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o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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Alívio de tristes e consolação de queixosos- Parte II 237<br />

Nápoles a <strong>da</strong>r conta ao vice-rei de sua queixa, la pelo caminho, nas<br />

intercadências que permitia a <strong>do</strong>r ao juízo, forman<strong>do</strong> tais discursos:<br />

- Que este roubo de Lucin<strong>da</strong> fosse de piratas, meus olhos o viram; mas<br />

que só a ela levassem sem tocar nas jóias e fazen<strong>da</strong> de minha casa, nem me<br />

levarem a mim e a sua mãe cativa, sequer para aumentar o preço de seu<br />

resgate, em que juízo cabe? Aonde jamais se viram cossários que, poden<strong>do</strong><br />

enriquecer com o assalto, fossem tão comedi<strong>do</strong>s na execução? E se disser que<br />

o lanço foi de quem a Lucin<strong>da</strong> amava, como podia um mouro amar o que visto<br />

não tinha? E quan<strong>do</strong> concedera que a amasse pela fama só <strong>da</strong> fermosura de<br />

que a enriqueceu a natureza para ser tão pouco venturosa, como os outros<br />

mouros satisfizeram com a ventura de um só sua natural cobiça? Não tocar nas<br />

riquezas quem só se move a piratear por interesses, arriscar-se a perder a vi<strong>da</strong><br />

nos assaltos e, sen<strong>do</strong> gentes bárbaras, rejeitar tão liberal os logros <strong>da</strong> cobiça,<br />

quan<strong>do</strong> tanto a seu salvo puderam aproveitar-se, é segre<strong>do</strong> que não decifra<br />

qualquer juízo. Contentar-se com a presa de uma moça tanta diversi<strong>da</strong>de de<br />

pareceres e tanta varie<strong>da</strong>de de vontades, mais tem de fun<strong>do</strong> para son<strong>da</strong>r-se <strong>do</strong><br />

que de clareza para entender-se. Além disto, como estan<strong>do</strong> sete galés reais no<br />

porto de Nápoles teve ousadia uma lancha de mouros para em tão pouca<br />

distância delas lançar gente em terra? Em que se confiou a temeri<strong>da</strong>de destes<br />

inimigos? Ou quem lhes assegurou a felici<strong>da</strong>de <strong>do</strong> retiro? Mas tu<strong>do</strong> lhes<br />

sucedeu como queriam porque era eu só o agrava<strong>do</strong>. Oh! malogra<strong>da</strong> Lucin<strong>da</strong>,<br />

em que vieram a parar teus merecimentos e minhas alegrias? Perdi-te na flor<br />

<strong>da</strong> vi<strong>da</strong>, na lisonja de teus anos, no tempo em que me considerava mais feliz,<br />

quan<strong>do</strong> eras o lume de nossos olhos, para deixares sem luz nossa vista.<br />

Assim vacilan<strong>do</strong> entre lágrimas e discursos entrou meu pai em Nápoles,<br />

<strong>da</strong>n<strong>do</strong> conta ao vice-rei desta desgraça com as circunstâncias dela e, antes<br />

que o vice-rei se deliberasse no remédio que lhe <strong>da</strong>ria, lhe entrou um sol<strong>da</strong><strong>do</strong><br />

dizen<strong>do</strong> que a galé <strong>do</strong> capitão Juliano faltava <strong>da</strong> barra aonde estava ancora<strong>da</strong><br />

e que uma barca que entrara de pesca<strong>do</strong>res dera vista dela, que ia navegan<strong>do</strong><br />

na volta de Berbéria. Aqui ficou de to<strong>do</strong> assusta<strong>do</strong> o vice-rei e meu pai,<br />

recolhen<strong>do</strong> as implica<strong>da</strong>s redes de seus discursos com a nova presente, lhe<br />

disse assim:<br />

- Excelentíssimo senhor, declara<strong>do</strong> vejo já o escuro enigma em que<br />

tanto tem vacila<strong>do</strong> meu juízo. O capitão Juliano man<strong>do</strong>u roubar minha filha

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