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o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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Alívio de tristes e consolação de queixosos - Parte III 487<br />

repara é no discurso. Nenhuma cousa dizem ser ama<strong>da</strong> sem primeiro ser<br />

conheci<strong>da</strong>; mas a fermosura apenas passa <strong>da</strong> apreensão ao juízo quan<strong>do</strong> logo<br />

dá assaltos à vontade, sem esperar provações <strong>do</strong> discurso. Daqui veio a dizer<br />

Propércio que o amor não se governa pela razão, porque esta pende <strong>do</strong><br />

discurso, o que o amor não admite. Majestade e amor disse Ovídio 474 que não<br />

moravam juntos em um <strong>do</strong>micílio, porque o querer tem pouco de respeitoso e a<br />

majestade se desvela em querer ser respeita<strong>da</strong>; e assim não é maravilha que,<br />

se amava a senhora Flora, não reparasse na desigual<strong>da</strong>de de Reginal<strong>do</strong> para<br />

ausentar-se com ele: que costuma o amor igualar as distâncias que a política<br />

<strong>do</strong> mun<strong>do</strong> diferença tanto.<br />

Nem a humil<strong>da</strong>de <strong>do</strong> nascimento de Reginal<strong>do</strong> impossibilita sua ventura,<br />

que rei de Assíria e Media era Astíages e poden<strong>do</strong> casar a princesa sua filha<br />

com qualquer <strong>do</strong>s reis <strong>do</strong> oriente que ele quisesse, a foi casar com Cambisses,<br />

um desvali<strong>do</strong> e pobre persiano, de quem nasceu o grande Ciro que conquistou<br />

tantas províncias <strong>do</strong> oriente. Humilde e pobre de nascimento era Caio Mário e<br />

<strong>caso</strong>u com Júlia, ilustríssima tia de Júlio César, primeiro empera<strong>do</strong>r de Roma,<br />

alcançan<strong>do</strong> depois pelo valor de sua pessoa o ser sete vezes cônsul. Não<br />

queriam os patrícios, cavaleiros e sena<strong>do</strong>res romanos que nenhum <strong>do</strong> povo<br />

casasse com filhas e parentas suas, mas o tribuno <strong>do</strong> povo Caio Canuleio fez<br />

tanta instância que, sen<strong>do</strong> cônsules de Roma Tito Quíncio e Aulo Fúrio, se<br />

ordenou por lei que a qualquer plebeu fosse lícito poder casar com filhas, irmãs<br />

e parentas <strong>do</strong>s cavaleiros e sena<strong>do</strong>res de Roma, como <strong>da</strong>í em diante casaram.<br />

Pois se a necessi<strong>da</strong>de em que Roma se via com as guerras de tantos<br />

inimigos que ca<strong>da</strong> dia a cercavam fez <strong>da</strong>r consentimento aos patrícios,<br />

cavaleiros e sena<strong>do</strong>res para o povo conseguir uma permissão tão agra para<br />

eles e a que tanta repugnância tinham feito, não seria estranha maravilha que<br />

no termo em que hoje vos vedes permitísseis que a senhora Flora fosse<br />

esposa de Reginal<strong>do</strong>, quan<strong>do</strong> ele pelos merecimentos primeiro se habilitasse<br />

para merecê-la. Porque o intentardes vingança é não advertirdes que muitas<br />

vezes serve esta mais de deslustrar que de satisfazer, pois sempre fica mais<br />

presente a ofensa que o desagravo dela. Há castigos que autorizam a quem os<br />

sofre e vinganças que des<strong>do</strong>uram a quem as toma; e vai mais muitas vezes o<br />

Ovid., Metamorph. 2.

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