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o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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360 Padre Mateus Ribeiro<br />

nos, mas valeu-nos a diligência com que apenas foram os mortos conheci<strong>do</strong>s,<br />

quan<strong>do</strong> montan<strong>do</strong> eu e Alexandre a cavalo, apenas ten<strong>do</strong> lugar de despedir-me<br />

de Laura, partimos na volta de Florença, caminhan<strong>do</strong> to<strong>da</strong> a noite com<br />

excessiva pressa, que na sabe o temor admitir vagares.<br />

- Oh fermosura de Laura (dizia eu muitas vezes), quem nunca te<br />

houvera visto, pois duas vezes foste meu tormento, quan<strong>do</strong> deseja<strong>da</strong> e quan<strong>do</strong><br />

possuí<strong>da</strong>! Desejei-te com desvelos e possui-te com perigos. Extremos fostes<br />

para mim sempre, pois nunca extremos foram seguros: penosos para<br />

pretendi<strong>do</strong>s e perigosos para logra<strong>do</strong>s. São as medianias isentas <strong>do</strong>s aplausos<br />

e seguras <strong>do</strong>s perigos: nem dão lugar a invejar-se, nem admitem lisonjas de<br />

aplaudir-se; mas extremos <strong>do</strong> parecer nem se pretendem sem riscos, nem se<br />

possuem com descanso. Não bastou desterrar-me <strong>da</strong> minha pátria por tua<br />

causa para viver quieto em terra alheia: que como me acompanhavas, sempre<br />

vai ofereci<strong>do</strong> a ser persegui<strong>do</strong> quem leva consigo o que de muitos é deseja<strong>do</strong>.<br />

Nem tem a víbora culpa em nascer venturosa, nem eu te culpo de nascer<br />

contigo a fermosura; mas <strong>do</strong> que é venenoso to<strong>do</strong>s se retiram e <strong>do</strong> que é<br />

fermoso to<strong>do</strong>s se agra<strong>da</strong>m e igualmente to<strong>do</strong>s se perigam: uns, porque<br />

inadverti<strong>do</strong>s não fugiram; outros, porque cui<strong>da</strong><strong>do</strong>sos a buscaram. Por teu<br />

respeito Júlio e Fábio quiseram tirar-me a vi<strong>da</strong> e sem vi<strong>da</strong> eles e o filho<br />

malogra<strong>do</strong> <strong>do</strong> marquês Valeriano ficaram: eu perdi<strong>do</strong> para mais não ver-te e tu<br />

desampara<strong>da</strong> e sem remédio para sustentar-te. Eras, quan<strong>do</strong> rica, combati<strong>da</strong>,<br />

agora, pobre, como não serás solicita<strong>da</strong>? E se com minha presença se<br />

atreviam a teu decoro, com ausências minhas quem te guar<strong>da</strong>rá respeito?<br />

Quem me deu notícias <strong>da</strong> beleza que tinhas para si fabricou a sepultura e para<br />

mim o veneno: eles acaban<strong>do</strong> as vi<strong>da</strong>s pagaram o que deviam à morte, mas<br />

eu, viven<strong>do</strong>, ca<strong>da</strong> dia morrerei de triste. Porque as penas <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> com a morte<br />

se acabam, mas as ânsias <strong>da</strong> minha alma sempre acrecenta<strong>da</strong>s duram.<br />

Assim caminhan<strong>do</strong> senti<strong>do</strong> me queixava <strong>da</strong> fortuna, se fortuna pudera<br />

haver de quem queixar-me, mas a eficácia <strong>da</strong> pena embargava os discursos <strong>da</strong><br />

razão. A quem Alexandre, queren<strong>do</strong> divertir-me o vivo <strong>do</strong> sentimento,<br />

respondeu assim:<br />

- Na ver<strong>da</strong>de, amigo Felisberto, que se o grave <strong>da</strong> ânsia em que vos<br />

considero não desculpara o liviano <strong>da</strong> pena que vos ouço, pusera em dúvi<strong>da</strong> o<br />

acredita<strong>do</strong> de vossa descrição, com ter tantas certezas de vosso bom juízo. É

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