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_Manual de Direito Administrativo_(2017)_Jose dos Santos Carvalho Filho

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7.3. <strong>Direito</strong>s Pessoais e Reais<br />

É claro que a expressão todo e qualquer direito prevista na lei haveria <strong>de</strong> ensejar controvérsias em razão <strong>de</strong> sua<br />

generalida<strong>de</strong>. O entendimento que veio a prevalecer, porém, é o <strong>de</strong> que a prescrição quinquenal abrange apenas as ações<br />

protetivas <strong>de</strong> direitos pessoais, e não também os direitos reais.<br />

Em relação às pretensões protetivas <strong>de</strong> direitos reais contra a Fazenda Pública, aplica-se atualmente a regra geral prevista no<br />

art. 205 do Código Civil, segundo a qual “a prescrição ocorre em 10 anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor”. 264<br />

Note-se, porém, que é preciso distinguir. O referido prazo <strong>de</strong> <strong>de</strong>z anos é aplicável na hipótese em que o particular <strong>de</strong>seja<br />

proteger seu direito real contra o Estado, inclusive o <strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong>. Não se trata, <strong>de</strong>sse modo, da pretensão <strong>de</strong> adquirir por<br />

usucapião proprieda<strong>de</strong> móvel ou imóvel pertencente às pessoas públicas – pretensão essa que também é forma <strong>de</strong> prescrição,<br />

embora <strong>de</strong> natureza aquisitiva (arts. 1.238 ss e 1.260, Código Civil). Semelhante pretensão é juridicamente impossível, uma vez<br />

que os bens públicos são insuscetíveis <strong>de</strong> serem adquiri<strong>dos</strong> por usucapião (art. 102, Código Civil).<br />

Sob a égi<strong>de</strong> do Código Civil revogado, travou-se discussão a respeito do assunto, tendo dominado o entendimento <strong>de</strong> que,<br />

em relação a direitos reais, aplicava-se a regra do art. 177 daquele diploma: prescrição em 10 anos entre presentes e 15 entre<br />

ausentes. Fundava-se o pensamento em que, a ser aplicado o prazo quinquenal previsto no Decreto n o 20.910/1932 também para<br />

os direitos reais, estar-se-ia, por via oblíqua, permitindo que o Estado tivesse a seu favor o usucapião <strong>de</strong> bens imóveis <strong>de</strong><br />

particulares em cinco anos, alterando <strong>de</strong>ssa maneira o regime da proprieda<strong>de</strong>, fato que não teria sido alvitrado pelo legislador. 265<br />

Pensamos, contudo, que se cuida <strong>de</strong> enfoque diverso. Aqui a pretensão tem como titular o Estado, sendo exercida em face<br />

do particular, e consiste na aquisição da proprieda<strong>de</strong> por usucapião, o que se afigura plenamente viável (embora incomum) sob o<br />

aspecto jurídico. Se essa for a pretensão, <strong>de</strong>verão aplicar-se as regras comuns <strong>de</strong> usucapião <strong>de</strong> bens imóveis previstas no Código<br />

Civil, variando o prazo conforme a situação fática que renda ensejo ao usucapião (arts. 1.238 a 1.244). 266 Coisa diversa, todavia,<br />

é a pretensão do particular em face do Estado para a tutela <strong>de</strong> direitos reais; nessa hipótese, aplica-se, como dissemos, a regra<br />

geral da prescrição prevista no art. 205, do Código Civil: prazo <strong>de</strong> <strong>de</strong>z anos, salvo disposição legal contrária. 267<br />

No que concerne aos direitos pessoais, a prescrição <strong>de</strong> pretensões <strong>de</strong> particulares em face da Fazenda Pública, como vimos,<br />

ocorre em cinco anos (prescrição quinquenal), <strong>de</strong> acordo com a disciplina do Decreto n o 20.910/1932. Desse modo, se um<br />

administrado preten<strong>de</strong> ver reconhecido direito pessoal seu em face da Fazenda, <strong>de</strong>ve provi<strong>de</strong>nciar a propositura da respectiva<br />

ação no prazo <strong>de</strong> cinco anos, conta<strong>dos</strong> da ocorrência da lesão jurídica. No que tange à pretensão para reparação civil contra a<br />

Fazenda, reiteramos que a prescrição se consuma no prazo geral <strong>de</strong> três anos, aplicando-se nessa matéria o disposto no art. 206, §<br />

3 o , V, do vigente Código Civil, já que o sistema não admite prazo <strong>de</strong> prescrição privilegiado para particulares, quando tal prazo<br />

sempre favoreceu a Fazenda. 268<br />

Se o titular do direito pessoal, contudo, for a própria Fazenda, em face do administrado, a prescrição se regulará<br />

naturalmente pela lei geral, no caso o Código Civil – particularmente o citado art. 205, que fixa o prazo genérico <strong>de</strong> <strong>de</strong>z anos<br />

(quando não houver prazo diverso específico expresso na lei). Em consequência, discordamos, com a vênia <strong>de</strong>vida, daqueles que,<br />

em nome do princípio da isonomia, advogam a mesma prescrição quinquenal quando é titular da pretensão a Fazenda em face do<br />

administrado. 269 Em nosso enten<strong>de</strong>r, a única aplicação do referido princípio é para o fim <strong>de</strong> serem consi<strong>de</strong>radas situações<br />

<strong>de</strong>siguais e, portanto, sujeitas a tratamento diverso. O Decreto n o 20.910/1932 visou especificamente a regular a prescrição <strong>de</strong><br />

pretensões <strong>de</strong> administra<strong>dos</strong> em face da Fazenda, dispensando à matéria foros <strong>de</strong> direito público. Como nada foi regulado em<br />

relação à prescrição <strong>de</strong> pretensões da Fazenda em face <strong>de</strong> administra<strong>dos</strong>, é <strong>de</strong> aplicar-se a lei geral, no caso o Código Civil. Po<strong>de</strong><br />

ocorrer que, <strong>de</strong> lege ferenda, os prazos venham a igualar-se, mas enquanto não houver lei específica em tal direção, aplicáveis<br />

serão as normas da lei civil. 270<br />

Neste tópico, avulta relembrar, ainda, que, por exceção, são imprescritíveis as ações <strong>de</strong> ressarcimento a serem movidas pela<br />

Fazenda contra agentes públicos, servidores ou não, no caso <strong>de</strong> ilícitos que causem prejuízo ao erário, como registra o art. 37, §<br />

5 o , da CF. Significa, por via <strong>de</strong> consequência, que, se um servidor causa prejuízo ao Estado, ao praticar ato ilícito, o ente público<br />

não terá limite <strong>de</strong> prazo para ajuizar a ação in<strong>de</strong>nizatória, po<strong>de</strong>ndo fazê-lo a qualquer tempo. A hipótese, assim, não é alcançada<br />

pela prescrição. 271<br />

Da mesma forma, há também imprescritibilida<strong>de</strong> no caso <strong>de</strong> atos inexistentes, assim consi<strong>de</strong>ra<strong>dos</strong> aqueles <strong>de</strong>spi<strong>dos</strong> <strong>de</strong><br />

elemento essencial para sua qualificação como ato administrativo. Embora existentes materialmente, não existem sob o ângulo<br />

jurídico. Por isso, são trata<strong>dos</strong>, em parte, como atos nulos. Seu <strong>de</strong>sfazimento, porém, se origina <strong>de</strong> ação <strong>de</strong>claratória, que é<br />

insuscetível <strong>de</strong> prescrição.<br />

Entretanto, cumpre que se analise com cuidado o vício. Caracteriza-se como inexistente o ato, por exemplo, praticado por<br />

sujeito não integrante da Administração; ou aquele que resulte <strong>de</strong> mero processo psíquico, ou seja, <strong>de</strong>stituído do elemento forma.<br />

Autorizada doutrina também consi<strong>de</strong>ra inexistentes os atos <strong>de</strong> natureza criminosa, como o que <strong>de</strong>termina a prática <strong>de</strong> tortura ou

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