17.04.2013 Views

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Alívio de tristes e consolação de queixosos - Parte VI 959<br />

- Como é possível (dizia eu), atrevi<strong>do</strong> Lisar<strong>do</strong>, que com asas tão<br />

pequenas intentes remontar o voo de teus pensamentos ao mais eleva<strong>do</strong><br />

Olimpo? Pretendes ser colono <strong>da</strong> esfera mais sublime? Avizinhar-te a seres<br />

registro <strong>do</strong> sol quan<strong>do</strong> mais brilhante nos resplan<strong>do</strong>res se mostra? Queres ser<br />

temerário investiga<strong>do</strong>r <strong>do</strong>s cristalinos raios <strong>da</strong>s estrelas? E o que só concede<br />

às águias mais altivas, que tem o globo <strong>do</strong> sol por alvo de seus olhos, queres<br />

tu imitar tão falto de asas?<br />

Como pretendes o casamento de Fenisa, que <strong>do</strong> filho de um príncipe<br />

soberano tão pouca estimação fez <strong>do</strong> casamento? Como quem a Raimun<strong>do</strong><br />

ofereci<strong>do</strong> para ser seu esposo nunca franqueou a vista, nem lhe deve o menor<br />

cui<strong>da</strong><strong>do</strong>, nem lhe permitiu a lisonja de uma esperança, pagan<strong>do</strong>-lhe com os<br />

agros de um desengano os obséquios <strong>da</strong>s maiores finezas, confias tu abrir<br />

brecha em seu coração? Esperas render uma vontade tão idiota em amar que<br />

nunca tomou postila de querer? Como há-de sentir tuas penas a que parece<br />

insensível no penar? Não consideras que a neve <strong>do</strong> rosto se comunicou ao<br />

peito para ficar sen<strong>do</strong> to<strong>da</strong> neve? Que esperas de uma condição tão cruel que<br />

de na<strong>da</strong> se demove, fazen<strong>do</strong>-se desentendi<strong>da</strong> ao mal, por não lhe aplicar o<br />

remédio a quem padece? Se são as esperanças os espíritos vitais de que se<br />

alimenta o amor, cortan<strong>do</strong> em flor to<strong>da</strong>s as esperanças, corta a vi<strong>da</strong> no berço a<br />

to<strong>do</strong> o amor.<br />

E pon<strong>do</strong> à parte tantos impossíveis, que consideras que pretendes sem<br />

declarar-te? Queres que ela adivinhe teus cui<strong>da</strong><strong>do</strong>s? Se aos que vê manifestos<br />

faz que os não conhece, como aos ocultos se mostrará conheci<strong>da</strong>? Este<br />

cui<strong>da</strong><strong>do</strong> sepulta<strong>do</strong> em meu peito para conhecer-se é morto e para atormentar-<br />

me vivo. Como pode obrigar quem às escuras serve? Que remédio espera<br />

quem não publica a <strong>do</strong>r? Como pode pagar quem a dívi<strong>da</strong> ignora? Com os<br />

receios <strong>do</strong> perigo, parecem abortivos mil generosos intentos; pois eu me<br />

resolvo a fazer prova <strong>da</strong> ventura, antes que queixar-me de infelice <strong>do</strong> que<br />

morrer de cobarde. Sen<strong>do</strong> os cometas quan<strong>do</strong> aparecem fogosos sustos <strong>do</strong><br />

mun<strong>do</strong>, ameaços prodigiosos <strong>do</strong> céu e assombrosos espantos <strong>da</strong> terra, nem a<br />

to<strong>da</strong>s as ci<strong>da</strong>des igualmente atemorizam, porque nem to<strong>do</strong>s os reinos e<br />

ci<strong>da</strong>des o mesmo rigor experimentam. Que to<strong>do</strong>s experimentem de Fenisa a<br />

ingratidão e eu dela não faça prova, é manifesta cobardia. Se sair com vitória<br />

minha ousadia, terei mais de que poder gloriar-me; e quan<strong>do</strong> experimente a

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!