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_Manual de Direito Administrativo_(2017)_Jose dos Santos Carvalho Filho

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ecorrer, ou se renunciou ao recurso, esse fato também torna operante a vonta<strong>de</strong> administrativa e possibilita o recurso à esfera<br />

judicial. Com isso, é possível concluir que o recurso ao Judiciário sempre será possível quando haja efetiva lesão ou ameaça <strong>de</strong><br />

lesão ao direito do indivíduo.<br />

Desse modo, se se enten<strong>de</strong>r a exaustão da via administrativa da forma como <strong>de</strong>monstramos, po<strong>de</strong>mos respon<strong>de</strong>r<br />

positivamente à indagação acima: antes da ação judicial é preciso que se tenha exaurido a via administrativa, no sentido <strong>de</strong> que<br />

não po<strong>de</strong> o interessado prosseguir o seu percurso e que, por isso mesmo, a vonta<strong>de</strong> administrativa se torna operante.<br />

A se enten<strong>de</strong>r, porém, exaustão como o percurso efetivo por to<strong>dos</strong> os patamares recursais da Administração, a resposta à<br />

indagação será evi<strong>de</strong>ntemente negativa: não é obrigatório usar todas as instâncias administrativas para recorrer ao Judiciário,<br />

porque basta que o ato administrativo seja eficaz e operante.<br />

A Constituição, porém, abriu uma fenda no sistema, e exatamente porque o fez averbou-a em termos expressos. Dispõe o<br />

art. 217, § 1 o , da CF: “O Po<strong>de</strong>r Judiciário só admitirá ações relativas à disciplina e às competições <strong>de</strong>sportivas após esgotaremse<br />

as instâncias da justiça <strong>de</strong>sportiva, regulada em lei”. 59<br />

Aqui a leitura do texto indica realmente que o Constituinte preten<strong>de</strong>u criar uma nova e específica condição <strong>de</strong> ação – a <strong>de</strong><br />

ter-se efetivamente percorrido todas as instâncias administrativas. Em outras palavras: quando se tratar <strong>de</strong> ação judicial relativa à<br />

disciplina ou a competições <strong>de</strong>sportivas, o autor precisará provar, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> logo, que utilizou to<strong>dos</strong> os patamares <strong>de</strong>cisórios da via<br />

administrativa. A hipótese em foco, porém, tem caráter excepcional e não se esten<strong>de</strong> aos <strong>de</strong>mais casos em que o interessado<br />

utiliza a via administrativa.<br />

A Lei n o 11.417, <strong>de</strong> 19.12.2006, que regulamentou o art. 103-A da CF, dispondo sobre o regime <strong>de</strong> súmulas vinculantes,<br />

estabeleceu que contra ato da administração pública “o uso da reclamação só será admitido após o esgotamento das vias<br />

administrativas” (art. 7 o , § 1 o ). A reclamação visa a anular atos administrativos que contrariam enunciado <strong>de</strong> súmula vinculante,<br />

ou lhe negam vigência, ou o aplicam in<strong>de</strong>vidamente, sendo cabível ainda contra omissões (art. 7 o , caput e § 1 o ). Em virtu<strong>de</strong> da<br />

natureza específica <strong>de</strong> semelhante instrumento, parece-nos que a exigência nesse caso é realmente a <strong>de</strong> serem percorridas todas<br />

as instâncias do órgão ou da pessoa administrativa. E assim pensamos por mais <strong>de</strong> uma razão: a uma, porque a medida tem<br />

caráter excepcional <strong>de</strong>ntro do sistema <strong>de</strong> impugnações; a duas, porque se permite que o STF aprecie a legalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ato também<br />

em confronto com interpretação errônea feita pelo administrador (aplicação in<strong>de</strong>vida do enunciado); e a três, porque, prevendo a<br />

lei a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> atacar-se a omissão administrativa, não teria lógica que o interessado se dirigisse <strong>de</strong> plano à mais alta<br />

Corte, sem submeter a situação omissiva a órgãos ou agentes <strong>de</strong> hierarquia superior à daquele responsável pela omissão. Em<br />

suma, o STF só <strong>de</strong>cidirá a reclamação após estar indiscutivelmente <strong>de</strong>finida a conduta comissiva ou omissiva da Administração.<br />

Não custa advertir, todavia, que a questão concernente ao esgotamento da via administrativa não se confun<strong>de</strong> com o<br />

interesse <strong>de</strong> agir, que espelha uma das condições da ação. Se o administrado propõe ação contra a Administração, é <strong>de</strong> presumirse<br />

que tenha formulado requerimento na via administrativa e que este tenha sido in<strong>de</strong>ferido. O ato <strong>de</strong> in<strong>de</strong>ferimento traduz o<br />

interesse <strong>de</strong> agir do administrado, objetivando a correção do ato. Mas, se postula diretamente no Judiciário, faltar-lhe-á interesse<br />

para a pretensão, ensejando a extinção do processo sem resolução do mérito. A propositura direta da ação só é cabível quando a<br />

posição do órgão administrativo é notória e costumeiramente contrária à pretensão; nesse caso, dispensável será o requerimento<br />

administrativo. 60<br />

5.<br />

COISA JULGADA ADMINISTRATIVA<br />

O instituto da coisa julgada é estudado na teoria geral do processo, indicando uma <strong>de</strong>cisão judicial que não mais po<strong>de</strong> ser<br />

alterada. Nas palavras <strong>de</strong> FREDERICO MARQUES, “é a imutabilida<strong>de</strong> que adquire a prestação jurisdicional do Estado,<br />

quando entregue <strong>de</strong>finitivamente”. 61<br />

No <strong>Direito</strong> <strong>Administrativo</strong>, a doutrina tem feito referência à coisa julgada administrativa, tomando por empréstimo o<br />

instituto em virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong> alguns fatores <strong>de</strong> semelhança. Mas a semelhança está longe <strong>de</strong> significar a igualda<strong>de</strong> entre essas figuras.<br />

Primeiramente, é preciso levar em conta que a verda<strong>de</strong>ira coisa julgada é própria da função jurisdicional do Estado, função essa<br />

que tem o objetivo <strong>de</strong> autorizar que o juiz aplique a lei no caso concreto.<br />

Ocorre que o sistema brasileiro <strong>de</strong> controle, como veremos mais <strong>de</strong>talhadamente adiante, só admite o exercício da função<br />

jurisdicional para os órgãos do Judiciário, ou excepcionalmente para o Legislativo, neste caso quando a Constituição o autoriza.<br />

A Administração Pública não exerce a função jurisdicional. Desse modo, embora possam ser semelhantes <strong>de</strong>cisões proferidas no<br />

Judiciário e na Administração, elas não se confun<strong>de</strong>m: enquanto as <strong>de</strong>cisões judiciais po<strong>de</strong>m vir a qualificar-se com o caráter da<br />

<strong>de</strong>finitivida<strong>de</strong> absoluta, as <strong>de</strong>cisões administrativas sempre estarão <strong>de</strong>sprovidas <strong>de</strong>sse aspecto. A <strong>de</strong>finitivida<strong>de</strong> da função<br />

jurisdicional é absoluta, porque nenhum outro recurso existe para <strong>de</strong>sfazê-la; a <strong>de</strong>finitivida<strong>de</strong> da <strong>de</strong>cisão administrativa, quando<br />

ocorre, é relativa, porque po<strong>de</strong> muito bem ser <strong>de</strong>sfeita e reformada por <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong> outra esfera <strong>de</strong> Po<strong>de</strong>r – a judicial.

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