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_Manual de Direito Administrativo_(2017)_Jose dos Santos Carvalho Filho

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Diante disso, passou-se a consi<strong>de</strong>rar que, por ser mais po<strong>de</strong>roso, o Estado teria que arcar com um risco natural <strong>de</strong>corrente <strong>de</strong><br />

suas numerosas ativida<strong>de</strong>s: à maior quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> po<strong>de</strong>res haveria <strong>de</strong> correspon<strong>de</strong>r um risco maior. Surge, então, a teoria do risco<br />

administrativo, como fundamento da responsabilida<strong>de</strong> objetiva do Estado.<br />

Tem havido alguma controvérsia sobre as noções do risco administrativo e do <strong>de</strong>nominado risco integral. No risco<br />

administrativo, não há responsabilida<strong>de</strong> civil genérica e indiscriminada: se houver participação total ou parcial do lesado para o<br />

dano, o Estado não será responsável no primeiro caso e, no segundo, terá atenuação no que concerne a sua obrigação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar.<br />

Por conseguinte, a responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>de</strong>corrente do risco administrativo encontra limites. 13 Já no risco integral a<br />

responsabilida<strong>de</strong> sequer <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> do nexo causal e ocorre até mesmo quando a culpa é da própria vítima. Assim, por exemplo, o<br />

Estado teria que in<strong>de</strong>nizar o indivíduo que se atirou <strong>de</strong>liberadamente à frente <strong>de</strong> uma viatura pública. É evi<strong>de</strong>nte que semelhante<br />

fundamento não po<strong>de</strong> ser aplicado à responsabilida<strong>de</strong> do Estado, 14 só sendo admissível em situações raríssimas e excepcionais. 15<br />

Em tempos atuais, tem-se <strong>de</strong>senvolvido a teoria do risco social, segundo a qual o foco da responsabilida<strong>de</strong> civil é a vítima, e<br />

não o autor do dano, <strong>de</strong> modo que a reparação estaria a cargo <strong>de</strong> toda a coletivida<strong>de</strong>, dando ensejo ao que se <strong>de</strong>nomina <strong>de</strong><br />

socialização <strong>dos</strong> riscos – sempre com o intuito <strong>de</strong> que o lesado não <strong>de</strong>ixe <strong>de</strong> merecer a justa reparação pelo dano sofrido. 16 A<br />

referida teoria, no fundo, constitui mero aspecto específico da teoria do risco integral, sendo que para alguns autores é para on<strong>de</strong><br />

se encaminha a responsabilida<strong>de</strong> civil do Estado: seria este responsável mesmo se os danos não lhe forem imputáveis. 17 Em nosso<br />

enten<strong>de</strong>r, porém, tal caráter genérico da responsabilida<strong>de</strong> po<strong>de</strong>ria provocar gran<strong>de</strong> insegurança jurídica e graves agressões ao<br />

erário, prejudicando em última análise os próprios contribuintes.<br />

Além do risco <strong>de</strong>corrente das ativida<strong>de</strong>s estatais em geral, constituiu também fundamento da responsabilida<strong>de</strong> objetiva do<br />

Estado o princípio da repartição <strong>dos</strong> encargos. O Estado, ao ser con<strong>de</strong>nado a reparar os prejuízos do lesado, não seria o sujeito<br />

pagador direto; os valores in<strong>de</strong>nizatórios seriam resultantes da contribuição feita por cada um <strong>dos</strong> <strong>de</strong>mais integrantes da<br />

socieda<strong>de</strong>, a qual, em última análise, é a beneficiária <strong>dos</strong> po<strong>de</strong>res e das prerrogativas estatais.<br />

Verifica-se, portanto, que os postula<strong>dos</strong> que geraram a responsabilida<strong>de</strong> objetiva do Estado buscaram seus fundamentos na<br />

justiça social, atenuando as dificulda<strong>de</strong>s e impedimentos que o indivíduo teria que suportar quando prejudicado por condutas <strong>de</strong><br />

agentes estatais.<br />

III.<br />

<strong>Direito</strong> Brasileiro<br />

1.<br />

O CÓDIGO CIVIL<br />

Era o Código Civil que regulava anteriormente a responsabilida<strong>de</strong> do Estado. O art. 15 da antiga lei civil tinha os seguintes<br />

termos: “As pessoas jurídicas <strong>de</strong> direito público são civilmente responsáveis por atos <strong>de</strong> seus representantes que nessa qualida<strong>de</strong><br />

causem danos a terceiros, proce<strong>de</strong>ndo <strong>de</strong> modo contrário ao direito ou faltando a <strong>de</strong>ver prescrito por lei, salvo o direito<br />

regressivo contra os causadores do dano.”<br />

O texto provocou alguma dissidência entre os intérpretes. Alguns entendiam que a norma consagrava a teoria da<br />

responsabilida<strong>de</strong> subjetiva, sendo necessária a averiguação da culpa na conduta do agente estatal, ao passo que outros<br />

vislumbravam já o prenúncio da responsabilida<strong>de</strong> objetiva do Estado.<br />

Em nosso enten<strong>de</strong>r, a norma exigia a prova da culpa. Os pressupostos aí consigna<strong>dos</strong> – o procedimento contrário ao direito e<br />

a falta a <strong>de</strong>ver prescrito por lei – revelavam que a responsabilida<strong>de</strong> estatal não se configuraria diante <strong>de</strong> fatos lícitos, mas, ao<br />

contrário, só diante <strong>de</strong> atos culposos. Se alguém agisse contrariamente ao direito ou faltasse a <strong>de</strong>ver legal, sua conduta seria<br />

necessariamente culposa. 18<br />

O Código Civil em vigor, entretanto, alterou o art. 15 e dispôs no art. 43: “As pessoas jurídicas <strong>de</strong> direito público interno<br />

são civilmente responsáveis por atos <strong>dos</strong> seus agentes que nessa qualida<strong>de</strong> causem danos a terceiros, ressalvado direito<br />

regressivo contra os causadores do dano, se houver, por parte <strong>de</strong>stes, culpa ou dolo.” Diante <strong>dos</strong> novos termos, impõe-se<br />

reconhecer que o Código, na parte que constitui o núcleo básico da norma, passou a disciplinar o tema em consonância com a<br />

vigente Constituição, como veremos adiante.<br />

2.<br />

CONSTITUIÇÃO FEDERAL<br />

A Constituição Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> 1946 passou a dar diferente redação para regular a matéria. Nos termos do art. 194, ficou<br />

assentado que “as pessoas jurídicas <strong>de</strong> direito público interno são civilmente responsáveis pelos danos que seus funcionários,<br />

nessa qualida<strong>de</strong>, causem a terceiros”.<br />

Se comparado esse texto com o do art. 15 do Código Civil revogado, não será difícil observar que foram retira<strong>dos</strong> da norma<br />

os pressupostos da conduta contrária ao direito e da inobservância <strong>de</strong> <strong>de</strong>ver legal, exatamente aqueles que <strong>de</strong>nunciavam a adoção

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