17.04.2013 Views

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Alívio de tristes e consolação de queixosos - Parte VI 941<br />

rondei as suas casas sem poder ouvir sua voz nem por descui<strong>do</strong>, porque<br />

parece que em encontrar meu desejo punha o maior cui<strong>da</strong><strong>do</strong>.<br />

Ven<strong>do</strong> pois tão repeti<strong>do</strong> seu desdém como firme minha vontade, nela a<br />

ingratidão mais tirana e em mim o querer mais constante, quan<strong>do</strong> pudera<br />

cessar minha porfia, tomei por timbre a maior perseverança. Desta que pudera<br />

ser estima<strong>da</strong>, parece que se deu por ofendi<strong>da</strong>; e não me admiro, porque<br />

amantes desgraça<strong>do</strong>s com as finezas ofendem. Persuadiu a seus pais que<br />

com to<strong>da</strong> a casa se mu<strong>da</strong>ssem para a quinta de Bom <strong>Porto</strong>, para que com os<br />

motivos <strong>da</strong> ausência fizesse termo meu amor, não advertin<strong>do</strong> que o olvi<strong>da</strong>r nas<br />

ausências é para amor de i<strong>da</strong>de pouca e primeiros rudimentos <strong>do</strong> querer: o que<br />

em mim se não <strong>da</strong>va, sen<strong>do</strong> tão antigo em amá-la como foram meus olhos em<br />

vê-la. Fingi caça<strong>da</strong>s para vê-la e cheguei em uma a poder falar-lhe; ofereci-me<br />

para seu esposo, que era de minha vontade a demonstração mais ver<strong>da</strong>deira,<br />

e o que resultou de uma fineza tão excessiva, de uma fé tão amante e de um<br />

querer tão fi<strong>da</strong>lgo foi que secretamente com seus pais e irmãos se ausentou<br />

para Bolonha por viverem <strong>do</strong> senhorio de meu pai isentos, quan<strong>do</strong> eu de seu<br />

senhorio não posso isento viver, pelo <strong>do</strong>mínio que alcançaram seus olhos<br />

sobre meu coração.<br />

Parece-vos, amigo Bernardino, que é esta esquivança para sofrer-se,<br />

desprezo para tolerar-se, ofensa para dissimular-se ou ingratidão para admitir-<br />

se? Como não apostará meu sentimento vinganças com a mesma tirania? Pois<br />

a espa<strong>da</strong> de sua ingratidão tem embota<strong>do</strong>s já os fios de tão incessável cortar<br />

por meu generoso sofrimento. Pouco estimula um agravo quan<strong>do</strong> a vingança<br />

descui<strong>da</strong><strong>da</strong> <strong>do</strong>rme. É escusa<strong>da</strong> pretensão buscar à ingratidão motivos para<br />

demovê-la, porque <strong>do</strong>s próprios serviços faz agravos que a ofendem, por que<br />

quem a considerar tirana, a possa desculpar como ofendi<strong>da</strong>. Não devem<br />

minhas finezas à sua memória nem a menor lembrança, nem a seu<br />

pensamento nem por descui<strong>do</strong> um cui<strong>da</strong><strong>do</strong>, nem por acidente um desvelo. Só<br />

para mim se fecharam as portas <strong>do</strong> galardão, perdeu-se a estra<strong>da</strong> <strong>do</strong><br />

agradecimento e sobretu<strong>do</strong> soçobrou-se o baixel <strong>da</strong> ventura, porque não me<br />

assistiu a de César, e em tu<strong>do</strong> naufragou minha esperança. To<strong>da</strong> esta noite me<br />

desvelaram sentimentos padeci<strong>do</strong>s, iras imagina<strong>da</strong>s, vinganças apeteci<strong>da</strong>s;<br />

porém ao fim é sempre meu amor para a queixa mui eficaz e para a vingança<br />

mui tíbio; porque se a vingança se veste <strong>da</strong>s cores <strong>do</strong> agravo, logo o amor o

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!