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_Manual de Direito Administrativo_(2017)_Jose dos Santos Carvalho Filho

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acertada – já que inviável é a <strong>de</strong>legação, a entida<strong>de</strong> privada, <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> típica do Estado, ainda mais quando se sabe que nela<br />

está incluído o exercício do po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> polícia, <strong>de</strong> tributação e <strong>de</strong> punição, no que tange a ativida<strong>de</strong>s profissionais regulamentadas.<br />

Assim, ofendi<strong>dos</strong> foram os arts. 5, XIII; 22, XXVI; 21, XXIV; 70, parágrafo único; 149 e 175 da CF. 53<br />

É importante, também, assinalar que tem havido algumas controvérsias e dúvidas a respeito do regime jurídico da OAB –<br />

Or<strong>de</strong>m <strong>dos</strong> Advoga<strong>dos</strong> do Brasil. Decidiu-se, entretanto, que tal autarquia não integra a Administração Indireta da União,<br />

configurando-se como entida<strong>de</strong> in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte; assim, não está vinculada a qualquer órgão administrativo, nem se sujeita ao<br />

respectivo controle ministerial. Além do mais, é entida<strong>de</strong> que não po<strong>de</strong> ser comparada às <strong>de</strong>mais autarquias profissionais,<br />

porque, além <strong>de</strong> seu objetivo básico – <strong>de</strong> representação da categoria <strong>dos</strong> advoga<strong>dos</strong> – tem ainda função institucional <strong>de</strong> natureza<br />

constitucional. Por outro lado, seu pessoal é regido pela CLT, mas não se submete ao art. 37, II, da CF, que exige prévia<br />

aprovação em concurso público para a contratação <strong>dos</strong> servidores. 54<br />

Complementando semelhante regime jurídico, restou <strong>de</strong>cidido que as contribuições pagas pelos inscritos não têm natureza<br />

tributária, sendo que o título executivo extrajudicial previsto no art. 46, parágrafo único, da Lei n 8.906/1994 (Estatuto da<br />

Advocacia), se submete ao processo <strong>de</strong> execução comum, regulado pela lei processual (art. 784, CPC); não se lhe aplica, por<br />

conseguinte, a Lei n 6.830/1980, que rege o processo <strong>de</strong> execução fiscal. Por outro lado, a entida<strong>de</strong> não se sujeita às normas da<br />

Lei n 4.320/1964 (direito financeiro), nem ao controle contábil, financeiro, orçamentário, operacional e patrimonial exercido<br />

pelo Tribunal <strong>de</strong> Contas da União. 55<br />

Sem dúvida, trata-se <strong>de</strong> regime especial, diverso do adotado para as autarquias em geral. Não é idêntico, com certeza, ao<br />

adotado para as agências reguladoras – autarquias <strong>de</strong> regime especial, <strong>de</strong> que trataremos logo adiante – mas é inegável que<br />

ostenta caráter <strong>de</strong> excepcionalida<strong>de</strong> em relação ao sistema autárquico comum.<br />

Ninguém discute que a OAB é instituição <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> importância e expressivo reconhecimento social, tendo já prestado<br />

relevantes serviços à nação em prol da <strong>de</strong>mocracia e <strong>dos</strong> direitos da cidadania. Merece, portanto, todo o respeito por parte da<br />

socieda<strong>de</strong>. Mas, afirmar-se, como afirmou o STF, que se trata <strong>de</strong> entida<strong>de</strong> ímpar, não comparável às <strong>de</strong>mais instituições<br />

fiscalizadoras <strong>de</strong> profissões, constitui discriminação em relação a estas últimas, já que o objetivo nuclear <strong>de</strong> todas é o mesmo – a<br />

regulamentação e a fiscalização do exercício <strong>de</strong> profissões. Outra anomalia é o fato <strong>de</strong> não integrar a Administração Indireta –<br />

fato, aliás, extensível a todas as <strong>de</strong>mais autarquias profissionais. Se presta serviço público in<strong>de</strong>legável, como foi reconhecido<br />

pela mais alta Corte, e exercendo po<strong>de</strong>res especiais <strong>de</strong> Estado, como o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> polícia, não se compreen<strong>de</strong> qual a sua real<br />

posição no sistema <strong>de</strong> governo, sem que esteja integrada na administração <strong>de</strong>scentralizada do governo fe<strong>de</strong>ral.<br />

Da mesma forma, causa espécie que não se submeta ao controle do Tribunal <strong>de</strong> Contas, posição da qual dissentimos, com a<br />

<strong>de</strong>vida vênia daqueles que a <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m. As contribuições pagas pelos profissionais licencia<strong>dos</strong> pela autarquia têm caráter<br />

compulsório e caracterizam-se como dinheiros públicos, o que torna aplicável o art. 71, II, da CF, pelo qual cabe àquele Tribunal<br />

“julgar as contas <strong>dos</strong> administradores e <strong>de</strong>mais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e<br />

indireta”. Frequentemente, ouvem-se reclamações <strong>de</strong> advoga<strong>dos</strong> pela ausência <strong>de</strong> prestação <strong>de</strong> contas da entida<strong>de</strong>, ou ao menos<br />

<strong>de</strong> sua divulgação, fato que ofen<strong>de</strong>ria o princípio da publicida<strong>de</strong> e da transparência. Em se tratando <strong>de</strong> instituição <strong>de</strong> gran<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>nsida<strong>de</strong> <strong>de</strong>mocrática, e situando-se fora do controle da Administração Pública e do Tribunal <strong>de</strong> Contas, ou seja, fora do<br />

controle do Estado enfim, <strong>de</strong>ve esperar-se que a entida<strong>de</strong> proceda ao <strong>de</strong>talhamento <strong>de</strong> sua situação financeira e à <strong>de</strong>vida<br />

divulgação <strong>de</strong>sta aos membros da categoria profissional contribuinte.<br />

Quanto ao pessoal, enten<strong>de</strong>mos legítima a adoção do regime trabalhista, previsto no art. 58, § 3, da Lei 9.649/1998,<br />

enquanto esta se mostrava eficaz. 56 Entretanto, com a suspensão da eficácia do art. 39 da CF pelo STF, 57 retornou o antigo<br />

dispositivo, que previa exatamente o regime jurídico único. Como as autarquias profissionais são sujeitas a regime jurídico <strong>de</strong><br />

direito público, 58 <strong>de</strong>verão adotar doravante o regime estatutário, que é o aplicável basicamente aos servidores da União. 59<br />

Causa estranheza, portanto, o entendimento segundo o qual apenas a OAB po<strong>de</strong> ter seus servidores sob regime celetista, ao<br />

passo que as <strong>de</strong>mais autarquias profissionais (os Conselhos) <strong>de</strong>vem sujeitar-se ao regime estatutário previsto na Lei n<br />

8.112/1990. 60 Cuida-se <strong>de</strong> tratamento jurídico discriminatório para entida<strong>de</strong>s com idêntica situação jurídica, e isso sem qualquer<br />

suporte normativo. É exatamente esse tipo <strong>de</strong> solução que aumenta a confusão e causa perplexida<strong>de</strong> aos estudiosos.<br />

Contudo, dissentimos frontalmente da dispensa <strong>de</strong> concurso público para o recrutamento <strong>de</strong> pessoal. Em nosso enten<strong>de</strong>r, tal<br />

orientação ofen<strong>de</strong> o princípio da moralida<strong>de</strong> administrativa e, especificamente, o art. 37, II, da CF, que exige o procedimento<br />

concursal. Com tal tipo <strong>de</strong> imunida<strong>de</strong>, não <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> passar pelo pensamento das pessoas a indagação sobre como é feita a<br />

contratação do pessoal da autarquia, ou a dúvida sobre se esta respeita, efetivamente, o sistema do mérito e o princípio da<br />

igualda<strong>de</strong> <strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong>s. 61<br />

Enfim, a OAB merece tratamento respeitoso, mas não discriminatório. Talvez valesse a pena pesquisar a opinião e o<br />

sentimento <strong>de</strong> to<strong>dos</strong> os advoga<strong>dos</strong> a ela vincula<strong>dos</strong>, pois é provável que percebam que há algo <strong>de</strong> esdrúxulo no regime ora<br />

dispensado a essa autarquia tão relevante, reconhecida e <strong>de</strong>mocrática.

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