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_Manual de Direito Administrativo_(2017)_Jose dos Santos Carvalho Filho

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7.3. Quanto ao Regime Jurídico (Autarquias <strong>de</strong> Regime Especial)<br />

A <strong>de</strong>speito <strong>de</strong> não abonarmos esta classificação, como adiante explicaremos, permitimo-nos apresentá-la não somente em<br />

virtu<strong>de</strong> da referência feita por algumas leis, como também em homenagem a alguns especialistas que a têm acolhido quando<br />

alu<strong>de</strong>m ao regime das autarquias.<br />

É sob esse aspecto que se admite a classificação <strong>de</strong> dois grupos <strong>de</strong> autarquias quando se leva em conta o seu regime<br />

jurídico: (a) autarquias comuns (ou <strong>de</strong> regime comum); (b) autarquias especiais (ou <strong>de</strong> regime especial). Segundo a própria<br />

terminologia, é fácil distingui-las: as primeiras estariam sujeitas a uma disciplina jurídica sem qualquer especificida<strong>de</strong>, ao passo<br />

que as últimas seriam regidas por disciplina específica, cuja característica seria a <strong>de</strong> atribuir prerrogativas especiais e<br />

diferenciadas a certas autarquias.<br />

Foi a Lei nº 5.540/1968, que, ao dispor sobre a organização do ensino superior (art. 4º e parágrafo único, já revoga<strong>dos</strong>),<br />

estabeleceu que as universida<strong>de</strong>s e estabelecimentos <strong>de</strong> ensino, quando oficiais, se constituiriam em autarquias <strong>de</strong> regime<br />

especial ou em fundações <strong>de</strong> direito público. Contudo, não <strong>de</strong>finiu o que seria esse regime especial, limitando-se exclusivamente<br />

a consignar que esse regime obe<strong>de</strong>ceria às “peculiarida<strong>de</strong>s” indicadas na disciplina legal. Acolhendo essa qualificação, alguns<br />

doutrinadores adotaram o entendimento <strong>de</strong> que o regime especial se caracterizaria pelas regalias que a lei conferisse à autarquia,<br />

houvesse ou não referência em dispositivo legal. 62 Note-se, entretanto, que nem sempre se aceitou inteiramente essa categoria, e<br />

isso ficou claro quando se tentou extrair em seu favor situações jurídicas sem amparo na Constituição. À guisa <strong>de</strong> exemplo, os<br />

servidores do Banco Central, que tinham regime diferenciado, passaram a ser estatutários, como os integrantes das <strong>de</strong>mais<br />

autarquias. 63<br />

AGÊNCIAS REGULADORAS – A qualificação legal expressa voltou à tona mais recentemente quando da instituição das<br />

autarquias <strong>de</strong> controle ou, se se preferir, das agências reguladoras. Realmente, houve menção expressa em várias leis. A Lei n<br />

9.427, <strong>de</strong> 26.12.1996, <strong>de</strong>clara que a ANEEL (Agência Nacional <strong>de</strong> Energia Elétrica) é “autarquia sob regime especial” (art. 1 o );<br />

a Lei n o 9.472, <strong>de</strong> 16.7.1997, reza que a ANATEL (Agência Nacional <strong>de</strong> Telecomunicações) é autarquia submetida a “regime<br />

autárquico especial” (art. 8 o ); a Lei n o 9.478, <strong>de</strong> 6.8.1997, qualifica a ANP (Agência Nacional do Petróleo) como sujeita ao<br />

“regime autárquico especial” (art. 7 o ); a Lei n 9.782, <strong>de</strong> 26.1.1999, refere-se à ANVISA (Agência Nacional <strong>de</strong> Vigilância<br />

Sanitária) como sendo autarquia “sob regime especial” (art. 3 o ).<br />

A instituição das agências <strong>de</strong>correu do <strong>de</strong>nominado po<strong>de</strong>r regulatório, pelo qual as entida<strong>de</strong>s exercem controle basicamente<br />

sobre dois setores, ambos executa<strong>dos</strong> por pessoas da iniciativa privada: os serviços públicos, normalmente <strong>de</strong>lega<strong>dos</strong> por<br />

concessão (como, v. g., a energia elétrica), e algumas ativida<strong>de</strong>s econômicas privadas <strong>de</strong> relevância social (v. g., produção e<br />

comercialização <strong>de</strong> medicamentos). 64<br />

Diante <strong>de</strong> tão reiteradas referências legais, seria <strong>de</strong> perguntar-se: quais os elementos <strong>de</strong>finidores das autarquias <strong>de</strong> regime<br />

especial? Sem embargo <strong>de</strong> os autores não traçarem linhas rigorosamente idênticas a respeito <strong>de</strong> tais elementos, po<strong>de</strong>mos dizer,<br />

numa visão geral, que correspon<strong>de</strong>riam às seguintes prerrogativas: (1 o ) po<strong>de</strong>r normativo técnico; (2 o ) autonomia <strong>de</strong>cisória; (3 o )<br />

in<strong>de</strong>pendência administrativa; (4 o ) autonomia econômico-financeira. 65<br />

O po<strong>de</strong>r normativo técnico indica que essas autarquias recebem das respectivas leis <strong>de</strong>legação para editar normas técnicas<br />

(não as normas básicas <strong>de</strong> política legislativa) complementares <strong>de</strong> caráter geral, retratando po<strong>de</strong>r regulamentar mais amplo,<br />

porquanto tais normas se introduzem no or<strong>de</strong>namento jurídico como direito novo (ius novum). 66 Semelhante po<strong>de</strong>r tem suscitado<br />

alguns questionamentos, inclusive quanto à sua constitucionalida<strong>de</strong>. Não vemos, porém, qualquer óbice quanto à sua instituição,<br />

<strong>de</strong> resto já ocorrida em outros sistemas jurídicos. O que nos parece inafastável é a verificação, em cada caso, se foi regular o<br />

exercício do po<strong>de</strong>r ou, ao contrário, se foi abusivo, com <strong>de</strong>srespeito aos parâmetros que a lei <strong>de</strong>terminou. 67 Consequentemente, o<br />

po<strong>de</strong>r normativo técnico não po<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> submeter-se a controle administrativo e institucional. 68<br />

Esse fenômeno, <strong>de</strong> resto já conhecido em outros sistemas jurídicos, tem sido <strong>de</strong>nominado <strong>de</strong> <strong>de</strong>slegalização (ou<br />

<strong>de</strong>slegificação, como preferem alguns), consi<strong>de</strong>rando que a edição <strong>de</strong> normas gerais <strong>de</strong> caráter técnico se formaliza por atos<br />

administrativos regulamentares em virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>legação prevista na respectiva lei. Na verda<strong>de</strong>, não há, como supõem alguns<br />

estudiosos (equivocadamente, a nosso ver), transferência do po<strong>de</strong>r legiferante a órgãos ou pessoas da Administração, mas tão<br />

somente o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> estabelecer regulamentação sobre matéria <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m técnica, que, por ser extremamente particularizada, não<br />

po<strong>de</strong>ria mesmo estar disciplinada na lei. Por conseguinte, nenhuma ofensa estará sendo perpetrada ao princípio da reserva legal<br />

contemplado em âmbito constitucional. 69 Em nosso enten<strong>de</strong>r, trata-se <strong>de</strong> exigência <strong>dos</strong> tempos mo<strong>de</strong>rnos e, por refletir inovação,<br />

não surpreen<strong>de</strong> a reação oposta por alguns setores jurídicos, costumeira em semelhantes situações. 70 O que se exige, isto sim, é<br />

que as escolhas da Administração regulatória tenham suporte em elementos concretos e suscetíveis <strong>de</strong> aferição. 71<br />

A autonomia <strong>de</strong>cisória significa que os conflitos administrativos, inclusive os que envolvem as entida<strong>de</strong>s sob seu controle,<br />

se <strong>de</strong>senca<strong>de</strong>iam e se dirimem através <strong>dos</strong> próprios órgãos da autarquia. Em outras palavras, o po<strong>de</strong>r revisional exaure-se no

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