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o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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652 Padre Mateus Ribeiro<br />

mo<strong>do</strong> de saber obrigar o mostrar-se participante nas alegrias quem podia<br />

presumir-se justamente ofendi<strong>do</strong> nos pesares. Como os casamentos e as<br />

mortes franqueiam as portas para poderem desterrar-se os ódios e reconciliar-<br />

se as vontades até este tempo desuni<strong>da</strong>s, é acerto <strong>da</strong> discrição saber valer-se<br />

<strong>do</strong> tempo, quan<strong>do</strong> este oferece a ocasião.<br />

Esperava eu na prisão o termo em que haviam de parar meus<br />

sentimentos, quan<strong>do</strong>, um dia antes <strong>do</strong> recebimento de Aurora, veio à prisão o<br />

auditor a soltar-me, mas com que primeiro assinasse um termo de que, sob<br />

gravíssimas penas, não entraria em Bolonha, nem em to<strong>do</strong> o distrito de sua<br />

jurisdição. Bem pudera eu reparar no rigor, mas o desejo que tinha de me ver<br />

fora de Bolonha, por não ser violenta<strong>da</strong> testemunha <strong>da</strong>s bo<strong>da</strong>s de Aurora, não<br />

permitiu replicar, senão obedecer. Este desterro em Octávio foi cautela de<br />

estadista, no auditor prevenção de prudente e em mim obediência,<br />

aborrecen<strong>do</strong> a ci<strong>da</strong>de onde fui tão pouco venturoso. Saí <strong>da</strong> prisão, e o meu<br />

cria<strong>do</strong>, quan<strong>do</strong> o sol retirava a retaguar<strong>da</strong> luzi<strong>da</strong> de seus raios. Despedi-me de<br />

Anacleto, que ficou bem sau<strong>do</strong>so de minha companhia. E sem querer demorar<br />

em Bolonha nem um instante, montei a cavalo e me parti desta para mim<br />

ci<strong>da</strong>de odiosa, para mais não vê-la; não tanto pelo termo que assinei, quanto<br />

pelo sentimento e pelos desaires <strong>da</strong> ventura que nela experimenta<strong>do</strong> havia.<br />

Caminhei com esta pena o mais <strong>da</strong> jorna<strong>da</strong>, até que avistei os muros de minha<br />

pátria, iminente aos dilata<strong>do</strong>s mares de seu golfo no mun<strong>do</strong> tão conheci<strong>do</strong>.<br />

Cheguei a casa de meus pais, de quem fui com grandes demonstrações de<br />

amor recebi<strong>do</strong>, e ain<strong>da</strong> meu irmão me recebeu alegre, efeitos <strong>da</strong> ausência, que<br />

talvez obra com o primeiro alvoroço, o que não obriga a repeti<strong>da</strong> assistência.<br />

Referi a história <strong>do</strong> que me havia sucedi<strong>do</strong>, de que se admiraram meus pais,<br />

choran<strong>do</strong> compassivos <strong>do</strong>s riscos em que me vira, que corriam por conta de<br />

seus corações para senti-los. Fui visita<strong>do</strong> <strong>do</strong>s parentes e amigos, que com<br />

seus divertimentos, no agradável <strong>da</strong> pátria, se foram riscan<strong>do</strong> <strong>da</strong> memória as<br />

lembranças de Aurora, de tal sorte que, se me lembrava, já sua memória me<br />

não desvelava, nem <strong>do</strong> sossego que gozava me divertia.<br />

Dous anos seriam já passa<strong>do</strong>s que no pátrio <strong>do</strong>micílio e casa de meus<br />

pais vivia descui<strong>da</strong><strong>do</strong> nem de continuar estu<strong>do</strong>s, nem de seguir as armas,<br />

porque minha mãe, como tão amante, o impedia. Estava o coração de minha<br />

mãe tão lastima<strong>do</strong> só com a relação <strong>do</strong>s perigos e desgostos referi<strong>do</strong>s que não

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