17.04.2013 Views

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Alívio de tristes e consolação de queixosos - Parte IV 645<br />

que tarde. E nisto espirou. Se Dom Rodrigo não socorrera tão apressa<strong>da</strong>mente<br />

a Aurora, ou ela ficaria morta, ou sua honrosa resistência <strong>da</strong> insolência de<br />

António violenta<strong>da</strong>. Livrou-a <strong>do</strong> maior risco e castigou <strong>do</strong> foragi<strong>do</strong> a temerária<br />

resistência, <strong>da</strong>n<strong>do</strong> castigo ao delito e socorro ao desamparo. Pois que razão<br />

mais generosa podia <strong>da</strong>r-se para ser remunera<strong>da</strong>? Ou que serviço mais digno<br />

de ser justamente agradeci<strong>do</strong>?<br />

Dizeis, senhor Hortênsio, que era Aurora prodígio <strong>da</strong> beleza: hipérboles<br />

serão de amante. Além <strong>do</strong> que as cousas, quan<strong>do</strong> se perdem, sempre se<br />

avaliam maiores na estimação <strong>do</strong> queixoso. Eu conce<strong>do</strong> que Aurora é fermosa,<br />

assim porque vós o dizeis, como porque Bolonha sua beleza aplaude e a fama<br />

seus encómios publica. Porém as exagerações são mais objectos <strong>da</strong> cortesia<br />

<strong>do</strong> que <strong>da</strong> reali<strong>da</strong>de. E se o conseguir tu<strong>do</strong> é impossível, não julgo impossível o<br />

deixar tu<strong>do</strong>. Porque o alcançar necessita <strong>do</strong>s favores <strong>da</strong> ventura e o deixar<br />

procede <strong>da</strong> generosi<strong>da</strong>de <strong>do</strong> coração. Se não conseguistes a Aurora por<br />

esposa, sabei esquecer suas memórias. Que não se mostra o generoso no<br />

muito que logra, mas prova-se no muito que deixa. Discretamente (como refere<br />

Quinto Cúrcio) invejou o grande Alexandre a bizarria <strong>do</strong> ânimo <strong>do</strong> cínico<br />

Diógenes, porque na<strong>da</strong> queria e de na<strong>da</strong> necessitar mostrava, ten<strong>do</strong> por maior<br />

valor desprezar tu<strong>do</strong> <strong>do</strong> que possuí-lo. O piloto sábio e experimenta<strong>do</strong> nas<br />

navegações sabe discretamente acomo<strong>da</strong>r-se a to<strong>do</strong>s os ventos: e assim o<br />

varão prudente há-de acomo<strong>da</strong>r-se a to<strong>da</strong>s as varie<strong>da</strong>des <strong>da</strong> fortuna. Nem<br />

sempre no mar deste mun<strong>do</strong> se pode navegar com vento bonançoso e com<br />

maré de rosas; tal vez há-de haver vento contrário e mar tempestuoso. Pois se<br />

não deve o coração desmaiar pela tormenta, para desanima<strong>do</strong> largar o leme,<br />

antes, valen<strong>do</strong>-se <strong>da</strong> indústria, fazer rosto contra a fortuna. Assim a prudência,<br />

que Cícero 562 intitula ser a cousa mais proveitosa e a mais suave, há-de<br />

mostrar-se em saber acomo<strong>da</strong>r-se aos disfavores <strong>da</strong> ventura, para não<br />

desvanecer-se quan<strong>do</strong> a julgar propícia e quan<strong>do</strong> a considerar adversa para<br />

não desanimar-se.<br />

Para salvar a vi<strong>da</strong> na tormenta, se arroja ao mar liberalmente quantas<br />

riquezas adquiriu a ambição <strong>do</strong> navegante em dilata<strong>do</strong>s anos, fican<strong>do</strong> sen<strong>do</strong><br />

despojos <strong>do</strong> temor os que foram desvelos <strong>do</strong> cui<strong>da</strong><strong>do</strong>. Este que pudera parecer<br />

Cie, Tusc. 1.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!