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o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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778 Padre Mateus Ribeiro<br />

Bem disse Euripides que a supérflua curiosi<strong>da</strong>de talvez é inimiga <strong>da</strong><br />

vi<strong>da</strong>, parecer que seguiu Cícero 681 quan<strong>do</strong> disse que bastante era a ca<strong>da</strong> qual<br />

o governo de suas cousas, sem ter curiosi<strong>da</strong>de de intentar registrar as alheias.<br />

Porém oferece a fortuna ocasiões tão arroja<strong>da</strong>s que aos senti<strong>do</strong>s menos<br />

ocupa<strong>do</strong>s os persuadem a investigar o que depois se arrependem de saber.<br />

Bem é ver<strong>da</strong>de que mais me incitou o desejo de poder evitar algum perigo<br />

alheio <strong>do</strong> que me moveu a curiosi<strong>da</strong>de própria; e assi com este pie<strong>do</strong>so afecto<br />

me apeei <strong>do</strong> cavalo, que entreguei aos cria<strong>do</strong>s, e sem querer que me<br />

acompanhassem, entrei pelo bosque, que sombrio e fecha<strong>do</strong> de arvore<strong>do</strong> era,<br />

e com cautela de não ser visto escutei a voz de um homem que assi dizia:<br />

- Tem chega<strong>do</strong>, ó Lívia, meus pesares a esta<strong>do</strong> que rompem o muro de<br />

meu sofrimento, tão dilata<strong>do</strong> para ser agora mais executivo, pois fingir<br />

ignorância de agravo é meio de assegurar mais a vingança dele. Infelice foi<br />

para mi tua beleza, no nome de Lívia te pôs minha fortuna, ó liviana, como a<br />

outra Lívia romana, nora de Tibério e mulher <strong>do</strong> príncipe Druso, seu filho, que<br />

ten<strong>do</strong> tanto de fermosa como de liviana, ocasionou a morte a seu mari<strong>do</strong><br />

depois de havê-lo ofendi<strong>do</strong>, sen<strong>do</strong> a ponte o haver si<strong>do</strong> adúltera, para passar<br />

delibera<strong>da</strong> a ser homici<strong>da</strong>.<br />

Deu-te meu amor senhorio sobre meu gosto: nece<strong>da</strong>de grande descobrir<br />

à sujeição a quem pode usar mal <strong>do</strong> <strong>do</strong>mínio; e bem se viu, pois tomaste<br />

motivo para ofender-me <strong>do</strong> que te pudera obrigar a teres eterniza<strong>do</strong>s desvelos<br />

para amar-me. Excesso de ingratidão amotivar-te o extremo de querer-te,<br />

incentivos de agravar-me. Pouco deve um honra<strong>do</strong> ao felice <strong>da</strong> ventura, se lhe<br />

deu a honra para perdê-la: pois uma vi<strong>da</strong> deslustra<strong>da</strong> é cadáver <strong>da</strong> autori<strong>da</strong>de<br />

e sepulcro <strong>do</strong> pun<strong>do</strong>nor; tem aparências de vi<strong>da</strong>, mas é morta, porque só nos<br />

livros <strong>da</strong> honra se registram os privilégios <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>. Casei-me contigo lisonjea<strong>do</strong><br />

<strong>da</strong> fermosura, não movi<strong>do</strong> de interesses; que nunca atende a interessa<strong>do</strong> amor<br />

que se presa de tão fino. Eras no <strong>do</strong>te pobre e na beleza rica, e esta foi só para<br />

mim o maior <strong>do</strong>te; e com ter-te por esposa sempre te tratei com desvelos de<br />

amante. Jamais diminuiu meu amor por possuir-te, antes subiu a mais querer-<br />

Eur., in Hyp.<br />

Cicer., in Lœl.

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