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_Manual de Direito Administrativo_(2017)_Jose dos Santos Carvalho Filho

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moralida<strong>de</strong> e da razoabilida<strong>de</strong>. 95<br />

2.<br />

PRINCÍPIOS RECONHECIDOS<br />

Além <strong>dos</strong> princípios expressos, a Administração Pública ainda se orienta por outras diretrizes que também se incluem em<br />

sua principiologia, e que por isso são da mesma relevância que aqueles. Doutrina e jurisprudência usualmente a elas se referem, o<br />

que revela a sua aceitação geral como regras <strong>de</strong> proce<strong>de</strong>r da Administração. É por esse motivo que os <strong>de</strong>nominamos <strong>de</strong> princípios<br />

reconheci<strong>dos</strong>, para acentuar exatamente essa aceitação. Vejamos tais princípios.<br />

2.1.<br />

Princípio da Supremacia do Interesse Público<br />

As ativida<strong>de</strong>s administrativas são <strong>de</strong>senvolvidas pelo Estado para benefício da coletivida<strong>de</strong>. Mesmo quando age em vista <strong>de</strong><br />

algum interesse estatal imediato, o fim último <strong>de</strong> sua atuação <strong>de</strong>ve ser voltado para o interesse público. E se, como visto, não<br />

estiver presente esse objetivo, a atuação estará inquinada <strong>de</strong> <strong>de</strong>svio <strong>de</strong> finalida<strong>de</strong>.<br />

Desse modo, não é o indivíduo em si o <strong>de</strong>stinatário da ativida<strong>de</strong> administrativa, mas sim o grupo social num todo. Saindo da<br />

era do individualismo exacerbado, o Estado passou a caracterizar-se como o Welfare State (Estado/bem-estar), <strong>de</strong>dicado a aten<strong>de</strong>r<br />

ao interesse público. Logicamente, as relações sociais vão ensejar, em <strong>de</strong>termina<strong>dos</strong> momentos, um conflito entre o interesse<br />

público e o interesse privado, mas, ocorrendo esse conflito, há <strong>de</strong> prevalecer o interesse público.<br />

Trata-se, <strong>de</strong> fato, do primado do interesse público. O indivíduo tem que ser visto como integrante da socieda<strong>de</strong>, não po<strong>de</strong>ndo<br />

os seus direitos, em regra, ser equipara<strong>dos</strong> aos direitos sociais. Vemos a aplicação do princípio da supremacia do interesse<br />

público, por exemplo, na <strong>de</strong>sapropriação, em que o interesse público suplanta o do proprietário; ou no po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> polícia do Estado,<br />

por força do qual se estabelecem algumas restrições às ativida<strong>de</strong>s individuais.<br />

A <strong>de</strong>speito <strong>de</strong> não ser um conceito exato, aspecto que leva a doutrina em geral a configurá-lo como conceito jurídico<br />

in<strong>de</strong>terminado, a verda<strong>de</strong> é que, <strong>de</strong>ntro da análise específica das situações administrativas, é possível ao intérprete, à luz <strong>de</strong> to<strong>dos</strong><br />

os elementos do fato, i<strong>de</strong>ntificar o que é e o que não é interesse público. Ou seja: é possível encontrar as balizas do que seja<br />

interesse público <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> suas zonas <strong>de</strong> certeza negativa e <strong>de</strong> certeza positiva. Portanto, cuida-se <strong>de</strong> conceito <strong>de</strong>terminável. 96<br />

Algumas vozes se têm levantado atualmente contra a existência do princípio em foco, argumentando-se no sentido da<br />

primazia <strong>de</strong> interesses priva<strong>dos</strong> com suporte em direitos fundamentais quando ocorrem <strong>de</strong>terminadas situações específicas. 97 Não<br />

lhes assiste razão, no entanto, nessa visão pretensamente mo<strong>de</strong>rnista. Se é evi<strong>de</strong>nte que o sistema jurídico assegura aos<br />

particulares garantias contra o Estado em certos tipos <strong>de</strong> relação jurídica, é mais evi<strong>de</strong>nte ainda que, como regra, <strong>de</strong>va respeitarse<br />

o interesse coletivo quando em confronto com o interesse particular. A existência <strong>de</strong> direitos fundamentais não exclui a<br />

<strong>de</strong>nsida<strong>de</strong> do princípio. Este é, na verda<strong>de</strong>, o corolário natural do regime <strong>de</strong>mocrático, calcado, como por to<strong>dos</strong> sabido, na<br />

prepon<strong>de</strong>rância das maiorias. 98 A “<strong>de</strong>sconstrução” do princípio espelha uma visão distorcida e coloca em risco a própria<br />

<strong>de</strong>mocracia; o princípio, isto sim, suscita “reconstrução”, vale dizer, adaptação à dinâmica social, como já se afirmou com<br />

absoluto acerto. 99<br />

Com a vênia aos que perfilham visão oposta, reafirmamos nossa convicção <strong>de</strong> que, malgrado todo o esforço em contrário, a<br />

prevalência do interesse público é indissociável do direito público, este, como ensina SAYAGUÉS LASO, o regulador da<br />

harmonia entre o Estado e o indivíduo. 100 Sobre o tema, já firmamos a seguinte consi<strong>de</strong>ração: “Elidir o princípio se revela<br />

inviável, eis que se cuida <strong>de</strong> axioma inarredável em todo tipo <strong>de</strong> relação entre corporação e indivíduo. A solução, <strong>de</strong>starte, está<br />

em ajustá-lo para que os interesses se harmonizem e os confrontos sejam evita<strong>dos</strong> ou supera<strong>dos</strong>.” 101<br />

2.2. Princípio da Autotutela<br />

A Administração Pública comete equívocos no exercício <strong>de</strong> sua ativida<strong>de</strong>, o que não é nem um pouco estranhável em vista<br />

das múltiplas tarefas a seu cargo. Defrontando-se com esses erros, no entanto, po<strong>de</strong> ela mesma revê-los para restaurar a situação<br />

<strong>de</strong> regularida<strong>de</strong>. Não se trata apenas <strong>de</strong> uma faculda<strong>de</strong>, mas também <strong>de</strong> um <strong>de</strong>ver, pois que não se po<strong>de</strong> admitir que, diante <strong>de</strong><br />

situações irregulares, permaneça inerte e <strong>de</strong>sinteressada. Na verda<strong>de</strong>, só restaurando a situação <strong>de</strong> regularida<strong>de</strong> é que a<br />

Administração observa o princípio da legalida<strong>de</strong>, do qual a autotutela é um <strong>dos</strong> mais importantes corolários.<br />

Não precisa, portanto, a Administração ser provocada para o fim <strong>de</strong> rever seus atos. Po<strong>de</strong> fazê-lo <strong>de</strong> ofício. Aliás, não lhe<br />

compete apenas sanar as irregularida<strong>de</strong>s; é necessário que também as previna, evitando-se reflexos prejudiciais aos administra<strong>dos</strong><br />

ou ao próprio Estado. 102<br />

Registre-se, ainda, que a autotutela envolve dois aspectos quanto à atuação administrativa:<br />

1.<br />

aspectos <strong>de</strong> legalida<strong>de</strong>, em relação aos quais a Administração, <strong>de</strong> ofício, proce<strong>de</strong> à revisão <strong>de</strong> atos ilegais; e

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