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o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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746 Padre Mateus Ribeiro<br />

Pois se em na<strong>da</strong> <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> se pode achar firmeza, nem nas digni<strong>da</strong>des<br />

segurança, nem na sabe<strong>do</strong>ria privilégio, nem na fermosura isenção, nem na<br />

riqueza preminência, nem na valentia asilo contra as mu<strong>da</strong>nças <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, a<br />

ro<strong>da</strong> <strong>da</strong> fortuna que não pára o lúbrico movimento que não cessa; parece-me a<br />

mim, senhor, que pouco tempo há mister para se conhecer o desengano de<br />

seus bens e para se manifestar o infausto de seus males.<br />

Cap. II.<br />

Em que o passageiro dá princípio à narração de sua vi<strong>da</strong><br />

Atento ouviu o passageiro as razões de Felisberto, e pareceu-lhe não só<br />

homem de vi<strong>da</strong> penitente e retira<strong>da</strong> <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, como seu hábito mostrava, mas<br />

juntamente pessoa <strong>do</strong>uta e versa<strong>da</strong> na lição <strong>do</strong>s livros e histórias <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>. E<br />

se, como disse Cícero 632 , a sabe<strong>do</strong>ria pudera com os olhos corporais ver se<br />

sem dúvi<strong>da</strong> de to<strong>do</strong>s fora ama<strong>da</strong> e de ninguém aborreci<strong>da</strong>, descobriu logo o<br />

passageiro na prática <strong>do</strong> Ermitão umas palavras tão ajusta<strong>da</strong>s com a vi<strong>da</strong> e<br />

uma vi<strong>da</strong> tão germina<strong>da</strong> com a prática que se resolveu em manifestar-lhe os<br />

dissabores de sua pena, para ver se quan<strong>do</strong> nela não descobrisse remédio, ao<br />

menos pudesse encontrar consolação.<br />

Lembrou-se <strong>da</strong>quele dito de Aristóteles 633 , que a erudição e a sabe<strong>do</strong>ria<br />

para as prosperi<strong>da</strong>des era troféu e para as adversi<strong>da</strong>des era consolação e<br />

refúgio. E suposto que o vivo de sua <strong>do</strong>r e o incessável de sua mágoa queria<br />

que no silêncio ficasse sepulta<strong>do</strong> seu tormento sem epitáfio que a conhecer o<br />

desse, julgou parecer cousa dura fazer tanto a vontade à pena que não só a<br />

sofresse, mas que de to<strong>do</strong> a encobrisse. Terminar a vi<strong>da</strong> de senti<strong>do</strong> será vitória<br />

<strong>da</strong> <strong>do</strong>r; porém deixar de publicar a causa é morrer de sofri<strong>do</strong> sem procurar nem<br />

título na vi<strong>da</strong>, nem fama na morte, como quem na região mais remota de seu<br />

nascimento em solitário deserto fica sem ser conheci<strong>do</strong> sepulta<strong>do</strong>, perden<strong>do</strong>-se<br />

a memória de quem foi. E como a fama e a perpetui<strong>da</strong>de <strong>do</strong> nome é, como diz<br />

Cie, 3. De Fin.<br />

Arist., apud Diog., Lib. 4.

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