17.04.2013 Views

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

730 Padre Mateus Ribeiro<br />

- Admira<strong>do</strong> me deixa a novi<strong>da</strong>de <strong>da</strong> ocasião de vossa tristeza, e agora<br />

me lembra que discretamente falou Marcial 610 , quan<strong>do</strong> disse que a razão por<br />

que não aprovava serem as amizades muito grandes, era porque se viessem<br />

algum dia a quebrar, não houvesse tanto que na per<strong>da</strong> delas sentir. Se vós<br />

fôreis, Aureliano, tão ver<strong>da</strong>deiro amigo meu como eu o fui sempre vosso, nem<br />

vos mostráreis triste pelo que Leonisa vos man<strong>da</strong>va, nem chegáreis tão senti<strong>do</strong><br />

a declarar-me a condição odiosa que vos pedia. Que esperáveis de manifestar-<br />

me a causa de vosso sentimento, senão que eu me desse por perdi<strong>do</strong>?<br />

Porventura pretenderia eu que, por continuar na amizade, perdêsseis vós os<br />

interesses que julgais adquirirdes com Leonisa? Não me convinha a mim ser<br />

motivo de vossos desgostos, nem que por meu respeito perdêsseis a<br />

esperança <strong>da</strong> pretensão. Se bem consideráreis, mais foi em Leonisa esse<br />

preceito despedi<strong>da</strong> de discreta que fineza de amorosa. Amor, quan<strong>do</strong> é<br />

ver<strong>da</strong>deiro, não chega a apurar o cabe<strong>da</strong>l <strong>do</strong> sofri<strong>do</strong> com o excessivo <strong>do</strong><br />

experimenta<strong>do</strong>; porque aventurar o amante a poder faltar na execução <strong>do</strong><br />

pedi<strong>do</strong> é arriscar-lhe o empenho aos desaires de pouco pontual, e expor-me ao<br />

perigo é descrédito grande <strong>do</strong> amor. Daqui infiro eu que o man<strong>da</strong>r-vos Leonisa<br />

a deixar minha amizade mais foi desculpa para despedir-vos <strong>do</strong> que cautela<br />

preveni<strong>da</strong> para assegurar-se.<br />

Pusestes em balança seu amor com minha amizade e foram falsos os<br />

pesos em parecer-vos que Leonisa pesava mais. Porque, como diz Terêncio, o<br />

amigo, se é ver<strong>da</strong>deiro, sempre persevera, mas o amante brevemente pode<br />

mu<strong>da</strong>r-se e faltar. Cobristes o rosto <strong>da</strong> mais profun<strong>da</strong> tristeza, para que nela<br />

conhecessem a despedi<strong>da</strong> que me dáveis; mais vos devera se vos mostráreis<br />

alegre <strong>do</strong> que vos fico obriga<strong>do</strong> em vos manifestardes triste. Porque na alegria<br />

pudera entender que duvidáveis, porém na tristeza bem mostrais que me<br />

excluíeis. Antepusestes o desejo à razão, a novi<strong>da</strong>de ao antigo, o duvi<strong>do</strong>so ao<br />

experimenta<strong>do</strong> e finalmente uma esperança nas asas <strong>da</strong> ventura a um amigo<br />

tão ver<strong>da</strong>deiro desde o pueril prelúdio <strong>da</strong> criação. Muito vos devera se<br />

calásseis, na<strong>da</strong> vos fico a dever na locução com que declarastes o pesar, pois<br />

calan<strong>do</strong> me podíeis deixar duvi<strong>do</strong>so e agora me deixais desengana<strong>do</strong>. Da<br />

Mart., Lib. 2.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!