicionada à competência para legislar sobre a matéria. Se o Município, para exemplificar, tem competência para legislar sobre<br />

restrições à ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> construção (que implica modo interventivo na proprieda<strong>de</strong>), terá, ipso facto, competência para praticar os<br />

atos administrativos necessários à execução da lei que editou.<br />

Demais disso, é oportuno <strong>de</strong>stacar que esses atos administrativos estampam, como regra, o exercício do po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> polícia da<br />

Administração, ou seja, o Po<strong>de</strong>r Público, seguindo os parâmetros legais, concretiza as restrições autorizadas na lei e fiscaliza o<br />

seu cumprimento. O Estado, por exemplo, tem competência para legislar sobre segurança pública, e, em <strong>de</strong>corrência <strong>de</strong>ssa<br />

atribuição, cabe-lhe a prática <strong>de</strong> atos <strong>de</strong> polícia que possibilitam o cumprimento da lei estadual. Compete, pois, às autorida<strong>de</strong>s<br />

estaduais interditar temporariamente o uso <strong>de</strong> certa proprieda<strong>de</strong> com vistas à preservação da segurança coletiva.<br />

IV.<br />

Fundamentos<br />

1.<br />

SUPREMACIA DO INTERESSE PÚBLICO<br />

No direito mo<strong>de</strong>rno, a supremacia do interesse público sobre o privado se configura como verda<strong>de</strong>iro postulado<br />

fundamental, pois que confere ao próprio indivíduo condições <strong>de</strong> segurança e <strong>de</strong> sobrevivência. A estabilida<strong>de</strong> da or<strong>de</strong>m social<br />

<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong>ssa posição privilegiada do Estado e <strong>de</strong>la <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m a or<strong>de</strong>m e a tranquilida<strong>de</strong> das pessoas. 9<br />

No caso da intervenção na proprieda<strong>de</strong>, o Estado age <strong>de</strong> forma vertical, ou seja, cria imposições que <strong>de</strong> alguma forma<br />

restringem o uso da proprieda<strong>de</strong> pelo seu dominus. E o faz exatamente em função da supremacia que ostenta, relativamente aos<br />

interesses priva<strong>dos</strong>. Quando o particular sofre a imposição interventiva do Estado em sua proprieda<strong>de</strong>, sua reação natural é a <strong>de</strong><br />

insatisfação, e isso porque seu interesse foi contrariado. Mas toda intervenção visa ao atendimento <strong>de</strong> uma situação <strong>de</strong> interesse<br />

público e, sendo assim, há <strong>de</strong> justificar-se a atuação estatal, mesmo contrária ao interesse do particular.<br />

Po<strong>de</strong>-se, assim, extrair <strong>de</strong>sse fundamento que, toda vez que coli<strong>de</strong> um interesse público com um interesse privado, é aquele<br />

que tem que prevalecer. É a supremacia do interesse público sobre o privado, como princípio, que retrata um <strong>dos</strong> fundamentos da<br />

intervenção estatal na proprieda<strong>de</strong>.<br />

2.<br />

FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE<br />

Conforme assinala DROMI, a concepção individualista da proprieda<strong>de</strong> já foi há muito abandonada, porque predomina<br />

atualmente a visão <strong>de</strong> que o instituto, muito mais que um fim, se configura como meio para alcançar o bem-estar social. 10<br />

Essa visão, que leva em conta os relevantes interesses da coletivida<strong>de</strong>, é que levou o Constituinte a condicionar a<br />

proprieda<strong>de</strong> ao atendimento da função social (art. 5 o , XXIII). Ao fazê-lo, veio a possibilitar que o Estado interviesse na<br />

proprieda<strong>de</strong> sempre que esta não estivesse amoldada ao pressuposto exigido na Constituição. Sobre o interesse do indivíduo,<br />

repetimos, há <strong>de</strong> prelevar o interesse público. A<strong>de</strong>mais, a Constituição inseriu a função social da proprieda<strong>de</strong> como um <strong>dos</strong><br />

princípios que regem a or<strong>de</strong>m econômica (art. 170, III). No dispositivo, o Constituinte mais uma vez reconhece a proprieda<strong>de</strong><br />

como fator econômico, mas a condiciona ao atendimento da função social, tornando este elemento superior àquele.<br />

O pressuposto constitucional, contudo, não afasta nem suprime o direito em si. Ao contrário, o sistema vigente procura<br />

conciliar os interesses individuais e sociais e somente quando há o conflito é que o Estado dá primazia a estes últimos. A função<br />

social preten<strong>de</strong> erradicar algumas <strong>de</strong>formida<strong>de</strong>s existentes na socieda<strong>de</strong>, nas quais o interesse egoístico do indivíduo põe em risco<br />

os interesses coletivos. Na verda<strong>de</strong>, a função social visa a recolocar a proprieda<strong>de</strong> na sua trilha normal. 11

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