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o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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Alívio de tristes e consolação de queixosos - Parte IV 667<br />

fineza é malogra<strong>da</strong> e para porfia desairosa; e assim me obriga menos, quan<strong>do</strong><br />

se persuade que me serve mais. Julgam-no por entendi<strong>do</strong> e é engano. Porque<br />

nunca um juízo grande intentou fazer violência ao gosto. E devia conhecer que<br />

o que se não concede ao amor, não o alcança a porfia: sen<strong>do</strong> o amor o maior<br />

serviço e a porfia o maior agravo; e assim é nece<strong>da</strong>de presumir que poderá<br />

alcançar ofenden<strong>do</strong>, o que não conseguiu obrigan<strong>do</strong>. Tenho por tão impossível<br />

render-se minha vontade a aceitá-lo por esposo que primeiro se verá o pra<strong>do</strong><br />

matiza<strong>do</strong> de estrelas e o céu esmalta<strong>do</strong> de flores, eterna constância no mar e<br />

contínuo movimento na terra, <strong>do</strong> que ver-me meu pai deste intento mu<strong>da</strong><strong>da</strong>,<br />

nem aos desacertos de sua eleição rendi<strong>da</strong>.<br />

Assim falan<strong>do</strong> e quasi chorosa se despediu Zelin<strong>da</strong>, deixan<strong>do</strong>-me em<br />

um mar de confusões, porque a pretensão de Sultão me <strong>da</strong>va notável pena e a<br />

discreta resolução de Zelin<strong>da</strong> excessiva alegria. Seus olhos mostravam indícios<br />

de querer-me; mas como havia eu de certificar-me, pois para eu declarar-me<br />

temia a ousadia e para calar-me vivia duvi<strong>do</strong>so; e assim nem o temor me <strong>da</strong>va<br />

confiança, nem as dúvi<strong>da</strong>s me concediam quietação. Para amá-la, sentia mil<br />

impossíveis; e para não amá-la, milhares de cui<strong>da</strong><strong>do</strong>s. Se a via era to<strong>do</strong> meu<br />

recreio e se a não via era to<strong>do</strong> o meu desvelo; assim não sei declarar neste<br />

labirinto sem saí<strong>da</strong> em que me via, se amava como quem não esperava ou se<br />

esperava como quem não queria.<br />

Instava neste tempo Sultão Ali com o vali<strong>do</strong>, e ele com Zulema, sobre<br />

este casamento dele tão deseja<strong>do</strong> como de Zelin<strong>da</strong> aborreci<strong>do</strong>. Desculpava-se<br />

Zulema com a condição de Zelin<strong>da</strong>, mas não se lhe admitiam as desculpas;<br />

porque estava Sultão tão senhorea<strong>do</strong> <strong>da</strong> fermosura de Zelin<strong>da</strong> que <strong>do</strong>s<br />

próprios desprezos com que o tratava, tomava maiores assuntos para querê-la.<br />

São os desprezos e esquivanças no amar ocasiona<strong>do</strong>s a <strong>do</strong>us extremos.<br />

Porque ou fazem de to<strong>do</strong> desistir <strong>do</strong>s cui<strong>da</strong><strong>do</strong>s, <strong>da</strong>n<strong>do</strong>-se o amante por<br />

ofendi<strong>do</strong> <strong>da</strong> pouca estimação com que é trata<strong>do</strong>, ou se chega a beber-se o<br />

penoso trago <strong>do</strong> desprezo, sem desistir <strong>do</strong> querer, com <strong>do</strong>bra<strong>do</strong>s desvelos se<br />

empenha na pretensão. Uns fazem vingança <strong>do</strong> retiro e outros desagravo <strong>da</strong><br />

porfia. Deles era Sultão Ali, que com maiores instâncias continuava na<br />

pretensão de que tantas vezes era despedi<strong>do</strong>. Tornou Zulema de importuna<strong>do</strong><br />

a renovar as instâncias com Zelin<strong>da</strong>, já valen<strong>do</strong>-se de carícias, já ameaçan<strong>do</strong><br />

rigores. O que ela ven<strong>do</strong>, lhe pediu quinze dias de espaço para deliberar-se,

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