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_Manual de Direito Administrativo_(2017)_Jose dos Santos Carvalho Filho

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<strong>de</strong>stinada a regular o referido negócio em áreas urbanas e voltada especificamente para a política <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento urbano<br />

(art. 182, CF). Consequentemente, o Código Civil, embora materializado por lei mais nova, caracteriza-se como lei geral, e,<br />

portanto, será aplicável a imóveis situa<strong>dos</strong> fora da área urbana. 166 Ambos os diplomas, por conseguinte, convivem<br />

harmoniosamente <strong>de</strong>ntro do sistema, cada um <strong>de</strong>les incidindo sobre esfera jurídica específica. 167<br />

O direito <strong>de</strong> superfície <strong>de</strong>ve formalizar-se por contrato, como consta da lei, revelando as manifestações volitivas do<br />

proprietário e do superficiário. No instrumento contratual é que as partes <strong>de</strong>vem pactuar <strong>de</strong>talhamente os direitos e obrigações<br />

atribuí<strong>dos</strong> a cada uma <strong>de</strong>las.<br />

A natureza jurídica é a <strong>de</strong> direito real sobre a coisa alheia. O Código Civil, inclusive, inseriu expressamente o direito <strong>de</strong><br />

superfície no elenco <strong>dos</strong> direitos reais (art. 1.225, II). Constituído o direito, <strong>de</strong>ve ser objeto <strong>de</strong> averbação no respectivo cartório<br />

do registro <strong>de</strong> imóveis. Como corolário, o direito é transferível a terceiros por ato inter vivos ou causa mortis. 168 Po<strong>de</strong>, inclusive,<br />

ser objeto <strong>de</strong> garantia real no âmbito do sistema financeiro da habitação, cujos agentes não po<strong>de</strong>m recusá-la. 169 Quanto ao objeto<br />

do negócio jurídico, a lei refere-se à concessão da superfície do terreno, parecendo indicar apenas o solo puro. Entretanto, a lei<br />

disse menos do que queria (minus quam voluit). Na verda<strong>de</strong>, tanto po<strong>de</strong> o terreno puro ser objeto do contrato, como eventual<br />

edificação que a ela tenha acedido pelo princípio da acessão natural (superficies solo cedit). 170 O terreno, <strong>de</strong>sse modo, é a reserva<br />

mínima para figurar como objeto contratual, nada impedindo maior extensão.<br />

No cotejo entre as disciplinas do Estatuto da Cida<strong>de</strong> e do Código Civil, encontram-se algumas diferenças <strong>de</strong> tratamento da<br />

matéria (o que é um complicador in<strong>de</strong>sejável). Vejamos as distinções básicas: (1 o ) no Estatuto da Cida<strong>de</strong>, o direito <strong>de</strong> superfície<br />

po<strong>de</strong> ser ajustado por prazo <strong>de</strong>terminado ou in<strong>de</strong>terminado (art. 21), ao passo que no Código Civil o ajuste <strong>de</strong>ve ser apenas por<br />

prazo <strong>de</strong>terminado (art. 1.369) (note-se que o Estado, como proprietário, só po<strong>de</strong> contratar por prazo <strong>de</strong>terminado); (2 o ) o direito<br />

<strong>de</strong> superfície no Estatuto abrange, como regra, o direito <strong>de</strong> utilização do subsolo (art. 21, § 1 o ), o que não ocorre no Código Civil,<br />

a menos que a obra seja inerente ao objeto do contrato (art. 1.369, parágrafo único); (3 o ) o Código Civil alu<strong>de</strong> à constituição do<br />

direito por pessoa jurídica <strong>de</strong> direito público interno (art. 1.377), ao passo que o Estatuto é silente a respeito; 171 (4 o ) o Código<br />

Civil regula a hipótese <strong>de</strong> <strong>de</strong>sapropriação, estabelecendo que a in<strong>de</strong>nização caberá ao proprietário e ao superficiário, sendo<br />

proporcional ao valor do direito real <strong>de</strong> cada um (art. 1.376); o Estatuto não regulou tal hipótese. 172<br />

Por fim, releva <strong>de</strong>stacar que, no caso <strong>de</strong> alienação da proprieda<strong>de</strong> ou do direito <strong>de</strong> superfície, terão direito <strong>de</strong> preferência,<br />

respectivamente, o superficiário e o proprietário, em igualda<strong>de</strong> <strong>de</strong> condições à oferta <strong>de</strong> terceiros. Extinto o negócio, o<br />

proprietário recuperará a proprieda<strong>de</strong> plena do imóvel, só tendo a obrigação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar acessões e benfeitorias feitas pelo<br />

superficiário se o contrato for expresso a respeito.<br />

LOCAÇÃO – Locação é o contrato <strong>de</strong> direito privado pelo qual o proprietário-locador transfere a posse do bem ao<br />

locatário, que tem a obrigação <strong>de</strong> pagar certa importância – o aluguel – por período <strong>de</strong>terminado <strong>de</strong> uso do bem.<br />

O uso privativo nessa hipótese ocorre quando o bem pertence ao Estado. Se este celebra, como locador, contrato <strong>de</strong> locação<br />

com um particular, assumindo este a condição <strong>de</strong> locatário, <strong>de</strong>ve o ajuste ser regulado normalmente pelo Código Civil,<br />

<strong>de</strong>monstrando o caráter privado da contratação. 173<br />

Importa lembrar que, mesmo sendo instrumento <strong>de</strong> direito privado, a locação <strong>de</strong> bens públicos a terceiros também confere<br />

seu uso privativo pelo locatário, tal como ocorre com as formas <strong>de</strong> direito público já examinadas.<br />

Têm surgido algumas controvérsias a respeito <strong>de</strong>ssa forma <strong>de</strong> uso <strong>dos</strong> bens <strong>de</strong> entida<strong>de</strong>s administrativas. Há estudiosos que<br />

não aceitam o regime <strong>de</strong> locação do direito civil para bens públicos, sustentando que somente se revela admissível a concessão<br />

remunerada <strong>de</strong> uso <strong>de</strong> bem público, modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> contrato administrativo. 174<br />

Como já visto, essa não nos parece a melhor posição: na verda<strong>de</strong>, inexiste qualquer vedação <strong>de</strong> índole constitucional em tal<br />

sentido. A<strong>de</strong>mais, legislação mais recente tem sido expressa no que concerne à viabilida<strong>de</strong> jurídica do instituto da locação <strong>de</strong><br />

imóveis públicos. 175 Resulta, pois, que não se po<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> reconhecer a viabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sse ajuste. 176 Uma coisa é concluir ser a<br />

concessão <strong>de</strong> uso um ajuste mais a<strong>de</strong>quado do que a locação; outra, inteiramente diversa, é simplesmente consi<strong>de</strong>rar inadmissível<br />

a locação. O que importa, na espécie, é a opção do administrador – que, diga-se <strong>de</strong> passagem, terá que avaliar cada situação e não<br />

po<strong>de</strong>rá vislumbrar outro fim senão o <strong>de</strong> interesse público. Por isso mesmo, sendo in<strong>de</strong>vida a escolha, o ajuste estará sujeito à<br />

invalidação, e o administrador, à responsabilida<strong>de</strong> civil, administrativa e penal.<br />

Entretanto, há alguns julga<strong>dos</strong> que realmente causam espécie. No STJ já se julgou que o contrato firmado por particular com<br />

a INFRAERO, empresa pública (e, por isso mesmo, dotada <strong>de</strong> personalida<strong>de</strong> jurídica <strong>de</strong> direito privado), não é <strong>de</strong> locação, e sim<br />

<strong>de</strong> direito público, porque os bens da empresa pública relativos a sua finalida<strong>de</strong> são utiliza<strong>dos</strong> <strong>de</strong> acordo com as regras do<br />

<strong>Direito</strong> Público, não seguindo, pois, as regras da locação <strong>de</strong> direito privado. 177 Em nosso enten<strong>de</strong>r, há dois equívocos, venia<br />

concessa, na <strong>de</strong>cisão. Por um lado, nem se o bem fosse efetivamente público (e os <strong>de</strong> empresas públicas não o são) haveria<br />

objeção para a relação locatícia. Por outro, se a entida<strong>de</strong> administrativa é privada, com mais razão <strong>de</strong>ve regular-se pelas normas<br />

aplicáveis às empresas privadas quanto a direitos e obrigações civis e comerciais, como registra o art. 173, § 1 o , II, da Lei

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