17.04.2013 Views

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Alívio de tristes e consolação de queixosos - Parte II 241<br />

me arroja<strong>da</strong>, pois me confesso amante; nem te espantes de ver-me atrevi<strong>da</strong>,<br />

pois me publico ofendi<strong>da</strong>, que correm parelhas em meu peito o muito que te<br />

quis e o muito que me ofendes. São os agravos mui pouco cometi<strong>do</strong>s e os<br />

ciúmes em na<strong>da</strong> reporta<strong>do</strong>s, e nece<strong>da</strong>de grande seria que obran<strong>do</strong> tu como<br />

ingrato não obre eu como queixosa. Tem o sofrimento seus limites, enquanto<br />

as ofensas podem tolerar-se; mas quan<strong>do</strong> a <strong>do</strong>r excede à paciência é apurar o<br />

sofri<strong>do</strong>, ocultar em silêncio o magoa<strong>do</strong>. Inquietaste, ingrato amante, o retiro em<br />

que vivia com meus pais a título de pertender-me para esposa; dei crédito a<br />

teus enganos, que como não aprendi a mentir, não pude a falsi<strong>da</strong>de conhecer.<br />

Presumi merecer-te por quem era e assim não era desvanecimento que te<br />

cresse. Não me cegaram tuas riquezas, porque só me paguei de tua pessoa;<br />

não busquei o que possuías, antes só o que eras, e quan<strong>do</strong> tiveras menos,<br />

então te estimara mais; pois fora para mim a maior riqueza conheceres que as<br />

não procuro. Teve meu amor tanto de fio como de desinteressa<strong>do</strong>, que suposto<br />

que me concedeu a fortuna limita<strong>do</strong>s os bens, comunicou-me a natureza<br />

aventeja<strong>do</strong>s os brios. Se foras mui humilde e eu mais poderosa, te levantara <strong>da</strong><br />

maior humil<strong>da</strong>de para subir-te à maior grandeza. Fez tua importunação brecha<br />

em meu peito, rendi-me a parti<strong>do</strong>s de tua esposa, porque então me julgava<br />

vence<strong>do</strong>ra quan<strong>do</strong> rendi<strong>da</strong> com tal título. Fostes fácil em prometer, porque<br />

intentavas não pagar: como se faltasse justiça no céu a quem o prometesse e<br />

vingança na terra a quem enganasse. Intentavas casamento agora com quem<br />

tinha mais para <strong>do</strong>tar-se, não com quem tinha mais valor para merecer-te.<br />

Cegou-te a ambição, sen<strong>do</strong> rico, e a mim não me cegaram tuas riquezas,<br />

sen<strong>do</strong> pobre: dispõe de quanto possuis a teu gosto e verás quanto te quero<br />

mais esposo pobre que amante rico. Amor que de interesses se vence é<br />

moe<strong>da</strong> falsa, tem os cunhos <strong>do</strong> querer e o metal de enganar; jamais na balança<br />

<strong>do</strong> amar pesou na<strong>da</strong> a ambição, porque em balanças <strong>da</strong> alma na<strong>da</strong> avultam os<br />

bens <strong>da</strong> terra.<br />

Agra<strong>do</strong>u-te meu parecer com lisonjas de fermosa; pagaste-te de meu<br />

juízo com adulações de discreta; pois como tão brevemente mu<strong>da</strong>stes de<br />

opinião sem eu mu<strong>da</strong>r-me? Se então me julgavas digna de merecer-te, como<br />

agora e avalias incapaz de alcançar-te? Se me aborreces por querer-te mais,<br />

novo arbítrio é <strong>da</strong> tirania pagarem-se finezas com desprezos. Que viste em<br />

mim que te desagra<strong>da</strong>sse? Por ventura ser fácil em crer-te? Pois <strong>da</strong>í mesmo te

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!