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_Manual de Direito Administrativo_(2017)_Jose dos Santos Carvalho Filho

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inesperada da disciplina vigente; (2º) a imprevisibilida<strong>de</strong> das modificações. Em tais hipóteses, cabe à Administração adotar<br />

algumas soluções para mitigar os efeitos das mudanças: uma <strong>de</strong>las é a exclusão do administrado do novo regime jurídico; outra, o<br />

anúncio <strong>de</strong> medidas transitórias ou <strong>de</strong> um período <strong>de</strong> vacatio; outra, ainda, o direito do administrado a uma in<strong>de</strong>nização<br />

compensatória pela quebra da confiança <strong>de</strong>corrente <strong>de</strong> alterações em atos normativos que acreditava sóli<strong>dos</strong> e permanentes. É<br />

claro que a matéria ainda está em fase <strong>de</strong> estu<strong>dos</strong> e <strong>de</strong>senvolvimento, mas, inegavelmente, constitui uma forma <strong>de</strong> proteger a<br />

confiança e as expectativas legítimas na estabilida<strong>de</strong> normativa, <strong>de</strong>sejável em qualquer sistema jurídico. 116<br />

O <strong>de</strong>senvolvimento do princípio em tela <strong>de</strong>nota que a confiança traduz um <strong>dos</strong> fatores mais relevantes <strong>de</strong> um regime<br />

<strong>de</strong>mocrático, não se po<strong>de</strong>ndo per<strong>de</strong>r <strong>de</strong> vista que é ela que dá sustentação à entrega <strong>dos</strong> po<strong>de</strong>res aos representantes eleitos, como<br />

já registrou autorizada doutrina. 117 Em nosso enten<strong>de</strong>r, porém, não se po<strong>de</strong> levá-lo ao extremo para o fim <strong>de</strong> salvaguardar meras<br />

expectativas fáticas ou jurídicas, como já ocorre em outros sistemas; semelhante direção elidiria o próprio <strong>de</strong>senvolvimento do<br />

Estado e <strong>de</strong> seus projetos em prol da coletivida<strong>de</strong>. O que se preten<strong>de</strong> é que o cidadão não seja surpreendido ou agravado pela<br />

mudança inesperada <strong>de</strong> comportamento da Administração, sem o mínimo respeito às situações formadas e consolidadas no<br />

passado, ainda que não se tenham convertido em direitos adquiri<strong>dos</strong>.<br />

2.6. Princípio da Precaução<br />

Em virtu<strong>de</strong> da mo<strong>de</strong>rna tendência entre os estudiosos <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolver-se a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que é necessário evitar a catástrofe antes<br />

que ela ocorra, parece-nos oportuno tecer breve comentário sobre o princípio da precaução, 118 que, embora não expresso, tem<br />

sido reconhecido como inspirador das condutas administrativas.<br />

Esse postulado teve origem no âmbito do direito ambiental, efetivamente foro próprio para seu estudo e aprofundamento.<br />

Significa que, em caso <strong>de</strong> risco <strong>de</strong> danos graves e <strong>de</strong>gradação ambientais, medidas preventivas <strong>de</strong>vem ser adotadas <strong>de</strong> imediato,<br />

ainda que não haja certeza científica absoluta, fator este que não po<strong>de</strong> justificar eventual procrastinação das providências<br />

protetivas. 119 Autorizada doutrina, a propósito, já <strong>de</strong>ixou consignado que, existindo dúvida sobre a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> dano, “a<br />

solução <strong>de</strong>ve ser favorável ao ambiente e não ao lucro imediato”. 120<br />

Atualmente, o axioma tem sido invocado também para a tutela do interesse público, em or<strong>de</strong>m a consi<strong>de</strong>rar que, se<br />

<strong>de</strong>terminada ação acarreta risco para a coletivida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>ve a Administração adotar postura <strong>de</strong> precaução para evitar que eventuais<br />

danos acabem por concretizar-se. Semelhante cautela é <strong>de</strong> todo conveniente na medida em que se sabe que alguns tipos <strong>de</strong> dano,<br />

por sua gravida<strong>de</strong> e extensão, são irreversíveis ou, no mínimo, <strong>de</strong> dificílima reparação.<br />

Nesses casos, inci<strong>de</strong> a inversão do ônus da prova, exigindo-se que o interessado comprove que seu projeto não traz riscos<br />

para a coletivida<strong>de</strong>, cabendo à Administração, em cada caso, aferir a existência, ou não, <strong>de</strong> reais condições <strong>de</strong> segurança para o<br />

interesse público.<br />

Embora ainda em fase <strong>de</strong> evolução, o princípio da precaução merece total agasalho na socieda<strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rna em face <strong>de</strong> certas<br />

ações que se têm revelado <strong>de</strong>vastadoras para os indivíduos. Aqui a prevenção <strong>de</strong>ve sobrepujar a correção.<br />

3.<br />

O PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE<br />

Alguns autores mo<strong>de</strong>rnos têm procurado alinhar também, entre os princípios da Administração Pública, o <strong>de</strong>nominado<br />

“princípio da razoabilida<strong>de</strong>”. 121<br />

Em nosso enten<strong>de</strong>r, porém, é necessário examinar com precisão o sentido <strong>de</strong>sse princípio, sob pena <strong>de</strong> se chegar a<br />

conclusões dissonantes <strong>dos</strong> postula<strong>dos</strong> <strong>de</strong> direito público.<br />

Razoabilida<strong>de</strong> é a qualida<strong>de</strong> do que é razoável, ou seja, aquilo que se situa <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> limites aceitáveis, ainda que os juízos<br />

<strong>de</strong> valor que provocaram a conduta possam dispor-se <strong>de</strong> forma um pouco diversa. Ora, o que é totalmente razoável para uns po<strong>de</strong><br />

não o ser para outros. Mas, mesmo quando não o seja, é <strong>de</strong> reconhecer-se que a valoração se situou <strong>de</strong>ntro <strong>dos</strong> standards <strong>de</strong><br />

aceitabilida<strong>de</strong>. Dentro <strong>de</strong>sse quadro, não po<strong>de</strong> o juiz controlar a conduta do administrador sob a mera alegação <strong>de</strong> que não a<br />

enten<strong>de</strong>u razoável. Não lhe é lícito substituir o juízo <strong>de</strong> valor do administrador pelo seu próprio, porque a isso se coloca o óbice<br />

da separação <strong>de</strong> funções, que rege as ativida<strong>de</strong>s estatais. Po<strong>de</strong>rá, isto sim, e até mesmo <strong>de</strong>verá, controlar os aspectos relativos à<br />

legalida<strong>de</strong> da conduta, ou seja, verificar se estão presentes os requisitos que a lei exige para a valida<strong>de</strong> <strong>dos</strong> atos administrativos.<br />

Esse é o sentido que os Tribunais têm emprestado ao controle.<br />

Desse modo, quando alguns estudiosos indicam que “a razoabilida<strong>de</strong> vai se atrelar à congruência lógica entre as situações<br />

postas e as <strong>de</strong>cisões administrativas”, 122 parece-nos que a falta da referida congruência viola, na verda<strong>de</strong>, o princípio da<br />

legalida<strong>de</strong>, porque, no caso, ou há vício nas razões impulsionadoras da vonta<strong>de</strong>, ou o vício estará no objeto <strong>de</strong>sta. A falta <strong>de</strong><br />

razoabilida<strong>de</strong>, na hipótese, é puro reflexo da inobservância <strong>de</strong> requisitos exigi<strong>dos</strong> para a valida<strong>de</strong> da conduta. Por outro lado,<br />

quando a falta <strong>de</strong> razoabilida<strong>de</strong> se calca em situação na qual o administrador tenha em mira algum interesse particular, violado<br />

estará sendo o princípio da moralida<strong>de</strong>, ou o da impessoalida<strong>de</strong>, como tivemos a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> examinar.

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