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_Manual de Direito Administrativo_(2017)_Jose dos Santos Carvalho Filho

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<strong>de</strong> seus bens, impostas pelo Po<strong>de</strong>r Público. Sob essa proteção, a proprieda<strong>de</strong> estará cumprindo o papel para o qual a <strong>de</strong>stinou a<br />

Constituição.<br />

Desse modo, po<strong>de</strong>mos consi<strong>de</strong>rar que o tombamento é fundado na necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> a<strong>de</strong>quação da proprieda<strong>de</strong> à<br />

correspon<strong>de</strong>nte função social. E a função social, na hipótese, é estampada pela necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> proteção ao patrimônio cultural,<br />

histórico, artístico etc.<br />

Bem a propósito, aliás, foi promulgada a EC n o 48, <strong>de</strong> 10.8.2005, que, acrescentando o § 3 o ao art. 215 da CF, previu que lei<br />

venha a estabelecer o Plano Nacional <strong>de</strong> Cultura, <strong>de</strong> duração plurianual, com o objetivo <strong>de</strong> fomentar o <strong>de</strong>senvolvimento cultural<br />

do País e a integração <strong>de</strong> ações do Po<strong>de</strong>r Público para a <strong>de</strong>fesa e valorização do patrimônio cultural brasileiro, produção,<br />

promoção e difusão <strong>de</strong> bens culturais e outras ações do gênero. Nota-se, <strong>de</strong>starte, o intuito <strong>de</strong> dar cada vez mais realce aos valores<br />

culturais do País. E é nesse contexto que se encontra o instituto do tombamento.<br />

Ultimamente, porém, têm sido tomba<strong>dos</strong> imóveis urbanos para o fim <strong>de</strong> impedir sua <strong>de</strong>molição e evitar novas edificações ou<br />

edificações em <strong>de</strong>terminadas áreas urbanas, cuja <strong>de</strong>manda <strong>de</strong> serviços públicos e equipamentos urbanos seja incompatível com a<br />

oferta possível no local. Com tal objetivo, certas zonas urbanas têm sido qualificadas como “áreas <strong>de</strong> proteção ao ambiente<br />

cultural”, e nelas se indicam os imóveis sujeitos àquelas limitações. É o que tem ocorrido, por exemplo, no Município do Rio <strong>de</strong><br />

Janeiro.<br />

Há nesses atos notório <strong>de</strong>svio <strong>de</strong> perspectiva. São eles flagrantemente ilegais e nenhuma relação têm com o real motivo do<br />

tombamento. O fundamento real <strong>de</strong>ste instituto é a preservação do patrimônio público, mas naquelas áreas não há qualquer<br />

ambiente cultural a ser preservado. O que se preten<strong>de</strong>, com efeito, é instituir limitações administrativas urbanísticas, cujo<br />

fundamento, inteiramente diverso, consiste na mudança <strong>de</strong> estratégia <strong>de</strong> política urbana e na necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> alteração <strong>de</strong> critérios<br />

para edificação, tendo-se em mira a preservação da or<strong>de</strong>m urbanística, e não da or<strong>de</strong>m cultural, como parece insinuar. Se a<br />

Administração quer alterar critérios <strong>de</strong> edificação, como gabaritos, natureza e objetivos <strong>de</strong> prédios, po<strong>de</strong> fazê-lo por instrumentos<br />

urbanísticos, mas não por meio <strong>de</strong> tombamento.<br />

Por outro lado, importa anotar que os institutos são também diversos quanto aos <strong>de</strong>stinatários: enquanto o tombamento é ato<br />

<strong>de</strong> limitação individual, e isso porque <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da análise <strong>de</strong> cada bem a ser tombado, as limitações urbanísticas administrativas,<br />

como foi visto, são atos gerais e impessoais e, por conseguinte, inci<strong>de</strong>m sobre coletivida<strong>de</strong>s in<strong>de</strong>terminadas. Na verda<strong>de</strong>, adotouse<br />

um instituto com os efeitos <strong>de</strong> outro.<br />

O que se nota, na verda<strong>de</strong>, é uma conduta dissimulada do governo municipal, aplicando in<strong>de</strong>vidamente o tombamento, que,<br />

como regra, não enseja in<strong>de</strong>nização ao proprietário, em lugar <strong>de</strong> estabelecer limitações urbanísticas individuais, como, por<br />

exemplo, a proibição <strong>de</strong> <strong>de</strong>molir o imóvel ou a supressão do conteúdo econômico da proprieda<strong>de</strong>, em que o proprietário,<br />

sacrificado em seu direito, faz jus à in<strong>de</strong>nização <strong>de</strong>vida pelo Município. Como suce<strong>de</strong> costumeiramente em outras hipóteses, tal<br />

conduta aten<strong>de</strong> mais a apelos <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m política que à observância da or<strong>de</strong>m jurídica e ao interesse público que <strong>de</strong>ve prelevar na<br />

matéria. 70<br />

4.<br />

OBJETO<br />

O tombamento inci<strong>de</strong> sobre bens móveis e imóveis. Esse objeto consta do art. 1 o do Decreto-lei n o 25/1937, que, ao <strong>de</strong>finir<br />

patrimônio histórico e artístico nacional, consi<strong>de</strong>ra-o composto <strong>de</strong> bens móveis e imóveis existentes no país.<br />

Deve consignar-se, porém, que os bens suscetíveis <strong>de</strong> tombamento são aqueles que traduzem aspectos <strong>de</strong> relevância para a<br />

noção <strong>de</strong> patrimônio cultural brasileiro. Como diz a Lei do Tombamento, são os bens do patrimônio histórico e artístico. Desse<br />

modo, correta é a observação <strong>de</strong> HELY LOPES MEIRELLES <strong>de</strong> que é equivocado o tombamento <strong>de</strong> florestas, reservas naturais e<br />

parques ecológicos. Logicamente que tais bens são suscetíveis <strong>de</strong> proteção pelo Po<strong>de</strong>r Público, mas não é o instituto do<br />

tombamento o a<strong>de</strong>quado a tal <strong>de</strong>si<strong>de</strong>rato. 71<br />

5.<br />

NATUREZA JURÍDICA<br />

Varia bastante o enfoque dado pelos autores à natureza jurídica do tombamento. Para alguns, trata-se <strong>de</strong> servidão<br />

administrativa. 72 Outros sustentam que o bem tombado é um bem <strong>de</strong> interesse público. 73 Defen<strong>de</strong>-se também a natureza <strong>de</strong><br />

limitação administrativa. 74<br />

Não concordamos com a posição segundo a qual se trata <strong>de</strong> servidão administrativa. Por mais <strong>de</strong> uma razão. Primeiramente,<br />

o tombamento não é um direito real, como o é a servidão; <strong>de</strong>pois, inexistem as figuras do dominante e do serviente, intrínsecas à<br />

servidão administrativa. De outro lado, classificar o tombamento como bem <strong>de</strong> interesse público nos parece uma i<strong>de</strong>ia vaga, que<br />

não chega a caracterizar esse tipo <strong>de</strong> intervenção. Limitação administrativa também é natureza ina<strong>de</strong>quada: enquanto a limitação<br />

se reveste <strong>de</strong> caráter geral, o tombamento tem caráter específico, ou seja, inci<strong>de</strong> apenas sobre <strong>de</strong>termina<strong>dos</strong> bens, discrimina<strong>dos</strong>

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