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_Manual de Direito Administrativo_(2017)_Jose dos Santos Carvalho Filho

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ocorre porque foi consi<strong>de</strong>rada cada uma <strong>de</strong>las per se como suscetível <strong>de</strong> proteção histórica ou cultural. A abrangência do ato,<br />

nesse caso, atinge várias edificações tão somente pela circunstância <strong>de</strong> serem elas contíguas ao momento em que se criou a<br />

proteção. Mas, por suposição, se um <strong>dos</strong> imóveis <strong>de</strong>ntro do agrupamento não mais tiver a peculiarida<strong>de</strong> histórica que reveste os<br />

<strong>de</strong>mais (em virtu<strong>de</strong>, por exemplo, <strong>de</strong> <strong>de</strong>molição da construção anterior e <strong>de</strong> nova construção ocorridas antes do momento em que<br />

se diligencia a proteção), tal imóvel não po<strong>de</strong>rá ser tombado, porquanto lhe faltará o pressuposto que gerou a proteção <strong>dos</strong> <strong>de</strong>mais<br />

e seu consequente tombamento.<br />

7.<br />

INSTITUIÇÃO<br />

Todo tombamento <strong>de</strong>riva <strong>de</strong> manifestação expressa da vonta<strong>de</strong> do Po<strong>de</strong>r Público. E <strong>de</strong>riva porque é a este que incumbem a<br />

proteção do patrimônio cultural brasileiro e a intervenção na proprieda<strong>de</strong> privada para o fim <strong>de</strong> garantir a prevalência do interesse<br />

público.<br />

A questão que se põe, contudo, é a <strong>de</strong> saber qual o tipo <strong>de</strong> ato pelo qual o Po<strong>de</strong>r Público <strong>de</strong>creta o tombamento. Parte da<br />

doutrina tem o entendimento <strong>de</strong> que a instituição tanto po<strong>de</strong> ser fixada por ato administrativo como por lei. Por essa corrente <strong>de</strong><br />

pensamento, tanto é competência do Executivo como do Legislativo a instituição interventiva. 83<br />

Essa, porém, não parece ser a melhor doutrina, apesar <strong>dos</strong> ilustres juristas que a <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m. O tombamento é ato tipicamente<br />

administrativo, através do qual o Po<strong>de</strong>r Público, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> concluir formalmente no sentido <strong>de</strong> que o bem integra o patrimônio<br />

público nacional, intervém na proprieda<strong>de</strong> para protegê-lo <strong>de</strong> mutilações e <strong>de</strong>struições. Trata-se <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> administrativa, e não<br />

legislativa. Além do mais, o tombamento só é <strong>de</strong>finido após processo administrativo no qual, frequentemente, há conflito <strong>de</strong><br />

interesses entre o Estado e o particular. Resulta daí que o ato <strong>de</strong> tombamento é passível <strong>de</strong> exame quanto à legalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> seus<br />

vários elementos, como o motivo, a finalida<strong>de</strong>, a forma etc. Ora, a lei que <strong>de</strong>creta um tombamento não pressupõe qualquer<br />

procedimento prévio, <strong>de</strong> modo que fica trancada para o proprietário qualquer possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> controle <strong>de</strong>sse ato, o que seria<br />

absurdo mesmo diante da circunstância <strong>de</strong> ser a lei, nesse caso, qualificada como lei <strong>de</strong> efeitos concretos, ou seja, a lei que,<br />

embora tenha a forma <strong>de</strong> lei, representa materialmente um mero ato administrativo.<br />

Ao Legislativo compete, isto sim, estabelecer regras gerais para que o administrador intervenha na proprieda<strong>de</strong> privada para<br />

fins <strong>de</strong> proteção do bem por traduzir interesse histórico ou artístico. Nesse aspecto, aliás, a Constituição estabelece competência<br />

concorrente da União, <strong>dos</strong> Esta<strong>dos</strong> e do Distrito Fe<strong>de</strong>ral para legislar sobre a proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico,<br />

turístico e paisagístico (art. 24, VII, CF). Não se exclui, nesse caso, a competência também do Município, pois que o art. 30, IX,<br />

da CF lhe dá competência para “promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação<br />

fiscalizadora fe<strong>de</strong>ral e estadual”. Essa competência, entretanto, é fixada para o fim da edição <strong>de</strong> regras gerais, abstratas e<br />

impessoais sobre a intervenção na proprieda<strong>de</strong> para a proteção <strong>de</strong>sse patrimônio. Bem diversa, porém, é a competência para<br />

concluir que a hipótese é realmente a <strong>de</strong> tombamento, competência típica do Executivo.<br />

Desse modo, parece-nos que a instituição do tombamento <strong>de</strong>ve ser formalizada por ato administrativo típico praticado pelo<br />

Po<strong>de</strong>r Executivo. 84 O STF já teve a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> enfrentar o tema, tendo a maioria votado no sentido <strong>de</strong> que o tombamento é<br />

da competência do Executivo e, por isso, há <strong>de</strong> ser materializado por ato administrativo. 85 Por exceção, é possível que o intuito<br />

protetivo se origine da própria Constituição, e em tal situação o tombamento será instituído pela própria norma constitucional. 86<br />

A competência para legislar sobre tombamento é concorrente <strong>de</strong> todas as pessoas fe<strong>de</strong>rativas. Apesar da omissão <strong>dos</strong><br />

Municípios no art. 24, da CF, o inciso VII <strong>de</strong>sse dispositivo, que alu<strong>de</strong> à competência para legislar sobre patrimônio histórico e<br />

cultural, <strong>de</strong>ve ser interpretado em conjugação com o art. 30, I e II, da CF, <strong>de</strong> modo a consi<strong>de</strong>rar-se válida a legislação municipal.<br />

Nesse sentido, <strong>de</strong>cidiu o TJ-MG. 87<br />

Quanto aos bens públicos, enten<strong>de</strong>mos que, por interpretação analógica ao art. 2 o , § 2 o , do Decreto-lei n o 3.365/1941, que<br />

regula as <strong>de</strong>sapropriações, a União po<strong>de</strong> tombar bens estaduais, distritais e municipais, e os Esta<strong>dos</strong> po<strong>de</strong>m fazê-lo em relação aos<br />

bens do Município. Entretanto, em observância também à natureza <strong>dos</strong> interesses tutela<strong>dos</strong> pelos entes fe<strong>de</strong>rativos das diversas<br />

esferas, parece-nos não possam as entida<strong>de</strong>s menores instituir, manu militari, tombamento sobre bens pertencentes aos entes<br />

maiores, isto é, o Município não po<strong>de</strong> fazê-lo sobre bens estaduais e fe<strong>de</strong>rais, nem os Esta<strong>dos</strong> sobre bens da União. Nestes casos,<br />

a entida<strong>de</strong> menor interessada <strong>de</strong>ve obter autorização do ente público maior a quem pertencer o bem a ser tombado; só assim nos<br />

parece compatível a interpretação do art. 23, III, da CF, que confere a todas as pessoas fe<strong>de</strong>rativas competência comum para<br />

proteger bens <strong>de</strong> valor histórico, artístico e cultural. 88<br />

O art. 5 o do Decreto-lei n o 25/1937 não regulou a hipótese acima. Limitou-se a enunciar que o tombamento <strong>dos</strong> bens<br />

pertencentes à União, aos Esta<strong>dos</strong> e aos Municípios se processa <strong>de</strong> ofício por or<strong>de</strong>m do serviço <strong>de</strong> patrimônio histórico fe<strong>de</strong>ral,<br />

<strong>de</strong>vendo, contudo, notificar-se o ente fe<strong>de</strong>rativo para que o ato produza seus regulares efeitos. Portanto, trata apenas da hipótese<br />

em que a instituição do tombamento é oriunda da União. Ainda assim, porém, para que se harmonize o dispositivo com os<br />

preceitos da vigente Constituição relaciona<strong>dos</strong> à autonomia <strong>dos</strong> entes fe<strong>de</strong>rativos, <strong>de</strong>ve exigir-se que a notificação renda ensejo a

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