02.08.2017 Views

_Manual de Direito Administrativo_(2017)_Jose dos Santos Carvalho Filho

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

(Chefia do Executivo, os Tribunais Judiciários, as Casas Legislativas e o Ministério Público) também po<strong>de</strong>m apreciar questões<br />

<strong>de</strong> inconstitucionalida<strong>de</strong>, visto que a eles compete, da mesma forma, a guarda da Constituição.<br />

Matéria que redundou em acirrada polêmica é a concernente ao art. 71, § 3 o , da CF, que dispõe: “As <strong>de</strong>cisões do Tribunal<br />

<strong>de</strong> que resulte imputação <strong>de</strong> débito ou multa terão eficácia <strong>de</strong> título executivo.” O preceito <strong>de</strong>nuncia, <strong>de</strong> forma clara, que a<br />

relação obrigacional <strong>de</strong>corrente da atribuição <strong>de</strong> débito ou aplicação <strong>de</strong> multa enseja a formalização por título executivo, <strong>de</strong><br />

natureza obviamente extrajudicial. Não indica, entretanto, a legitimida<strong>de</strong> para a ação que vise à respectiva cobrança. Embora haja<br />

alguns entendimentos e até mesmo dispositivos constitucionais <strong>de</strong> Esta<strong>dos</strong> que admitem que o Tribunal <strong>de</strong> Contas possa executar<br />

as suas próprias <strong>de</strong>cisões, o STF <strong>de</strong>cidiu em contrário, consi<strong>de</strong>rando inconstitucional dispositivo nesse sentido da Constituição<br />

do Estado <strong>de</strong> Sergipe, com fundamento no citado art. 71, § 3 o , que não permitiria tal amplitu<strong>de</strong>. 223 De fato, nada justifica a<br />

pretendida legitimatio, e por mais <strong>de</strong> uma razão. A uma, porque não se trata <strong>de</strong> pessoa jurídica, e sim <strong>de</strong> órgão público<br />

<strong>de</strong>spersonalizado, ao qual só é conferida capacida<strong>de</strong> processual em situações excepcionais. A duas, porque, integrando pessoa<br />

fe<strong>de</strong>rativa (União ou Estado), é a esta que cabe a competência para ajuizamento das ações que visem à cobrança <strong>de</strong> valores<br />

<strong>de</strong>vi<strong>dos</strong> ao Po<strong>de</strong>r Público, mesmo que os recursos cobra<strong>dos</strong> sejam aloca<strong>dos</strong> para <strong>de</strong>terminado órgão nos termos da lei. E mais: se<br />

a multa é aplicada a autorida<strong>de</strong> municipal, compete ao Município, e não ao Estado, promover a respectiva execução, já que se<br />

trata <strong>de</strong> crédito municipal. 224 Entretanto, o Ministério Público tem legitimida<strong>de</strong> extraordinária para promover a execução com<br />

base no aludido título, sabido que, entre suas funções institucionais, está a <strong>de</strong>fesa do patrimônio público genericamente<br />

consi<strong>de</strong>rado (art. 129, III, CF). 225<br />

Por fim, compete observar que os Tribunais <strong>de</strong> Contas, em algumas ocasiões, têm adotado posições que extrapolam os<br />

limites da função que a Constituição lhes outorgou. Não se questiona aqui que sua função é relevante para a regularida<strong>de</strong> da<br />

ativida<strong>de</strong> administrativa, mas daí não se po<strong>de</strong> permitir atuações que não estejam contempladas no sistema constitucional.<br />

Tem-se entendido, a propósito, ser vedado ao TC expedir normas gerais e abstratas no pretenso exercício do po<strong>de</strong>r<br />

regulamentar, privativo do Po<strong>de</strong>r Executivo. Mais: para sustar atos administrativos, é imperioso acatar o princípio do <strong>de</strong>vido<br />

processo legal, se envolver direitos <strong>de</strong> terceiros. Ainda: conquanto competente para apreciar concessão <strong>de</strong> aposentadoria, com as<br />

providências necessárias para sua conclusão, não lhe cabe impor ao administrador a modificação do ato sob pena <strong>de</strong> multa,<br />

<strong>de</strong>vendo eventual conflito ser dirimido no Judiciário. 226<br />

Outra ilegalida<strong>de</strong> praticada por Tribunal <strong>de</strong> Contas é a afronta à <strong>de</strong>cisão judicial. Se o Judiciário, como Po<strong>de</strong>r <strong>de</strong>finidor <strong>de</strong><br />

controvérsias, <strong>de</strong>fine posição e a reveste com o manto da res iudicata, nenhuma alternativa remanesce para a Corte <strong>de</strong> Contas:<br />

cabe-lhe apenas respeitá-la e cumpri-la. O TCU, por exemplo, <strong>de</strong>terminou a suspensão <strong>de</strong> pagamento <strong>de</strong> parcelas remuneratórias<br />

incluídas nos proventos <strong>de</strong> servidores públicos aposenta<strong>dos</strong> por força <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão judicial transitada em julgado. O STF,<br />

examinando a questão em mandado <strong>de</strong> segurança, <strong>de</strong>feriu o pedido, a nosso ver, com absoluto acerto, para anular a <strong>de</strong>cisão da<br />

Corte <strong>de</strong> Contas, fundando-se a <strong>de</strong>cisão no princípio da intangibilida<strong>de</strong> da coisa julgada. 227 Avulta notar que esse impedimento<br />

se opõe, inclusive, quando há outros fundamentos para a <strong>de</strong>cisão transitada em julgado, tudo em nome do princípio da segurança<br />

jurídica e da proteção à confiança. 228<br />

Dúvida já surgiu sobre a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o Tribunal <strong>de</strong> Contas or<strong>de</strong>nar a suspensão cautelar <strong>de</strong> processo licitatório. Em<br />

virtu<strong>de</strong> do silêncio da Constituição, <strong>de</strong>ve analisar-se o círculo <strong>de</strong> competências da Corte. A Carta conferiu ao Tribunal <strong>de</strong> Contas<br />

o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> sustar, se não atendido, a execução <strong>de</strong> atos impugna<strong>dos</strong>, comunicando a <strong>de</strong>cisão à Câmara <strong>dos</strong> Deputa<strong>dos</strong> e ao<br />

Senado Fe<strong>de</strong>ral (art. 71, X). Antes, porém, permitiu-se-lhe assinar prazo para que o órgão ou entida<strong>de</strong> adote as medidas<br />

necessárias à eventual restauração da legalida<strong>de</strong> (art. 71, IX). Em nosso enten<strong>de</strong>r, tais dispositivos <strong>de</strong>vem ser interpreta<strong>dos</strong><br />

conjugadamente: a sustação <strong>de</strong> atos <strong>de</strong> outros órgãos (que é providência gravíssima na relação entre os Po<strong>de</strong>res) só se legitima<br />

após <strong>de</strong>corrido o prazo em que foi recomendada a superação da ilegalida<strong>de</strong>. Segue-se, portanto, que o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> cautela também<br />

há <strong>de</strong> <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r do <strong>de</strong>scumprimento oportuno da recomendação prévia dirigida ao órgão administrativo. 229 Por outro lado, como<br />

já assinalamos anteriormente, a Corte <strong>de</strong> Contas não tem a prerrogativa genérica <strong>de</strong> exercer o controle prévio <strong>de</strong> editais <strong>de</strong><br />

licitação, função não mencionada constitucionalmente em suas competências (art. 71, CF), 230 nem tampouco o <strong>de</strong> contratos do<br />

Po<strong>de</strong>r Público, com obrigação <strong>de</strong> registro prévio. 231 Noutro giro, já se reconheceu ser legítima a competência do TCU para impor<br />

a sanção <strong>de</strong> <strong>de</strong>claração <strong>de</strong> inidoneida<strong>de</strong> no caso <strong>de</strong> infração grave praticada pelo licitante, invocando-se o art. 46 <strong>de</strong> sua Lei<br />

Orgânica (Lei nº 8.443/1992). 232<br />

No que tange às <strong>de</strong>cisões das Cortes <strong>de</strong> Contas, já está consagrado o entendimento segundo o qual, nos processos em que<br />

forem proferidas, <strong>de</strong>ve assegurar-se o contraditório e a ampla <strong>de</strong>fesa quando forem capazes <strong>de</strong> provocar a anulação ou a<br />

revogação <strong>de</strong> ato administrativo que beneficie o interessado. 233 Trata-se <strong>de</strong> restrição ao po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> autotutela da Administração,<br />

tendência que, como já vimos, tem sido observada em diversas situações administrativas para evitar que ato unilateral tenha o<br />

condão <strong>de</strong> <strong>de</strong>sfazer benefício para o administrado, sobretudo quando praticado com abuso <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r. Excetua-se da mencionada<br />

exigência a apreciação da legalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ato <strong>de</strong> concessão inicial <strong>de</strong> aposentadoria, reforma e pensão. Em nosso enten<strong>de</strong>r,

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!