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o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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190 Padre Mateus Ribeiro<br />

lhe rompeu o impedimento <strong>da</strong> voz para pedir-lhe a vi<strong>da</strong>. Da sem-razão se<br />

manifestou a força em Egles, famoso luta<strong>do</strong>r de Samo, que, negan<strong>do</strong>-se-lhe<br />

em uma luta a coroa e prémio que ganha<strong>do</strong> justamente tinha, o sentimento<br />

grande <strong>da</strong> injustiça e sem-razão que com ele usavam lhe facilitou a voz para<br />

queixar-se, sen<strong>do</strong> de nacimento mu<strong>do</strong>, como refere Valério Máximo. Se pois<br />

sem-razões e amor rompem o silêncio aos próprios mu<strong>do</strong>s, não era maravilha<br />

que, suposto que a admiração <strong>do</strong>s ecos <strong>da</strong> voz de Lisar<strong>da</strong> em tal esta<strong>do</strong> me<br />

emudecesse, a força <strong>do</strong> amor e sem-razão que igualmente via rompesse o<br />

silêncio para queixar-me. Assim rebentan<strong>do</strong> em meu peito o coração de pena,<br />

turban<strong>do</strong>-me a cólera, não sei se em parte a voz, se o movimento,<br />

atravessan<strong>do</strong> o caminho a minha fugitiva ingrata, arrancan<strong>do</strong> a espa<strong>da</strong> disse<br />

desta sorte:<br />

- Aonde, desconheci<strong>da</strong> Lisar<strong>da</strong>, te leva esse inimigo de meu descanso?<br />

Que afeição te obriga, que paixão te incita, que amor te move a com tanto<br />

discrédito de tua fama, dispêndio de tua honra e dislustre de teu sangue,<br />

seguires a quem porventura te engana, fugin<strong>do</strong> a quem melhor te merece?<br />

Desmaiou Lisar<strong>da</strong> com o sobressalto e caiu desanima<strong>da</strong> em terra. Viu-se Dom<br />

Sancho suspenso, que um não imagina<strong>do</strong> sucesso não deixa de to<strong>do</strong> o<br />

discurso livre para repentinamente deliberar-se: querer encobrir-se não era<br />

possível, manifestar-se em tal ocasião, arrisca<strong>do</strong>; importava-lhe defender-se de<br />

mim, que o acometia, desamparar a Lisar<strong>da</strong> lhe parecia rigoroso. A que<br />

inconvenientes se aventura um desejo? E quantas vezes discursos mal<br />

afortuna<strong>do</strong>s aprovam resoluções temerárias que o tempo e a fortuna<br />

disfavorecem? Enfim, de tantos perigos o menor escolhen<strong>do</strong>, se descobriu e<br />

me disse lhe aju<strong>da</strong>sse a socorrer Lisar<strong>da</strong> naquele paracismo, e que logo me<br />

diria a causa desta saí<strong>da</strong>, com que porventura teria mais razão de<br />

corresponder-lhe agradeci<strong>do</strong>, que mostrar-me sem razão antes de ouvi-lo<br />

agrava<strong>do</strong>. Suspendi com estas palavras o furor, que uma resposta bran<strong>da</strong> e<br />

primorosa é freio <strong>da</strong> ira, por ser a afabili<strong>da</strong>de e cortesia her<strong>da</strong>de que sem custo<br />

nem dispêndio rende muito. E como a quem muito deseja uma cousa é fácil de<br />

persuadir possíveis to<strong>do</strong>s os meios de consegui-la, o dizer-me Dom Sancho<br />

que tinha que agradecer-lhe neste que à primeira vista avaliava engano, me<br />

deu novas esperanças de poder conseguir algum fim venturoso. Acudimos a<br />

Lisar<strong>da</strong> que desmaia<strong>da</strong> estava e tornan<strong>do</strong> em seu acor<strong>do</strong> nos pediu

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