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o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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964 Padre Mateus Ribeiro<br />

ouvir-me? Havia de render a altiveza jamais rendi<strong>da</strong> a chamar-me quan<strong>do</strong> eu<br />

mais desespera<strong>do</strong> de ser ouvi<strong>do</strong>? Quem cabalmente creria tal novi<strong>da</strong>de? Enfim<br />

despedin<strong>do</strong> a mensageira bem premia<strong>da</strong> <strong>do</strong> reca<strong>do</strong> e com resposta que sem<br />

falta iria à meia-noite, que era a hora que apontava, ao sítio que me dizia, fiquei<br />

<strong>da</strong>n<strong>do</strong> os parabéns à minha ventura de se mostrar tão propícia, quan<strong>do</strong> menos<br />

espera<strong>da</strong>. Comecei a queixar-me <strong>do</strong> dia porque caminhava tão moroso,<br />

parecen<strong>do</strong>-me que o primeiro móvel, violento impulso <strong>da</strong>s esferas, perdera o<br />

seu antigo movimento e que o sol, por não perder a vista de Fenisa, cui<strong>da</strong><strong>do</strong>so<br />

de vê-la se mostrava em seu curso descui<strong>da</strong><strong>do</strong>.<br />

Nunca foi o dia de mim tão aborreci<strong>do</strong> como aquele me pareceu tedioso,<br />

nunca mais odiosas as luzes, nem deseja<strong>da</strong>s as sombras, sen<strong>do</strong> os<br />

vespertinos crepúsculos de mim tão espera<strong>do</strong>s como para os tristes são os<br />

matutinos visos <strong>da</strong> aurora apeteci<strong>do</strong>s. Os relógios to<strong>do</strong>s me pareciam erra<strong>do</strong>s,<br />

seus pesos tinha por pesadelos que me oprimiam, seu cursar por suspeitoso: a<br />

tu<strong>do</strong> punha contraditas meu desejo, porque em tu<strong>do</strong> achava contradição minha<br />

esperança. Ensaiava os prelúdios <strong>do</strong> que havia de dizer-lhe, como me<br />

queixaria sem ofendê-la, como a poderia obrigar sem desgostá-la: nunca lição<br />

de ponto foi tão decora<strong>da</strong> como esta introdução de amor para mim estudiosa.<br />

Era a oposição de meus senti<strong>do</strong>s em que ia empenha<strong>da</strong> minha esperança e<br />

tu<strong>do</strong> quanto me ocorria para dizer-lhe me parecia mal, porque só Fenisa me<br />

parecia bem. Tu<strong>do</strong> avaliava por inculto, porque só a ela julgava por discreta.<br />

Seriam já passa<strong>da</strong>s as dez horas <strong>da</strong> noite, para meu alvoroço as mais<br />

vagarosas, quan<strong>do</strong> eu queria preparar-me para esta saí<strong>da</strong> para mim tão<br />

festiva, que nunca chega a reparar nos perigos quem leva o coração<br />

acompanha<strong>do</strong> <strong>da</strong>s esperanças, quan<strong>do</strong> senti passos de cavalos que na logea (a)<br />

<strong>da</strong>s casas entravam, e subin<strong>do</strong> um <strong>do</strong>s meus cria<strong>do</strong>s, me deu reca<strong>do</strong> que <strong>do</strong>us<br />

cavaleiros emascara<strong>do</strong>s se haviam apea<strong>do</strong> e man<strong>da</strong>vam aviso que lhes<br />

importava falarem comigo. Assustou-me o reca<strong>do</strong> pelo tempo em que me<br />

buscavam, quan<strong>do</strong> eu estava para sair ao chama<strong>do</strong> de Fenisa, hora de mim<br />

tão pretendi<strong>da</strong> como parecia malogra<strong>da</strong>, e porque não diziam quem eram,<br />

antes me buscavam emascara<strong>do</strong>s; mas como não podia negar-me à cortesia e<br />

(a ' Loja <strong>da</strong> casa nobre: pátio coberto que serve de entra<strong>da</strong>, onde os lacaios assistem e entram<br />

as seges.

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