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_Manual de Direito Administrativo_(2017)_Jose dos Santos Carvalho Filho

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Com esses elementos, <strong>de</strong>sejamos frisar que o princípio da razoabilida<strong>de</strong> tem que ser observado pela Administração à medida<br />

que sua conduta se apresente <strong>de</strong>ntro <strong>dos</strong> padrões normais <strong>de</strong> aceitabilida<strong>de</strong>. Se atuar fora <strong>de</strong>sses padrões, algum vício estará, sem<br />

dúvida, contaminando o comportamento estatal. Significa dizer, por fim, que não po<strong>de</strong> existir violação ao referido princípio<br />

quando a conduta administrativa é inteiramente revestida <strong>de</strong> licitu<strong>de</strong>.<br />

Acertada, pois, a noção <strong>de</strong> que o princípio da razoabilida<strong>de</strong> se fundamenta nos princípios da legalida<strong>de</strong> e da finalida<strong>de</strong>,<br />

como realça CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, não se po<strong>de</strong>ndo supor que a correção judicial possa invadir o mérito<br />

administrativo, que reflete o juízo <strong>de</strong> valoração em que se baseia o administrador para <strong>de</strong>finir sua conduta, invasão que, diga-se<br />

<strong>de</strong> passagem, tem sido reiteradamente repudiada pelo Judiciário em virtu<strong>de</strong> do princípio da separação <strong>de</strong> Po<strong>de</strong>res, consignado no<br />

art. 2º da Lei Maior. Conclui o eminente administrativista que “tal não ocorre porque a sobredita liberda<strong>de</strong> é liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong>ntro da<br />

lei, vale dizer, segundo as possibilida<strong>de</strong>s nela comportadas”, aditando que “uma providência <strong>de</strong>sarrazoada, consoante dito, não<br />

po<strong>de</strong> ser havida como comportada pela lei. Logo, é ilegal; é <strong>de</strong>sbordante <strong>dos</strong> limites nela admiti<strong>dos</strong>”. 123<br />

Assim, na esteira da doutrina mais autorizada e rechaçando algumas interpretações evi<strong>de</strong>ntemente radicais, exacerbadas e<br />

dissonantes do sistema constitucional vigente, é preciso lembrar que, quando se preten<strong>de</strong>r imputar à conduta administrativa a<br />

condição <strong>de</strong> ofensiva ao princípio da razoabilida<strong>de</strong>, terá que estar presente a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que a ação é efetiva e indiscutivelmente<br />

ilegal. Inexiste, por conseguinte, conduta legal vulneradora do citado princípio: ou a ação vulnera o princípio e é ilegal, ou, se<br />

não o ofen<strong>de</strong>, há <strong>de</strong> ser qualificada como legal e inserida <strong>de</strong>ntro das funções normais cometidas ao administrador público.<br />

Dissentimos, por conseguinte, <strong>de</strong> doutrina que advoga a eliminação do po<strong>de</strong>r discricionário da Administração diante da<br />

aplicação do princípio da razoabilida<strong>de</strong>. Se é verda<strong>de</strong> que este abranda o excesso <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r administrativo, não é menos<br />

verda<strong>de</strong>iro que o administrador continua <strong>de</strong>tendo o po<strong>de</strong>r jurídico <strong>de</strong> valorar condutas e <strong>de</strong>cisões, pois que essa é a sua atribuição.<br />

Não concordamos, pois, com as posições segundo as quais ao Judiciário seria conferida a função <strong>de</strong> praticamente substituir o<br />

juízo <strong>de</strong> valoração levado a cabo pelo administrador. Trata-se <strong>de</strong> radicalismo que mais complica que elucida a aplicação do<br />

direito. 124<br />

Não custa lembrar, por outro lado, que o princípio da razoabilida<strong>de</strong> não inci<strong>de</strong> apenas sobre a função administrativa, mas, ao<br />

contrário, inci<strong>de</strong> sobre qualquer função pública, inclusive a função legislativa. Por isso mesmo, o STF, por mais <strong>de</strong> uma vez, já<br />

<strong>de</strong>clarou a inconstitucionalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> lei por violação ao princípio, tanto <strong>de</strong> lei fe<strong>de</strong>ral, 125 quanto <strong>de</strong> lei estadual, 126 o que <strong>de</strong>nota<br />

que esse tipo <strong>de</strong> ofensa afeta realmente o plano <strong>de</strong> valida<strong>de</strong> <strong>dos</strong> atos.<br />

4.<br />

O PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE<br />

O princípio da proporcionalida<strong>de</strong>, que está ainda em evolução e tem sido acatado em alguns or<strong>de</strong>namentos jurídicos, guarda<br />

alguns pontos que o assemelham ao princípio da razoabilida<strong>de</strong> e entre eles avulta o <strong>de</strong> que é objetivo <strong>de</strong> ambos a outorga ao<br />

Judiciário do po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> exercer controle sobre os atos <strong>dos</strong> <strong>de</strong>mais Po<strong>de</strong>res. Enquanto o princípio da razoabilida<strong>de</strong> tem sua origem<br />

e <strong>de</strong>senvolvimento na elaboração jurispru<strong>de</strong>ncial anglo-saxônica, o da proporcionalida<strong>de</strong> é oriundo da Suíça e da Alemanha,<br />

tendo-se estendido posteriormente ao <strong>Direito</strong> da Áustria, Holanda, Bélgica e outros países europeus. 127<br />

O gran<strong>de</strong> fundamento do princípio da proporcionalida<strong>de</strong> é o excesso <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r, e o fim a que se <strong>de</strong>stina é exatamente o <strong>de</strong><br />

conter atos, <strong>de</strong>cisões e condutas <strong>de</strong> agentes públicos que ultrapassem os limites a<strong>de</strong>qua<strong>dos</strong>, com vistas ao objetivo colimado pela<br />

Administração, ou até mesmo pelos Po<strong>de</strong>res representativos do Estado. Significa que o Po<strong>de</strong>r Público, quando intervém nas<br />

ativida<strong>de</strong>s sob seu controle, <strong>de</strong>ve atuar porque a situação reclama realmente a intervenção, e esta <strong>de</strong>ve processar-se com<br />

equilíbrio, sem excessos e proporcionalmente ao fim a ser atingido.<br />

Segundo a doutrina alemã, para que a conduta estatal observe o princípio da proporcionalida<strong>de</strong>, há <strong>de</strong> revestir-se <strong>de</strong> tríplice<br />

fundamento: (1) a<strong>de</strong>quação, significando que o meio empregado na atuação <strong>de</strong>ve ser compatível com o fim colimado; (2)<br />

exigibilida<strong>de</strong>, porque a conduta <strong>de</strong>ve ter-se por necessária, não havendo outro meio menos gravoso ou oneroso para alcançar o<br />

fim público, ou seja, o meio escolhido é o que causa o menor prejuízo possível para os indivíduos; (3) proporcionalida<strong>de</strong> em<br />

sentido estrito, quando as vantagens a serem conquistadas superarem as <strong>de</strong>svantagens. 128<br />

O princípio, que grassou no <strong>Direito</strong> Constitucional, hoje inci<strong>de</strong> também no <strong>Direito</strong> <strong>Administrativo</strong> como forma <strong>de</strong> controle<br />

da Administração Pública. É necessário, contudo, advertir que, embora o aludido princípio possa servir como instrumento <strong>de</strong><br />

controle da ativida<strong>de</strong> administrativa, sua aplicação leva em conta, repita-se, o excesso <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r. Não po<strong>de</strong>, porém, interferir no<br />

critério discricionário <strong>de</strong> escolha do administrador público, quando este tiver à sua disposição mais <strong>de</strong> uma forma lícita <strong>de</strong> atuar,<br />

oportunida<strong>de</strong> em que estará exercendo legitimamente seu po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> administração pública. Em consequência, sua aplicação exige<br />

equilíbrio e comedimento por parte do julgador, que <strong>de</strong>verá consi<strong>de</strong>rar com acuida<strong>de</strong> to<strong>dos</strong> os elementos da hipótese sob<br />

apreciação; se não o fizer, ele mesmo será o agente violador do princípio que preten<strong>de</strong> aplicar.<br />

Examinada, conquanto em síntese, a fisionomia <strong>dos</strong> princípios da razoabilida<strong>de</strong> e da proporcionalida<strong>de</strong>, chega-se à<br />

conclusão <strong>de</strong> que ambos constituem instrumentos <strong>de</strong> controle <strong>dos</strong> atos estatais abusivos, seja qual for a sua natureza. No processo

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