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_Manual de Direito Administrativo_(2017)_Jose dos Santos Carvalho Filho

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sim, <strong>de</strong>finir-lhe os contornos e fixar-lhe limitações, mas nunca <strong>de</strong>ixará o direito <strong>de</strong> figurar como objeto da tutela jurídica.<br />

Logo adiante veremos que a proprieda<strong>de</strong> não mais se caracteriza como direito absoluto, como ocorria na época medieval.<br />

Hoje o direito <strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong> só se justifica diante do pressuposto que a Constituição estabelece para que a torne suscetível <strong>de</strong><br />

tutela: a função social. Se a proprieda<strong>de</strong> não está aten<strong>de</strong>ndo a sua função social, <strong>de</strong>ve o Estado intervir para amoldá-la a essa<br />

qualificação. E essa função autoriza não só a <strong>de</strong>terminação <strong>de</strong> obrigações <strong>de</strong> fazer, como <strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> fazer, sempre para impedir<br />

o uso egoístico e antissocial da proprieda<strong>de</strong>. 5 Por isso, o direito <strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong> é relativo e condicionado.<br />

O novo Código Civil, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> repetir a norma que confere ao proprietário a faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> usar, gozar e dispor da coisa (art.<br />

1.228), fez a seguinte ressalva, em conformida<strong>de</strong> com a disciplina constitucional, e para consolidar o caráter social da<br />

proprieda<strong>de</strong>: “o direito <strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong> <strong>de</strong>ve ser exercido em consonância com as suas finalida<strong>de</strong>s econômicas e sociais e <strong>de</strong><br />

modo que sejam preserva<strong>dos</strong>, <strong>de</strong> conformida<strong>de</strong> com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o<br />

equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas” (art. 1.228, § 1 o ).<br />

Ficou, portanto, reforçado o sentido social da proprieda<strong>de</strong>. Se o proprietário não respeita essa função, nasce para o Estado o po<strong>de</strong>r<br />

jurídico <strong>de</strong> nela intervir e até <strong>de</strong> suprimi-la, se esta providência se afigurar indispensável para ajustá-la aos fins<br />

constitucionalmente assegura<strong>dos</strong>.<br />

II.<br />

Intervenção do Estado<br />

1.<br />

SENTIDO<br />

Essa breve introdução é necessária para chegarmos ao ponto que constitui objeto do presente capítulo, ou seja, a intervenção<br />

do Estado na proprieda<strong>de</strong>.<br />

De forma sintética, po<strong>de</strong>mos consi<strong>de</strong>rar intervenção do Estado na proprieda<strong>de</strong> toda e qualquer ativida<strong>de</strong> estatal que,<br />

amparada em lei, tenha por fim ajustá-la aos inúmeros fatores exigi<strong>dos</strong> pela função social a que está condicionada. Extrai-se <strong>de</strong>ssa<br />

noção que qualquer ataque à proprieda<strong>de</strong>, que não tenha esse objetivo, estará contaminado <strong>de</strong> irretorquível ilegalida<strong>de</strong>. Trata-se,<br />

pois, <strong>de</strong> pressuposto constitucional do qual não po<strong>de</strong> afastar-se a Administração.<br />

A intervenção, como é óbvio, revela um po<strong>de</strong>r jurídico do Estado, calcado em sua própria soberania. É verda<strong>de</strong>iro po<strong>de</strong>r <strong>de</strong><br />

império (ius imperii), a ele <strong>de</strong>vendo sujeição os particulares. Sem dúvida, as necessida<strong>de</strong>s individuais e gerais, como bem afirma<br />

GABINO FRAGA, se satisfazem pela ação do Estado e <strong>dos</strong> particulares, e, sempre que se amplia a ação relativa a uma <strong>de</strong>ssas<br />

necessida<strong>de</strong>s, o efeito recai necessariamente sobre a outra. 6<br />

2.<br />

QUADRO NORMATIVO CONSTITUCIONAL<br />

A vigente Constituição dá suporte à intervenção do Estado na proprieda<strong>de</strong>. De um lado, garante o direito <strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong> (art.<br />

5 o , XXII), mas ao mesmo tempo condiciona o instituto ao atendimento da função social (art. 5 o XXIII). Aqui se encontra o<br />

primeiro embasamento constitucional. Se a proprieda<strong>de</strong> precisa estar condicionada à função social, segue-se que, se não estiver<br />

atendida essa condição, po<strong>de</strong>rá o Estado intervir para vê-la atendida.<br />

No capítulo <strong>de</strong>stinado à política urbana, diz a Constituição: “A proprieda<strong>de</strong> urbana cumpre sua função social quando aten<strong>de</strong><br />

às exigências fundamentais <strong>de</strong> or<strong>de</strong>nação da cida<strong>de</strong> expressas no plano diretor” (art. 182, § 2 o ). O dispositivo indica que, em<br />

termos urbanísticos, o paradigma para a expressão da função social da proprieda<strong>de</strong> é o plano diretor do Município, e logicamente<br />

haverá situações em que esse plano diretor entrará em rota <strong>de</strong> colisão com interesses do proprietário. Prevendo essa situação, a<br />

Lei Fundamental <strong>de</strong>u ao Município po<strong>de</strong>res interventivos na proprieda<strong>de</strong>, estabelecendo que po<strong>de</strong> ser imposta ao proprietário a<br />

obrigação <strong>de</strong> promover o a<strong>de</strong>quado aproveitamento do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, quando em<br />

<strong>de</strong>scompasso com as normas no plano diretor. No caso <strong>de</strong> inobservância da imposição, tem o Município o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> impor o<br />

parcelamento ou a edificação compulsória do solo e, em último caso, <strong>de</strong> promover a própria <strong>de</strong>sapropriação. 7<br />

Outra norma que dá suporte à intervenção é a do art. 5 o , XXV, da CF. Estabelece o dispositivo que o Po<strong>de</strong>r Público po<strong>de</strong>rá<br />

usar da proprieda<strong>de</strong> particular no caso <strong>de</strong> iminente perigo público. É a figura da requisição, que examinaremos ainda neste<br />

capítulo.<br />

Por fim, não é <strong>de</strong>mais lembrar que a Constituição contempla o instituto da <strong>de</strong>sapropriação, que não <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser o mais<br />

draconiano modo <strong>de</strong> intervenção na proprieda<strong>de</strong>, vez que a retira do domínio do proprietário para inseri-la no patrimônio do<br />

Estado. Entretanto, pela extensão <strong>de</strong>ssa matéria, e para fins didáticos, teceremos os <strong>de</strong>vi<strong>dos</strong> comentários no capítulo seguinte.<br />

III.<br />

Competência

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