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o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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354 Padre Mateus Ribeiro<br />

pena e sentimento. Quem se atreve a solicitar-te não é sem esperanças de<br />

poder demover-te; e se pode um atrevi<strong>do</strong> confiar persuadir-te, como poderá um<br />

mari<strong>do</strong> não temer deixar-te?<br />

Eu me resolvo, Laura, em partir-me amanhã para o nosso castelo de<br />

Monte Re<strong>do</strong>n<strong>do</strong>, para que nem te queixes que te ofen<strong>do</strong>, nem eu me ponha ao<br />

risco de poder ser agrava<strong>do</strong>: pois tanta <strong>do</strong>r causa em minha alma o considerar<br />

que haja no mun<strong>do</strong> quem procure ofender-me, como se me considerasse na<br />

reali<strong>da</strong>de ofendi<strong>do</strong>.<br />

Alegre se mostrou Laura <strong>da</strong> mu<strong>da</strong>nça, e assim preparan<strong>do</strong> nessa noite<br />

tu<strong>do</strong> o que para partir necessário era, nos fomos de manhã despedir de meus<br />

pais, que com muitas lágrimas suas e de Lucin<strong>da</strong> esta ausência sentiram; e<br />

logo com to<strong>da</strong> a gente de nossa causa caminhámos na volta de Roma.<br />

Chegámos à casa de Alexandre, que o achámos bem molesta<strong>do</strong>, por estar sua<br />

esposa Eugenia desconfia<strong>da</strong> <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> <strong>do</strong> sentimento que tomou de lhe pedir<br />

Alexandre satisfação de umas desconfianças ou ciúmes em que ela não era<br />

culpa<strong>da</strong>; e como o amava muito, sentiu tanto ver a seu esposo tão desconfia<strong>do</strong><br />

de quem to<strong>da</strong> a confiança lhe merecia que, enferman<strong>do</strong> de uma profun<strong>da</strong><br />

tristeza, de sorte se lhe agravou o mal que desconfian<strong>do</strong> os médicos mais<br />

peritos de sua vi<strong>da</strong>, estava quan<strong>do</strong> chegámos já vizinha aos horizontes <strong>da</strong><br />

morte. Entrámos a vê-la magoa<strong>do</strong>s e Alexandre choran<strong>do</strong> de sumamente<br />

enterneci<strong>do</strong>; ao que ela, já com voz debilita<strong>da</strong>, disse assim:<br />

- Chegaram já tarde, ó Alexandre, tuas carícias, porque se fechou meu<br />

coração com teus rigores; e foram mais poderosas tuas desconfianças para<br />

ocasionar-me a morte que teus arrependimentos para dilatar-me a vi<strong>da</strong>. Ai de<br />

mim que te mereci tão pouco quan<strong>do</strong> entendi que me devias mais! Tu<strong>do</strong><br />

nasceu de minha fortuna e não de teu desconhecimento; que era impossível,<br />

sen<strong>do</strong> tu discreto, não advertires que quem contigo se desterrou por amante<br />

mal poderia ofender-te descui<strong>da</strong><strong>da</strong>. Quan<strong>do</strong> meu pensamento fora agravar-te,<br />

não me custara a vi<strong>da</strong> a <strong>do</strong>r de ver-te de teus ciúmes impaciente: que quem<br />

não ama não sente tanto as penas alheias que por elas padeça penas próprias.<br />

Igualou-se me mim o querer com o sentir e era impossível quem amou tanto,<br />

sentir pouco: tomou posse a <strong>do</strong>r de meu coração e, como era fonte de vi<strong>da</strong>,<br />

secaram-se-lhe to<strong>do</strong>s os alentos que podiam alimentar-me. Enfermei de<br />

ofendi<strong>da</strong> <strong>do</strong>s pesares que me deste, sem merecê-los, e assim não pode meu

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