02.08.2017 Views

_Manual de Direito Administrativo_(2017)_Jose dos Santos Carvalho Filho

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

art. 167, IV, da CF, não visa a garantir credores, mas sim a preservar o equilíbrio entre a dívida pública e o valor da receita<br />

antecipada, com isso prevenindo-se <strong>de</strong>sequilíbrio orçamentário. 170 Com o <strong>de</strong>vido respeito a tão abalizadas opiniões, não<br />

vislumbramos incongruência com o texto constitucional. Este limita-se a consi<strong>de</strong>rar não vedada a vinculação no caso <strong>de</strong><br />

“prestação <strong>de</strong> garantias às operações <strong>de</strong> crédito por antecipação <strong>de</strong> receita”. Ora, como ensina autorizada doutrina, tais<br />

operações visam a cobrir eventual déficit <strong>de</strong> caixa, “quando as receitas tributárias arrecadadas se mostram ainda insuficientes<br />

para aten<strong>de</strong>r as <strong>de</strong>spesas iniciais”, fato que permite ao Executivo garantir a operação <strong>de</strong> crédito por antecipação da receita. 171<br />

Nesse aspecto, parece-nos <strong>de</strong>va ter-se em vista o aspecto específico da parceria público-privada, na qual a contraprestação pelo<br />

investimento feito pelo concessionário é o compartilhamento <strong>dos</strong> riscos e a garantia <strong>de</strong> recebimento <strong>de</strong> seu crédito.<br />

Po<strong>de</strong>m ainda ser ajustadas outras formas <strong>de</strong> garantia, como: (a) contratação <strong>de</strong> seguro-garantia com empresas não<br />

controladas pelo ente estatal; (b) garantia prestada por organismos internacionais ou instituições financeiras fora do controle do<br />

Po<strong>de</strong>r Público; (c) criação ou utilização <strong>de</strong> fun<strong>dos</strong> especiais, conforme previsto em lei; (d) garantia prestada por fundo garantidor<br />

ou empresa estatal criada especificamente para tal objetivo; (e) outros instrumentos a serem adota<strong>dos</strong> em lei. 172<br />

Quanto ao fundo garantidor (FGP – Fundo Garantidor <strong>de</strong> Parcerias) – mecanismo pelo qual optou o governo fe<strong>de</strong>ral,<br />

conforme consta <strong>dos</strong> arts. 16 a 22 da lei, e que enseja algumas vantagens para o parceiro privado – há interpretação segundo a<br />

qual ocorreria contrarieda<strong>de</strong> ao art. 165, § 9 o , II, da CF, pelo qual se exige lei complementar para a instituição e funcionamento<br />

<strong>de</strong> fun<strong>dos</strong>, e ao art. 71, da Lei n o 4.320/1964 (normas gerais <strong>de</strong> direito financeiro), que proíbe que fun<strong>dos</strong> possam ser objeto <strong>de</strong><br />

garantia <strong>de</strong> dívidas pecuniárias. 173<br />

A impugnação, porém, não proce<strong>de</strong>. O dispositivo constitucional tem cunho genérico e refere-se ao estabelecimento <strong>de</strong><br />

normas gerais sobre fun<strong>dos</strong>, e não à instituição <strong>de</strong> fundo específico, sendo, pois, legítima a instituição <strong>de</strong>ste por lei ordinária. Por<br />

outro lado, o dispositivo da Lei n o 4.320/1964 apenas impõe que as receitas <strong>dos</strong> fun<strong>dos</strong> se vinculem a objetivos pre<strong>de</strong>termina<strong>dos</strong>,<br />

nada impedindo, portanto, que entre tais objetivos esteja o <strong>de</strong> garantir dívidas contraídas para a execução <strong>de</strong> parcerias públicoprivadas.<br />

174<br />

É <strong>de</strong> se reconhecer, contudo, que o fundo ora referido constitui figura <strong>de</strong> certo modo anômala, já que tem natureza privada e<br />

respon<strong>de</strong> com seus bens e direitos pelas obrigações que venha a contrair (art. 16, §§ 1 o e 5 o , da lei). Entretanto, é <strong>de</strong>spido <strong>de</strong><br />

personalida<strong>de</strong> jurídica própria e se configura como verda<strong>de</strong>ira universalida<strong>de</strong> jurídica <strong>de</strong> bens e direitos ou, se se preferir, <strong>de</strong><br />

patrimônio <strong>de</strong> afetação. O intento da lei, no entanto, ficou claro: em virtu<strong>de</strong> do sistema <strong>de</strong> parceria, <strong>de</strong>ve conferir-se ao credor<br />

maior facilida<strong>de</strong> no recebimento <strong>de</strong> seu crédito, o que não ocorre nos contratos comuns da Administração. 175 Assinale-se, por<br />

fim, que tal sistema não po<strong>de</strong>ria aplicar-se a fun<strong>dos</strong> <strong>de</strong> natureza pública, eis que a regência nesse caso sofre o influxo <strong>de</strong> normas<br />

<strong>de</strong> direito público.<br />

A Lei n o 11.079/2004 previu a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> a União conce<strong>de</strong>r garantia ou realizar transferência voluntária aos Esta<strong>dos</strong>,<br />

Distrito Fe<strong>de</strong>ral e Municípios com vistas à contratação <strong>de</strong> PPPs (art. 28). A condição é que a soma das <strong>de</strong>spesas continuadas<br />

<strong>de</strong>correntes das parcerias já contratadas por tais pessoas não ultrapasse, no ano anterior, o percentual <strong>de</strong> 5% da receita corrente<br />

líquida do exercício, ou que as <strong>de</strong>spesas anuais <strong>dos</strong> contratos vigentes nos <strong>de</strong>z anos subsequentes não excedam 5% da mesma<br />

receita, projetada para os respectivos exercícios. O percentual anterior <strong>de</strong> comprometimento era <strong>de</strong> 3%, mas foi elevado para 5%<br />

pela Lei n o 12.766/2012, que alterou o citado art. 28 da Lei n o 11.079/2004. A alteração, como se po<strong>de</strong> inferir, ampliou a margem<br />

<strong>de</strong> comprometimento da receita para que aqueles entes fe<strong>de</strong>rativos façam jus ao benefício.<br />

8.<br />

SOCIEDADE DE PROPÓSITO ESPECÍFICO<br />

Embora o projeto <strong>de</strong> lei do Executivo sobre as parcerias público-privadas não tenha feito a previsão, a Lei n o 11.079/2004<br />

contemplou a instituição da socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> propósito específico, conferindo-lhe a incumbência <strong>de</strong> implantar e gerir o projeto <strong>de</strong><br />

parceria, como reza o art. 9 o . Preten<strong>de</strong>u o legislador colocar em apartado a pessoa jurídica interessada na parceria, <strong>de</strong> um lado, e<br />

a pessoa jurídica incumbida da execução do objeto do contrato, <strong>de</strong> outro. A providência, <strong>de</strong> fato, permitirá melhor forma <strong>de</strong><br />

controle do po<strong>de</strong>r conce<strong>de</strong>nte sobre as ativida<strong>de</strong>s, o <strong>de</strong>sempenho e as contas do parceiro privado. 176<br />

Não obstante, a lei não se revelou suficientemente clara quanto ao momento <strong>de</strong> instituição da referida socieda<strong>de</strong>. O art. 9 o<br />

emprega a expressão “Antes da celebração do contrato”, e só. Ao que parece, a precedência diz respeito apenas ao contrato, mas<br />

não à licitação. Nesta participará normalmente a pessoa jurídica já existente. Aquela que vencer o certame, então, terá que<br />

cumprir obrigação pré-contratual, qual seja, a <strong>de</strong> instituir a socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> propósito específico. É a conclusão que se afigura mais<br />

lógica. O edital <strong>de</strong> licitação, no entanto, <strong>de</strong>verá fixar prazo para que o licitante vencedor cumpra tal obrigação, pois que seria<br />

inócua a existência <strong>de</strong>sta sem prazo-limite para o cumprimento. O certo é que, <strong>de</strong>scumprida essa obrigação, o po<strong>de</strong>r conce<strong>de</strong>nte<br />

não po<strong>de</strong>rá celebrar o contrato com a socieda<strong>de</strong> primitiva. Dentro do sistema licitatório, caberá à Administração convocar o<br />

participante que ficou na or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> classificação imediatamente inferior.<br />

Permite a lei que a socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> propósito específico assuma a forma <strong>de</strong> companhia aberta, sob o mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong>

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!