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o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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684 Padre Mateus Ribeiro<br />

eterniza<strong>da</strong> dura. Digo isto, senhores, porque à primeira vista, quem não julgaria<br />

ser esta proposta de Salviano o arbítrio mais feliz que pudera <strong>da</strong>r-se-nos?<br />

Porém eu, que vi a meu pai suspenso na indeterminação <strong>da</strong> resposta, fazen<strong>do</strong><br />

a Salviano a cortesia devi<strong>da</strong>, e pedin<strong>do</strong> a meu pai licença para responder-lhe,<br />

lhe disse:<br />

- É, senhor Salviano, tão subi<strong>do</strong> o favor que intentais fazer-nos que de<br />

sua própria grandeza nasce em meu pai o espanto para acertar a responder-<br />

vos. Conheço o muito que valeis por vossa pessoa, riqueza e fi<strong>da</strong>lguia, e o<br />

pouco que condiz com o nosso esta<strong>do</strong> este tão desigual casamento. Uma <strong>da</strong>s<br />

sentenças que deu o sábio Cleobulo, referi<strong>do</strong> por Diógenes, era que nos<br />

casamentos houvesse to<strong>da</strong> a igual<strong>da</strong>de; porque sen<strong>do</strong> a esposa muito inferior,<br />

não parecesse escrava de seu mari<strong>do</strong>. Bem disse Homero que não havia<br />

cousa mais suave que a concórdia <strong>do</strong> tálamo nupcial; e haven<strong>do</strong> neste tanta<br />

desigual<strong>da</strong>de, não me persua<strong>do</strong> que possa haver concórdia. Esposa sem <strong>do</strong>te,<br />

disse Euripides, não tem liber<strong>da</strong>de para falar; e se só por lhe faltar o <strong>do</strong>te a<br />

julgava o poeta por mu<strong>da</strong>, que será faltan<strong>do</strong>-lhe o <strong>do</strong>te e a quali<strong>da</strong>de? Ficará<br />

quasi parecen<strong>do</strong> cria<strong>da</strong> que serve e não senhora que igualmente man<strong>da</strong>. No<br />

presente esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> vai pouco a pessoa e muito a riqueza. Minha irmã é<br />

pobre; vós, senhor Salviano, sois morga<strong>do</strong> e rico; ela humilde e vós ilustre;<br />

nossos parentes poucos e desvali<strong>do</strong>s, os vossos muitos e poderosos; e de<br />

to<strong>do</strong>s ficaremos odia<strong>do</strong>s e persegui<strong>do</strong>s. Nos princípios, disse Demóstenes, se<br />

hão-de evitar as origens aos <strong>da</strong>nos; porque depois de criarem raízes, será<br />

pouco o remédio e a ruína muita. Nós, com a limitação de nosso pouco<br />

cabe<strong>da</strong>l, vivemos em paz, não sen<strong>do</strong> aborreci<strong>do</strong>s; porque não somos<br />

inveja<strong>do</strong>s, não tememos sermos ofendi<strong>do</strong>s, porque a ninguém ofendemos. E<br />

nem seria prudência granjear os perigos, poden<strong>do</strong> evitar as moléstias. A vós,<br />

senhor Salviano, não faltará esposa digna de merecer-vos, e a minha irmã,<br />

quan<strong>do</strong> mude de esta<strong>do</strong>, esposo igual à nossa esfera.<br />

Esta foi a resposta que eu dei, em que meu pai concor<strong>do</strong>u como mais<br />

segura. Ouviu-nos Salviano assusta<strong>do</strong> e replicou uma e outra vez, dissolven<strong>do</strong><br />

as dificul<strong>da</strong>des que lhe púnhamos quanto facilitá-las podia; mas ven<strong>do</strong> que<br />

meu pai perseverava em o primeiro parecer, com os olhos banha<strong>do</strong>s em<br />

lágrimas, rompeu nestas palavras:

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