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o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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628 Padre Mateus Ribeiro<br />

É a noite (como lhe chamou Santo Agostinho 558 ) oficina de temores,<br />

terrores <strong>do</strong> coração e eclipses <strong>do</strong>s olhos, confusão <strong>do</strong>s discursos, sepulcro <strong>da</strong><br />

beleza, morte <strong>do</strong> luzi<strong>do</strong> e vi<strong>da</strong> <strong>do</strong> tenebroso. Caminhava Aurora com algum<br />

temor pelo solitário <strong>do</strong> lugar, o sombrio <strong>do</strong> monte e o denso <strong>do</strong> arvore<strong>do</strong>, que<br />

poden<strong>do</strong> ser recreativo de dia, tinha muito de suspeitoso na noite. Quisera<br />

parar, com dúvi<strong>da</strong>s de haver erra<strong>do</strong> o caminho; mas temen<strong>do</strong>-se que a<br />

seguissem, não se atrevia a esperar as vizinhanças <strong>do</strong> dia e queria antes<br />

arriscar-se aos assombros <strong>da</strong> noite. Seriam quasi duas horas antes de<br />

amanhecer, quan<strong>do</strong>, desengana<strong>da</strong> de que ia no caminho perdi<strong>da</strong> e <strong>do</strong> cansaço<br />

dele molesta<strong>da</strong>, se assentou com a cria<strong>da</strong>, violentan<strong>do</strong> o desejo, para esperar<br />

que as luzes primeiras <strong>da</strong> manhã lhe abrissem caminho a prosseguir a jorna<strong>da</strong><br />

aonde pretendia.<br />

Neste tempo, viram que descen<strong>do</strong> <strong>do</strong>s penhascosos outeiros <strong>do</strong> monte<br />

que os cercava vinha um homem que apenas entre a confusão <strong>da</strong>s sombras se<br />

divisava. Alegraram-se, com lhes parecer ser algum pastor, a quem com<br />

prémio obrigassem a lhes fazer companhia até ao palácio <strong>do</strong>s Rossis. Porém,<br />

quan<strong>do</strong> ao perto ain<strong>da</strong> entre as equívocas sombras o viram, conheceram que<br />

era um mancebo bem traja<strong>do</strong> e que além <strong>da</strong> espa<strong>da</strong> e a<strong>da</strong>ga que cingia, trazia<br />

na cinta uma pistola, vista de que Aurora ficou confusa em sítio tão solitário e a<br />

tais horas. Contu<strong>do</strong>, fazen<strong>do</strong> <strong>do</strong>s próprios temores alentos e apelan<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />

receio para a cortesia, que em quem a professa é o melhor seguro, depois de<br />

saudá-lo, <strong>da</strong>n<strong>do</strong>-lhe uma breve notícia de como erran<strong>do</strong> o caminho que ao<br />

palácio <strong>do</strong>s Rossis levava, com o escuro <strong>da</strong> noite se perdera, lhe pediu a<br />

quisesse guiar ao caminho de que se desviara, sem lhe <strong>da</strong>r outra alguma<br />

notícia, nem de quem era, nem <strong>da</strong> causa que a levava. Pôs nela cui<strong>da</strong><strong>do</strong>so os<br />

olhos o passageiro, e no brilhante <strong>do</strong>s ricos diamantes que ain<strong>da</strong> entre as<br />

sombras resplandeciam, na riqueza <strong>da</strong> tela que vestia e na beleza <strong>do</strong> rosto que<br />

entre a rara nuvem de um rico volante, que mal o escondia, se mostrava,<br />

entendeu ser mulher de grandes pren<strong>da</strong>s, e dilatan<strong>do</strong> em uma breve<br />

suspensão a resposta, por fim lhe disse assim:<br />

- Que sejais senhora ilustre, vossa presença o descobre, ain<strong>da</strong> que<br />

vossa presença o dissimula; e assim me admiro que a tais horas e em sítio tão<br />

Aug., in Ps. 75.

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