17.04.2013 Views

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

1028 Padre Mateus Ribeiro<br />

Caminhei com tal veloci<strong>da</strong>de por sair <strong>do</strong> senhorio de Bolonha, aonde o<br />

perigo de poder ser preso era tão provável, desvian<strong>do</strong>-me sempre <strong>da</strong>s estra<strong>da</strong>s<br />

segui<strong>da</strong>s por diferentes rodeios e atalhos que eu bem sabia (que foi sempre o<br />

temor o mais destro a<strong>da</strong>il para investigar novos caminhos), que quan<strong>do</strong> a<br />

primeira luz <strong>da</strong> manhã rompeu o cordão <strong>da</strong>s trevas em que a noite se defendia<br />

<strong>do</strong>s radiantes assaltos <strong>do</strong> dia, já eu divisava os altos muros e baluartes <strong>do</strong><br />

soberbo castelo <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de de Imola, com quem Bolonha divide a jurisdição e<br />

parte o senhorio. Alegre em me considerar tão vizinho a lugar seguro em que<br />

pudessem ter férias meus receios <strong>do</strong>s sobressaltos que passa<strong>do</strong> tinha e<br />

respirar <strong>do</strong> apressa<strong>do</strong> caminho que levava, caminhei para a ci<strong>da</strong>de, na qual<br />

tinha um particular amigo que se chamava Bonifácio, morga<strong>do</strong> de bastante<br />

ren<strong>da</strong>, mancebo de muitas pren<strong>da</strong>s, que vivia em companhia de Hortênsia, sua<br />

mãe viúva, e era <strong>da</strong>s ilustres famílias <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de de Imola e bem quisto pelo<br />

muito cortês que para com to<strong>do</strong>s se mostrava, sen<strong>do</strong> a cortesia urbana<br />

emprego que sem risco no agra<strong>do</strong> universal rende muito. Daqui veio a dizer<br />

Cícero 1110 que era uma ci<strong>da</strong>de campo aberto para adquirir o louvor de seus<br />

patrícios, quem sabe conhecer a benevolência e cortesia de tratá-los.<br />

Era Bonifácio, digo, de to<strong>do</strong>s estima<strong>do</strong> porque sabia discretamente fazer<br />

estimação de to<strong>do</strong>s e a to<strong>do</strong>s favorecia no que seu valimento alcançava,<br />

segun<strong>do</strong> o parecer sentencioso de Séneca 1111 , que para uma pessoa viver bem<br />

para si, é necessário viver também para os outros, <strong>do</strong>nde veio a dizer<br />

Cícero 1112 que o melhor assunto <strong>da</strong> fortuna era o poder auxiliar e favorecer aos<br />

outros. Tal era Bonifácio, que em Bolonha tinha estu<strong>da</strong><strong>do</strong> alguns anos, aonde<br />

eu o conheci e tratei. Festejou minha vin<strong>da</strong>, referi-lhe os trágicos anúncios <strong>da</strong><br />

causa de meu retiro e total deixação de meus estu<strong>do</strong>s, e ele se mostrou em<br />

parte pesaroso de me ver desterra<strong>do</strong> e em parte alegre de ver-me em<br />

liber<strong>da</strong>de, que não era limita<strong>da</strong> ventura o livrar-me de ser preso, ten<strong>do</strong><br />

contrários tão poderosos e a justiça tão rui<strong>do</strong>sa com tropas a buscar-me.<br />

- Porém, Lisar<strong>do</strong> amigo (prosseguiu ele), to<strong>da</strong>s vossas moléstias são<br />

mui entrínsecas, se se comparam com as interiores que eu padeço; e porque<br />

1110 Cicer., Phil. 4.<br />

1111 Senec, Epist. 43.<br />

1112 Cicer., Pro Marc.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!