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o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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766 Padre Mateus Ribeiro<br />

lições de ofender-te, quan<strong>do</strong> sempre se desvelou em servir-te; bem te<br />

manifestei esta vontade, em mim tão bem nasci<strong>da</strong> como em ti desestima<strong>da</strong>.<br />

Procurava-te meu desejo para esposa só por quem eras, avalian<strong>do</strong>-te amor<br />

pela maior ventura, se por ventura se dá ventura nos desejos; mas sem dúvi<strong>da</strong><br />

me julgaste por inimigo, sen<strong>do</strong> amante, sen<strong>do</strong> tão distantes amante e inimigo.<br />

Divulgou-se que te casavas com Silvério, e porque deveras o amavas,<br />

deveras a mim me aborrecias: injusto galardão para meu cui<strong>da</strong><strong>do</strong>, <strong>do</strong>nde<br />

esperava amor, tirar aborrecimento. Sempre a ingratidão foi odiosa, mas nos<br />

empenhos de amar intolerável; porque faltar a remuneração talvez ao<br />

merecimento pode ser impossibili<strong>da</strong>de <strong>do</strong> cabe<strong>da</strong>l, mas em ti foi só falta <strong>do</strong><br />

querer, pois nunca a vontade está pobre para pagar, quan<strong>do</strong> <strong>do</strong> amor está rica<br />

para agradecer as finezas. Bem sabes que o mais <strong>do</strong> tempo me criei e assisti<br />

na minha quinta fora de Cesena, poucos meses há que nela assisto de<br />

mora<strong>da</strong>: amei-te no dia em que te vi, que se mais ce<strong>do</strong> te vira, mais antecipa<strong>do</strong><br />

te amara. Foi Silvério em querer-te mais antigo, porque se adiantou em verte,<br />

mas não mais fino em amar-te: nos extremos consiste a i<strong>da</strong>de <strong>do</strong> amor e não<br />

nos dias. Em trinta [dias] corre a lua to<strong>da</strong> a estrela<strong>da</strong> cinta <strong>do</strong> Zodíaco, para o<br />

que outros planetas necessitam de anos; não põe preço ao amor o vagaroso<br />

<strong>do</strong> tempo, mas o fino <strong>da</strong> vontade; to<strong>do</strong> outro querer fica atrás de meu amar,<br />

porque para comigo chegou a não lhe ser possível passar adiante. Se deixas,<br />

Florisela, o esposo que buscavas, em mim acharás outro que te busca; Silvério<br />

só me podia exceder na ventura, porém eu o avantajo no merecimento: em<br />

mu<strong>da</strong>res de empenho perdes pouco e eu em ganhar-te interesso muito.<br />

- Não passes adiante, Feliciano (respondeu choran<strong>do</strong> Florisela), que tão<br />

temerária ousadia só em ti pudera achar-se; nem imagines que possas com<br />

lisonjas disfarçar meus agravos ou divertir o intenso de minha <strong>do</strong>r, porque<br />

antes me verias morta que rendi<strong>da</strong>. Queres porventura com meu descrédito<br />

tomar injusta vingança <strong>do</strong>s Martelinos e desafogar o hostil <strong>do</strong>s Tibertos com o<br />

injusto roubo de Florisela? Confesso que amei a Silvério para ser meu esposo:<br />

achou agra<strong>do</strong> em meus olhos, se foi ventura o ser correspondi<strong>do</strong>; por que me<br />

culpas como se te ofendera? Porventura animei tua esperança? Dei-me por<br />

obriga<strong>da</strong> a teus desvelos? Ou fiz-te alguma promessa de ser tua? Pois se foi<br />

estrela que me fugiu ou sorte que te faltou, para que me criminas não amar-te<br />

como se fora obrigação o querer-te? Dizes que me queres por esposa, e é

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