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o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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Alívio de tristes e consolação de queixosos - Parte IV 599<br />

- Quan<strong>do</strong> o houvera (respondi eu), nele não reparara, por obedecer ao<br />

desejo dessa senhora; e ficará o meu cria<strong>do</strong> esperan<strong>do</strong> neste lugar, por ir com<br />

mais recato.<br />

- Seja assim (disse ela), e pode vossa mercê seguir-me.<br />

Começou a caminhar, apartan<strong>do</strong>-se algum espaço <strong>da</strong> vizinhança <strong>do</strong> rio.<br />

E haven<strong>do</strong> caminha<strong>do</strong> quasi duas milhas, chegámos a uma quinta sumptuosa<br />

na grandeza <strong>da</strong> casaria e vistosa no copioso <strong>do</strong> arvore<strong>do</strong> que a cercava. Aonde<br />

entran<strong>do</strong> a cria<strong>da</strong> que me serviu de guia a <strong>da</strong>r reca<strong>do</strong> de minha vin<strong>da</strong>, passa<strong>do</strong><br />

um breve intervalo, me fez sinal que subisse. Entrei na primeira quadra, que<br />

bem e custosamente orna<strong>da</strong> estava, na qual me saiu a receber a imagem viva<br />

de minhas quasi já mortas esperanças, o emblema anima<strong>do</strong> a quem tantas<br />

diligências nunca puderam descifrar o senti<strong>do</strong>. Não foi em mim a primeira<br />

admiração pelo belo <strong>do</strong> parecer, porque seu rosto podia ser o crédito mais<br />

abona<strong>do</strong> <strong>da</strong> beleza, nem me admirou o custoso <strong>da</strong> gala e riqueza <strong>do</strong> traje,<br />

porque <strong>do</strong> precioso <strong>do</strong>s trajes era ela a gala e parava o encareci<strong>do</strong> aonde se<br />

principiava o vistoso. Só me pôde assustar tão repentino assalto, consideran<strong>do</strong><br />

em um instante descoberto o que à ânsia de meu desejo tanto tempo esteve<br />

oculto. Assim, depois de com uma profun<strong>da</strong> cortesia me mostrar alegre e<br />

obriga<strong>do</strong> de sua vista, lhe disse assim:<br />

- Bem dizem, senhora, que pode mais uma hora de ventura que muitos<br />

anos de diligências; pois ten<strong>do</strong>-me custa<strong>do</strong> tantas desde que entrei em<br />

Bolonha, o descobrir este tesouro tão a meus olhos escondi<strong>do</strong>, quanto a<br />

minhas esperanças incerto, devo mais a uma hora de descui<strong>do</strong> <strong>do</strong> que a<br />

muitos dias de cui<strong>da</strong><strong>do</strong>so. Logro a vista que mais desejo e ain<strong>da</strong> não afirmei<br />

que a logro, porque avalio tão incertas minhas alegrias que duvi<strong>do</strong> se são suas<br />

glórias aparentes ou ver<strong>da</strong>deiras; com receios <strong>do</strong>s eclipses <strong>da</strong> fugi<strong>da</strong>, não me<br />

asseguro <strong>do</strong>s raios <strong>do</strong> sol na presença. O passar <strong>do</strong> extremo a extremo leva<br />

consigo o risco, porque mal sofrerá a vi<strong>da</strong> passar de repente o coração <strong>do</strong><br />

tormento <strong>do</strong> frio aos incêndios <strong>da</strong> calma, nem a vista <strong>do</strong> mais escuro <strong>da</strong> noite<br />

ao mais brilhante <strong>do</strong>s resplan<strong>do</strong>res <strong>do</strong> sol; e assim de tantos meses de<br />

sombras, quem passa de repente a tantos raios de luz tem o risco ou em<br />

perigar a vista ou em se enganar o desejo, ten<strong>do</strong> os olhos o perigo no<br />

repentino e os desejos o <strong>da</strong>no no duvi<strong>do</strong>so.

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