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o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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Alívio de tristes e consolação de queixosos - Parte III 443<br />

cego. Talvez <strong>da</strong>va Flora comissão a seus olhos para que falassem, mas logo<br />

decia o rebuço <strong>da</strong> gravi<strong>da</strong>de para que emudecessem: de sorte que quan<strong>do</strong><br />

mais Reginal<strong>do</strong> desejava certificar-se, então mais achava motivos de não<br />

entender-se.<br />

Nesta suspensão e labirinto de cui<strong>da</strong><strong>do</strong>s, sem acertar saí<strong>da</strong> a seus<br />

desvelos passou Reginal<strong>do</strong> alguns meses no serviço <strong>do</strong> conde em que mostrou<br />

tantos méritos, assim no valor de destemi<strong>do</strong>, como nos empenhos de ajuiza<strong>do</strong>,<br />

como quem intentava agra<strong>da</strong>r a quem tanto se afinava no querer, que o conde<br />

e seu filho Carlos nem emprendiam acção de importância sem consultá-lo, nem<br />

no governo de seu esta<strong>do</strong> dispunham resolução alguma sem sua aprovação,<br />

sen<strong>do</strong> Reginal<strong>do</strong> o oráculo de suas vontades, para em tu<strong>do</strong> suas ordens<br />

seguirem.<br />

An<strong>da</strong>n<strong>do</strong> pois um dia à caça o conde, Carlos e juntamente Flora com<br />

seus cria<strong>do</strong>s e monteiros, sucedeu que desuni<strong>do</strong>s com o seguimento <strong>da</strong>s feras<br />

e derrota<strong>do</strong>s por vários sítios entre o espesso <strong>do</strong> arvore<strong>do</strong> que o monte em<br />

várias partes dividia, viesse a encontrar-se Reginal<strong>do</strong> só com Flora no solitário<br />

de um bosque com quem fazia contínuo divórcio o sol pelo sombrio, e ven<strong>do</strong> a<br />

ocasião tão apropria<strong>da</strong> para desenganar-se <strong>da</strong>s dúvi<strong>da</strong>s em que tanto tempo<br />

vivia, lhe disse entre temeroso e atrevi<strong>do</strong> desta sorte:<br />

- Muitos dias há, queri<strong>da</strong> Flora, que an<strong>da</strong>m meus pensamentos<br />

navegan<strong>do</strong> sem saberem para onde me leva a ventura, suspensas minhas<br />

esperanças tão bem nasci<strong>da</strong>s, como malogra<strong>da</strong>s. Das redes de meu pai<br />

aprendeu minha fortuna a ocupar muito e prender pouco, pois cercan<strong>do</strong> tanto<br />

mar, nenhuma água prendem. Entrei em tua casa a servir-te, melhor dissera a<br />

amar-te, pois nos extremos de amar-te se cifram to<strong>do</strong>s os desvelos de servir-te:<br />

que nunca serviu mal quem quis bem, nem soube servir pouco quem ama<br />

muito. Foi meu amor filho de meus pensamentos, não de meu nascimento, e<br />

assim não era muito que tão alto voasse, que costumam os pensamento subir<br />

aonde à humil<strong>da</strong>de <strong>do</strong> nascimento não é possível voar. Mas ai de mim, que<br />

quan<strong>do</strong> cuidei obrigar-te, vejo em o severo com que me tratas indícios de<br />

ofender-te! Se porque nasci humilde te agravas de ser ama<strong>da</strong>, despacho é <strong>da</strong><br />

tirania, pois menos merecera quan<strong>do</strong> te igualara: que a distância, quan<strong>do</strong> é<br />

pouca, com pouco se vence; mas sen<strong>do</strong> tão superior, de venturosas asas

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