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o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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Alívio de tristes e consolação de queixosos - Parte IV 657<br />

resgate que de ti espero, mas porque estou bem informa<strong>da</strong> <strong>do</strong> muito que<br />

mereces, e para que conheças que tens pie<strong>do</strong>sa senhora, que não é em um<br />

cativo tão pouca ventura achar a pie<strong>da</strong>de aonde reconhece o senhorio. Os<br />

ânimos ilustres não desanimam com os assaltos <strong>da</strong> fortuna, nem abatem o<br />

generoso aos combates <strong>da</strong>s adversi<strong>da</strong>des. Não pela primeira tormenta se<br />

deixam as navegações; pois sen<strong>do</strong> as tempestades certas, ninguém aos golfos<br />

<strong>do</strong> mar se arriscara. Às borrascas se seguem as bonanças, ao perigo o<br />

descanso, à moléstia o sossego e à batalha a vitória. Quanto mais se dilata teu<br />

cativeiro, tanto será de maior estimação a liber<strong>da</strong>de, que a ser abrevia<strong>da</strong> a<br />

duração <strong>do</strong> que perdes, seria de menos valor a restauração quan<strong>do</strong> a cobrares.<br />

Se se pusessem em balança os desgostos que padeces com as alegrias que<br />

na liber<strong>da</strong>de possuir esperas, porventura que estas pesariam mais e as outras<br />

molestariam menos. Algum dia farás lisonja desta lembrança; pois assim como<br />

o ouro que se tira <strong>da</strong> mina mais profun<strong>da</strong> é nos quilates o mais subi<strong>do</strong>, assim a<br />

alegria que nasce <strong>da</strong> maior pena é a delícia para o coração de maior estima.<br />

Assim falou Zelin<strong>da</strong>, <strong>da</strong>n<strong>do</strong> uns longes de amorosa entre as<br />

demonstrações de compassiva, uns assomos de poder parecer afeiçoa<strong>da</strong><br />

rebuça<strong>do</strong>s com matizes de pie<strong>do</strong>sa. Bem mostravam as pren<strong>da</strong>s de seu juízo<br />

competirem parelhas com sua fermosura. Depois de eu com humilde inclinação<br />

de escravo lhe render as graças <strong>do</strong> grande favor que me fazia, quasi<br />

perturba<strong>do</strong> deste primeiro assalto <strong>da</strong> ventura, tanto mais poderoso para<br />

perturbar as eloquências, quanto menos espera<strong>do</strong>, nem <strong>do</strong> desejo presumi<strong>do</strong>,<br />

lhe respondi:<br />

- Não nasce, discreta e pie<strong>do</strong>sa senhora, a tristeza que em mim<br />

conheces de me ver priva<strong>do</strong> <strong>da</strong> liber<strong>da</strong>de no cativeiro em que assisto, que<br />

parecera ingrato à ventura de te ter por senhora, quan<strong>do</strong> formara queixas de<br />

me ver escravo. Quem a seus cativos tão pie<strong>do</strong>samente trata, duas vezes os<br />

prende: uma pela compra e outra pelo tratamento que experimento, sen<strong>do</strong><br />

<strong>do</strong>bra<strong>da</strong>s as cadeias com que me vejo cativo, uma <strong>da</strong> fortuna, outra <strong>da</strong><br />

cortesia; fico-te deven<strong>do</strong> mais, quan<strong>do</strong> à fortuna devo menos. A causa que<br />

pode fazer-me parecer a teus fermosos olhos triste é o não ter novas de meus<br />

pais, haven<strong>do</strong>-lhes por diversas vezes escrito sobre meu resgate, e a falta de<br />

resposta sua me faz recear possam ser mortos. Porque fio eu tanto de seu<br />

amor que enten<strong>do</strong> era impossível o não me haverem respondi<strong>do</strong> sen<strong>do</strong> vivos.

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