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_Manual de Direito Administrativo_(2017)_Jose dos Santos Carvalho Filho

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2.<br />

ATOS DA ADMINISTRAÇÃO<br />

A expressão atos da Administração traduz sentido amplo e indica todo e qualquer ato que se origine <strong>dos</strong> inúmeros órgãos<br />

que compõem o sistema administrativo em qualquer <strong>dos</strong> Po<strong>de</strong>res. O emprego da expressão não leva em conta a natureza <strong>de</strong>ste ou<br />

daquele ato. Significa apenas que a Administração Pública se exprime, na maioria das vezes, por meio <strong>de</strong> atos, <strong>de</strong> forma que, ao<br />

fazê-lo, pratica o que se <strong>de</strong>nomina <strong>de</strong> atos da Administração. O critério i<strong>de</strong>ntificativo, portanto, resi<strong>de</strong> na origem da<br />

manifestação <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong>. Uma vez praticado o ato, aí sim, caberá ao intérprete i<strong>de</strong>ntificá-lo na categoria a<strong>de</strong>quada.<br />

Na verda<strong>de</strong>, entre os atos da Administração se enquadram atos que não se caracterizam propriamente como atos<br />

administrativos, como é o caso <strong>dos</strong> atos priva<strong>dos</strong> da Administração. Exemplo: os contratos regi<strong>dos</strong> pelo direito privado, como a<br />

compra e venda, a locação etc. No mesmo plano estão os atos materiais, que correspon<strong>de</strong>m aos fatos administrativos, noção vista<br />

acima: são eles atos da Administração, mas não configuram atos administrativos típicos.<br />

Alguns autores alu<strong>de</strong>m também aos atos políticos ou <strong>de</strong> governo. 5 Não concordamos, porém, com tal referência, vez que<br />

enten<strong>de</strong>mos que tais atos estão fora das linhas <strong>dos</strong> atos da Administração. Estes emanam sempre da lei; são diretamente<br />

subjacentes a esta. Aqueles alcançam maior liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> ação, e resultam <strong>de</strong> normas constitucionais. O caráter governamental<br />

sobreleva ao administrativo.<br />

Por outro lado, como se verá adiante, há atos administrativos produzi<strong>dos</strong> por agentes <strong>de</strong> entida<strong>de</strong>s que não integram a<br />

estrutura da Administração Pública, mas que nem por isso <strong>de</strong>ixam <strong>de</strong> qualificar-se como tais. 6 Já quando se fala em atos da<br />

Administração, tem que ser levada em consi<strong>de</strong>ração a circunstância <strong>de</strong> terem emanado <strong>de</strong>sta. 7<br />

3.<br />

ATOS JURÍDICOS E ATOS ADMINISTRATIVOS<br />

As noções <strong>de</strong> ato jurídico e <strong>de</strong> ato administrativo têm vários pontos comuns. No direito privado, o ato jurídico possui a<br />

característica primordial <strong>de</strong> ser um ato <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong>, com idoneida<strong>de</strong> <strong>de</strong> infundir <strong>de</strong>termina<strong>dos</strong> efeitos no mundo jurídico.<br />

“Adquirir, resguardar, transferir, modificar ou extinguir direitos, eis, em poucas palavras, em toda a sua extensão e<br />

profundida<strong>de</strong>, o vasto alcance <strong>dos</strong> atos jurídicos”, como bem registra WASHINGTON DE BARROS MONTEIRO. 8 Trata-se,<br />

pois, <strong>de</strong> instituto que revela a primazia da vonta<strong>de</strong>.<br />

Os elementos estruturais do ato jurídico – o sujeito, o objeto, a forma e a própria vonta<strong>de</strong> – garantem sua presença também<br />

no ato administrativo. Ocorre que neste o sujeito e o objeto têm qualificações especiais: o sujeito é sempre um agente investido<br />

<strong>de</strong> prerrogativas públicas, e o objeto há <strong>de</strong> estar preor<strong>de</strong>nado a <strong>de</strong>terminado fim <strong>de</strong> interesse público. Mas no fundo será ele um<br />

instrumento da vonta<strong>de</strong> para a produção <strong>dos</strong> mesmos efeitos do ato jurídico.<br />

Temos, assim, uma relação <strong>de</strong> gênero e espécie. Os atos jurídicos são o gênero do qual os atos administrativos são a espécie,<br />

o que <strong>de</strong>nota que em ambos são idênticos os elementos estruturais.<br />

O Código Civil vigente introduziu algumas alterações na disciplina relativa aos atos jurídicos. Uma <strong>de</strong>ssas alterações<br />

consiste no fato <strong>de</strong> não mais indicar-se o objeto da vonta<strong>de</strong>, ou seja, se a pessoa preten<strong>de</strong> adquirir, modificar ou extinguir direitos<br />

e obrigações, como figurava no art. 81 do antigo Código. De fato, o núcleo da noção do ato jurídico é a vonta<strong>de</strong> jurígena, aquela<br />

que objetiva a produção <strong>de</strong> efeitos no mundo jurídico, e não a especificida<strong>de</strong> perseguida pela vonta<strong>de</strong> em relação aos direitos e<br />

obrigações (aquisição, modificação, transferência, extinção).<br />

Outra inovação resi<strong>de</strong> na adoção, pelo vigente Código Civil, da doutrina alemã do negócio jurídico. 9 Segundo esse<br />

pensamento doutrinário, é preciso distinguir o ato jurídico e o negócio jurídico. A noção central do ato jurídico repousa na<br />

manifestação <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong> em conformida<strong>de</strong> com o or<strong>de</strong>namento jurídico, ao passo que a do negócio jurídico resi<strong>de</strong> na <strong>de</strong>claração<br />

<strong>de</strong> vonta<strong>de</strong> dirigida no sentido da obtenção <strong>de</strong> um resultado perseguido pelo emitente. O ato jurídico, portanto, é gênero do qual<br />

o negócio jurídico é espécie. Toda vonta<strong>de</strong> legítima preor<strong>de</strong>nada à produção <strong>de</strong> efeitos jurídicos constitui um ato jurídico, mas há<br />

várias manifestações volitivas produzidas ex lege, vale dizer, <strong>de</strong>clarações <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong> que visam a uma consequência jurídica,<br />

<strong>de</strong>sejada ou não pelo emitente. Outras, ao contrário, buscam finalida<strong>de</strong> jurídica própria, ou seja, uma consequência jurídica<br />

alvitrada pelo manifestante. Estas, e não as anteriores, é que propiciam a configuração <strong>de</strong> negócios jurídicos. 10<br />

O Código Civil revogado tratou conjuntamente o ato e o negócio jurídico, como constava do já citado art. 81. O novo<br />

Código, todavia, cuidou especificamente do negócio jurídico (arts. 104 a 184) para então estabelecer, em norma genérica, que<br />

aos atos jurídicos lícitos, não qualifica<strong>dos</strong> como negócios jurídicos, hão <strong>de</strong> aplicar-se, no que couber, as disposições pertinentes a<br />

estes últimos (art. 185).<br />

Na sistemática do Código, por conseguinte, <strong>de</strong>vem os atos administrativos (assim como os atos jurisdicionais e legislativos)<br />

enquadrar-se como atos jurídicos, porquanto a vonta<strong>de</strong> jurígena será emitida pelos agentes da Administração em conformida<strong>de</strong><br />

com a lei, mas não po<strong>de</strong>rão ser qualifica<strong>dos</strong> como negócios jurídicos, porque a emissão volitiva <strong>de</strong>corre diretamente da lei,<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> o agente <strong>de</strong>sejar, ou não, a finalida<strong>de</strong> a ser alcançada pelo ato.

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